sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

REVITALIZAÇÃO DA RUA CHILE: DUAS DÉCADAS DEPOIS, POUCA COISA SOBREVIVEU

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Largo da Rua Chile, Ribeira, Natal-RN – Fonte – http://www.orquideacondominium.com/espanhol/index.php?page=natal
Autor do texto – Henrique Arruda – Novo Jornal
Há 20 anos a Rua Chile inaugurava a sua primeira e até então única restauração. O projeto remoldurou a vida cultural da capital potiguar, que encerrou a década de 90 como o reduto de bares e pubs emblemáticos. Duas décadas depois, pouca se salvou e apenas dois empreendimentos continuam funcionando. O NOVO reconta esta história e traça um “Raio X” da atual situação do local.
Procurado pela Secretaria de Turismo e Cultura da época, em 1996, o arquiteto Haroldo Maranhão foi o responsável por realizar o projeto de restauração que ele começou a esboçar quando ainda era estudante do curso de arquitetura na UFRN e apresentou como Trabalho de Conclusão de Curso uma revitalização para o bairro da Ribeira. Era década de 80 e o assunto pouco discutido.
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A ideia da revitalização da Ribeira já era um desejo antigo – Diário de Natal, 19 de março de 1981, página 2.
“Por conta do meu TCC me chamaram para conduzir um projeto que inicialmente iria apenas pintar a fachada das casas voltadas para o rio, então eu propus um estudo mais fundo, de revitalização mesmo da rua, e assim o projeto foi reformulado”, conta sobre a pesquisa iniciada no começo dos anos 90, interrompida por alguns anos e retomada apenas em meados de 95.
Descascando todas as fachadas, Haroldo descobriu junto com seu escritório a verdadeira arquitetura de todos os prédios cujo orçamento de revitalização permitiu, 45 casarões exatamente, localizados entre o largo da Rua Chile até o encontro da rua com a Avenida Tavares de Lira. Na época o centro histórico de Natal não era tombado como patrimônio histórico nacional, o que só veio acontecer em 2010.
“Nós trabalhamos todo um conjunto arquitetônico e o impacto daquilo foi imediato porque foi apenas depois disso que o olhar da cidade se voltou pela primeira vez para a questão patrimonial. Antes só se pensava nisso através das crônicas de Câmara Cascudo ou Vicente Serejo”, diz, mencionando ainda como uma das consequências imediatas a formulação antes inexistente de passeios escolares pelo local.
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Ainda na década de 1980 Jaime Lerner defendia a revitalização da Ribeira. Diário de Natal, 14 de julho de 1987, pág. 3. Jaime Lerner é um político, arquiteto e urbanista brasileiro, filiado ao Democratas. Foi prefeito de Curitiba por três vezes e governador do Paraná por duas vezes. Foi eleito presidente da União Internacional de Arquitetos em julho de 2002 – Fonte – http://agorarn.com.br/cidades/video-abandonada-ribeira-sofre-com-o-descaso-do-poder-publico/
“O que dói desde a época em que estávamos fazendo o projeto é que sabíamos da descontinuidade política, tanto que está completamente abandonada pelo poder público até hoje, como você bem me lembrou ao entrar no escritório, há 20 anos”, comenta o arquiteto, remexendo em gavetas antigas à procura de fotos históricas de como a Rua Chile estava antes do projeto de restauração.
Na opinião de Haroldo, o essencial agora para a Rua Chile e o bairro da Ribeira, como um todo, é a aproximação do poder público. “Você não vê a presença do poder público no local. É inexistente em todas as questões que lhe compete, como segurança, paradas de ônibus, coleta de lixo e outros vários fatores”, opina, mencionando ainda a importância da “Lei Operação Urbana Ribeira”, caducada desde 2014, que isentava de impostos os estabelecimentos comerciais do bairro.
“Era uma lei que permitia ao empresário disposto a investir na Ribeira a isenção de impostos, como IPTU, ISS e outros… E isso é muito importante para atrair novos agentes, sem falar de novos investimentos em moradia também para o surgimento de farmácias e padarias, por exemplo”, ilustra.
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Rua Chile, Ribeira, Natal-RN – Fonte – https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi8mko7wePH96GSccJwb0d7wNEIE3_xmosvK3WskYkWtP3RnHDjS1pUin-vD6hFvmnJtykflAfALaUqBN4Gi7qYaEzX2-xjIokyZJBIF6t7THgar4UQI3-1y2A3CQO_nLSZsYSEApsRWeE/s1600/RuaChileNatalRN.jpg
Desafio de resistência
Atualmente com apenas dois pubs em funcionamento constante, o “Ateliê Bar” e o “Centro Cultural Dosol”, a Rua Chile ainda permanece como a opção mais certeira aos que desejam ouvir música autoral potiguar, ou fazer parte do movimento de resistência cultural no bairro, que se estende à sua rua vizinha, Frei Miguelinho, onde funcionam: A BOCA Espaço de Teatros, Casa da Ribeira, Espaço A3 e Giradança.
“É uma batalha diária ter um espaço na Ribeira, e uma prova de resistência cultural/respeito com a história da cidade”, explica Anderson Foca, idealizador do Centro Cultural Dosol, às vésperas de mais uma edição do Festival Dosol, que entre os dias 11 e 13 de novembro vai levar para a Rua Chile mais de 70 shows.
“Acho que enquanto o poder público não olhar a Ribeira com o potencial que o bairro tem vamos sempre ficar nessa corda bamba interminável. As vezes rindo, as vezes chorando mas sempre pronto pra estar lá”, comenta Foca, revelando que um dia o Festival Dosol também pode deixar o bairro.
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Fonte – http://agorarn.com.br/cidades/video-abandonada-ribeira-sofre-com-o-descaso-do-poder-publico/
“Penso em uma edição fora da Rua Chile, mas não por causa da Ribeira em si, e sim pela logística de receber artistas, tamanho dos palcos e coisas do tipo. Temos um sonho de fazer o dosol na praia, de dia e coisas assim. Mas a ribeira continuará sendo a principal incubadora do dosol e dos artistas da cidade”, explica.
Na opinião de André Maia, idealizador do Ateliê Bar, algumas melhorias pontuais foram observadas na Rua Chile recentemente, como a iluminação de LED instalada no largo. 
“É claro que isso precisa se estender a todo o bairro, mas ajudou bastante. A segurança também melhorou, mas está muito além do que um centro histórico precisa, no mínimo um posto policial fixo”, comenta, mencionando o Terminal Marítimo de Passageiros de Natal, concluído desde julho de 2014, mas nunca aberto a população.
“É um grande elefante branco, o que é um absurdo porque poderia ser um dos principais motivos para impulsionar a economia da área”, afirma o dono do estabelecimento que vem funcionando de quintas a domingos e nas quartas-feiras uma vez por mês, sempre com shows e outras ações bastante frequentadas. 
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Fonte – http://blogtangaraense.com.br/wp-content/uploads/2016/11/rua-chile-.-ribeirafoto-rodrigo-sena-620×415.jpg
“Nos tempos de Blackout”
O professor de História Carlos Henrique Pessoa Cunha avalia que a efervescência da Rua Chile durou de 1997, com o surgimento do emblemático “Blackout” até meados de 2002, como ele conta em seu livro, fruto de sua dissertação de mestrado em História, “Nos Tempos de Blackout” (Jovens Escribas/2014).
“Foi a restauração dos casarões que impulsionou o processo de reocupação da rua pelos agentes de cultura. A reforma em si, aliás, não deu garantias de que a rua seria revivida, e sim o surgimento dos bares, em especial o Blackout que se tornou emblemático”, opina citando o bar já fechado nos dias atuais.
Ainda de acordo com o professor a maior diferença da Rua Chile no final dos anos 90 para a atual Rua Chile é a periodicidade das ações. “O que existem hoje por lá são eventos culturais, como a Virada Cultural, o Circuito Ribeira, o Festival Dosol, mas falta a periodicidade das ações. Diferente do final da década de 90, quando independente do dia sempre tinha algo de bom rolando na Ribeira em vários pontos diferentes”, compara.
O professor observa ainda que a movimentação cultural da Rua Chile existiu desde o começo do século XX, dando “uma esfriada” apenas entre os anos 70 e 80, até ressurgir em 1996. “Foi um período que a rua serviu apenas para oficinas, peixarias, fábricas de gelo…”, diz, frisando a importância que a Rua teve na visibilidade às bandas de Rock autoral da cidade.
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Ribeira, Natal-RN – Foto meramente ilustrativa – Fonte – http://agorarn.com.br/cidades/video-abandonada-ribeira-sofre-com-o-descaso-do-poder-publico/
“Sempre existiram bandas de rock autoral na cidade durante a cena Rock 90, vide “Modus Vivendi”, “Cabeças Errantes”… o que faltava era um lugar para elas se apresentarem e esse foi o maior mérito da Rua Chile desde o seu ressurgimento. As bandas começaram a receber cachês, gravar discos, a ganhar visibilidade”, conta.
O historiador é mais um que defende a necessidade de ações mais efetivas do poder público no local para que ele consiga prosperar. “Não apenas no financiamento das ações culturais, mas também para estrutura e para o fortalecimento do turismo de centros históricos assim como existe nas principais cidades do país”, opina.
“Aqui o turista nunca vai para a Ribeira e o próprio natalense evita porque não tem segurança, iluminação, o que é uma pena já que a Rua Chile é privilegiada porque tem espaço para estacionar, locais para bons palcos e ainda o fato de não haver vizinhança que seja perturbada com a realização dos eventos”, conclui.
Do blog: https://tokdehistoria.com.br

JESUS ANTES DE CRISTO

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Jesus – Fonte – http://2.bp.blogspot.com/

Pesquisadores vão além da Bíblia e procuram pelo Jesus histórico – e o que não é mencionado no livro sagrado

Rodrigo Cavalcante
Cristo está em toda parte: nas obras mais importantes da história da arte, nos roteiros de Hollywood, nos letreiros luminosos de novas igrejas, nas canções evangélicas em rádios gospel, nos best-sellers de autoajuda, nos canais de televisão a cabo, nos adesivos de carro, nos presépios de Natal. Onde você estiver, do interior da floresta amazônica às montanhas geladas do Tibete, sempre será possível deparar com o símbolo de uma cruz, pena de morte comum no Império Romano à qual um homem foi condenado há quase 2 mil anos. Para mais de 2 bilhões de pessoas esse homem era o próprio messias (“Cristo”, do grego, o ungido) que ressuscitara para redimir a humanidade.
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Nascimento de Jesus – Obra de Lorenzo Costa (1460 – 5 de Março de 1535) foi um pintor italiano do Renascimento. Nasceu em Ferrara, mas se mudou para Bolonha quando tinha 20 anos. Neste quadro, chama atenção os detalhes da cidade ao fundo, a pose do bebê deitado sobre o braço – Fonte – http://khristianos.blogspot.com.br/2015/12/a-natividade-por-pintores-famosos.html
Embora o mundo inteiro (inclusive os não cristãos) esteja familiarizado com a imagem de Cristo, até a bem pouco tempo os pesquisadores eram céticos quanto à possibilidade de descobrir detalhes sobre a vida do judeu Yesua (Jesus, em hebraico), o homem de carne e osso que inspirou o cristianismo. “Isso está começando a mudar”, diz o historiador André Chevitarese, professor de História Antiga da Universidade Federal do Rio de Janeiro e um dos especialistas no Brasil sobre o “Jesus histórico” – o estudo da figura de Jesus na história sem os constrangimentos da teologia ou da fé no relato dos evangelhos. Embora tragam detalhes do que teria sido a vida de Jesus, os evangelhos são considerados uma obra de reverência e não um documento histórico. Chevitarese e outros pesquisadores acreditam que, apesar de não existirem indícios materiais diretos sobre o homem Jesus, arqueólogos e historiadores podem ao menos reconstituir um quadro surpreendente sobre o que teria sido a vida de um líder religioso judeu naquele tempo, respondendo questões intrigantes sobre o ambiente e o cotidiano na Palestina onde ele vivera por volta do século I.
Nazaré, entre 6 e 4 a.C.
Uma aldeia agrícola com menos de 500 habitantes, cuja paisagem é pontuada por casas pobres de chão de terra batida, teto de estrados de madeira cobertos com palha, muros de pedras coladas com uma argamassa de barro, lama ou até de uma mistura de esterco para proteger os moradores da variação da temperatura no local. Segundo os arqueólogos, essa é a cidade de Nazaré na época em que Jesus nasceu, provavelmente entre os anos 6 e 4 a.C., no fim do reinado de Herodes. Isso mesmo: segundo os historiadores, Jesus deve ter nascido alguns anos antes do ano 1 do calendário cristão. “As pessoas naquele tempo não contavam a passagem do tempo como hoje, por meio da indicação do ano”, explica o historiador da Unicamp Pedro Paulo Funari. “O cabeçalho dos documentos oficiais da época trazia apenas como indicação do tempo o nome do regente do período, o que leva os pesquisadores a crer que Jesus teria nascido anos antes do que foi convencionado.”
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Imagem do século 13 de Jesus sendo apresentado aos rabinos | Crédito: Duccio di Buonis – Fonte – http://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/religiao/jesus-antes-cristo-434985.phtml#.WF_PMPkrLIW
Se você também está se perguntando por que os historiadores buscam evidências do nascimento de Jesus na cidade de Nazaré – e não em Belém, cidade natal de Jesus, de acordo com os evangelhos de Mateus e Lucas –, é bom saber que, para a maioria dos pesquisadores, a referência a Belém não passa de uma alegoria da Bíblia. Na época, essa alegoria teria sido escrita para ligar Jesus ao rei Davi, que teria nascido em Belém e era considerado um dos messias do povo judeu. Ou seja: a alcunha “Jesus de Nazaré” ou “nazareno” não teria derivado apenas do fato de sua família ser oriunda de lá, como costuma ser justificado.
Mesmo que os historiadores estejam certos ao afirmarem que o nascimento em Belém seja apenas uma alegoria bíblica, o entorno de uma casa pobre na cidade de Nazaré daquele tempo não deve ter sido muito diferente do de um estábulo improvisado como manjedoura. Como a residência de qualquer camponês pobre da região, as moradias eram ladeadas por animais usados na agricultura ou para a alimentação de subsistência. A dieta de um morador local era frugal: além do pão de cada dia (no formato conhecido no Brasil hoje como pão árabe), era possível contar com azeitonas (e seu óleo, o azeite, usado também para iluminar as casas), lentilhas, feijão e alguns incrementos como nozes, frutas, queijo e iogurte.
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O que seria a alimentação típica no tempo de Jesus – Fonte – http://dailylifeinthetimeofjesus.weebly.com/daily-life-at-the-time-of-jesus.html
De acordo com os arqueólogos, o consumo de carne vermelha era raro, reservado apenas para datas especiais. O peixe era o animal consumido com mais frequência pela população, seco sob o sol, para durar. A maioria dos esqueletos encontrados na região mostra deficiência de ferro e proteínas. Essa parca alimentação é coerente com relatos como o da multiplicação dos pães, no Evangelho de Mateus, no qual os discípulos, preocupados com a fome de uma multidão que seguia Jesus, mostram ao mestre cinco pães e dois peixes, todo o alimento de que dispunham.
Se alguém presenciasse o nascimento de Jesus, provavelmente iria deparar com um bebê de feições bem diferentes da criança de pele clara que costuma aparecer nas representações dos presépios. Baseados no estudo de crânios de judeus da época, pesquisadores dizem que a aparência de Jesus seria mais próxima da de um árabe (de cabelos negros e pele morena) que da dos modelos louros dos quadros renascentistas. Seu nome, Jesus, uma abreviação do nome do herói bíblico Josué, era bastante comum em sua época. Ainda na infância, deve ter brincado com pequenos animais de madeira entalhada ou se divertido com rudimentares jogos de tabuleiro incrustados em pedras. Quanto à família de Jesus, os pesquisadores não acreditam que ele tenha sido filho único. Afinal, era comum que famílias de camponeses tivessem mais de um filho para ajudarem na subsistência da família. Isso poderia explicar o fato de os próprios evangelhos falarem em irmãos de Jesus, como Tiago, José, Simão e Judas. “As igrejas Ortodoxa e Católica preferiram entender que o termo grego adelphos, que significa irmão, queria dizer algo próximo de discípulo, primo”, diz Chevitarese.
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Vestuário no tempo de Jesus – VESTUÁRIO – No primeiro século a roupa era muito mais simples do que é hoje. A maioria das roupas eram feitas de lã, embora o linho também fosse usado (feito de linho cultivado na área de Jericó ou importado do Egito). Tanto os homens como as mulheres usavam normalmente uma túnica e um manto. A lei judaica exigia que o manto tivesse bordas unidas aos seus quatro cantos. Cada borda era para incluir um cordão azul e foi concebido como uma forma de ajudar as pessoas a se lembrar de manter a Lei de Deus. Para ocasiões especiais uma longa roupa conhecida como ‘estola’ era usada. Eram usados geralmente sandálias de couro (ou talvez de madeira) – Fonte – http://dailylifeinthetimeofjesus.weebly.com/daily-life-at-the-time-of-jesus.html
Assim como outros jovens da Galileia, é provável que ele não tenha tido uma educação formal ou mesmo a chance de aprender a ler e escrever, privilégio de poucos nobres. Ainda assim, nada o impediria de conhecer profundamente os textos religiosos de sua época transmitidos oralmente por gerações.
Política, religião e sexo
Desde aquele tempo, a região em que Jesus vivia já era, digamos, um tanto explosiva. O confronto não se dava, é claro, entre judeus e muçulmanos (o profeta Maomé só iria receber sua revelação mais de cinco séculos depois). A disputa envolvia grupos judaicos e os interesses de Roma, cujo império era o equivalente, na época, ao que os Estados Unidos são hoje. E, assim como grupos religiosos do Oriente Médio resistem atualmente à ocidentalização dos seus costumes, diversos grupos judaicos da época se opunham à influência romana sobre suas tradições. Na verdade, fazia séculos que os judeus lutavam contra o domínio de povos estrangeiros.
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Ocupações no tempo de Cristo – Os principais trabalhos masculinos eram ser fazendeiros, artesãos, ou pescadores. As mulheres aprendiam a cozinhar e os deveres domésticos. Elas também memorizavam as escrituras, mas era proibido para elas ler ou escrever. Os mais afortunados teriam aprendido um ofício de seu pai – como ocorreu com o próprio Jesus. Muitos dos que não tinham um emprego estável seriam trabalhadores ocasionais, cujo salário diário dependia do capricho daqueles que contratavam um grupo de trabalhadores todas as manhãs. Alguns indivíduos tinham uma vida de mendicância ou mesmo de escravidão – Fonte – http://dailylifeinthetimeofjesus.weebly.com/daily-life-at-the-time-of-jesus.html
Antes de os romanos chegarem, no ano 63 a.C., eles haviam sido subjugados por assírios, babilônios, persas, macedônios, selêucidas e ptolomeus. Os judeus sonhavam com a ascensão de um monarca forte como fora o rei Davi, que por volta do século 10 a.C. inaugurara um tempo de relativa estabilidade. Não à toa, Davi ficaria lembrado como o messias (ungido por Javé) e, assim como ele, outros messias eram aguardados para libertar o povo judeu (veja quadro na pág. 33).
A resistência aos romanos se dava de maneiras variadas. A primeira delas, e mais feroz, era identificada como simples banditismo. Nessa categoria estavam bandos de criminosos formados por camponeses miseráveis que atacavam comerciantes, membros da elite romana ou qualquer desavisado que viajasse levando uma carga valiosa.
Além do banditismo, havia a resistência inspirada pela religião, principalmente a dos chamados movimentos apocalípticos. De acordo com os seguidores desses movimentos, Israel estava prestes a ser libertado por uma intervenção direta de Deus que traria prosperidade, justiça e paz à região. A questão era saber como se preparar para esse dia.
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Mosaico do século XII, existente na Catedral de Cefalù, na Sicília, Itália – Fonte – http://www.teslasociety.com/hagiasophia.htm
Alguns grupos, como os zelotes, acreditavam que o melhor a fazer era se armar e partir para a guerra contra os romanos na crença de que Deus apareceria para lutar ao lado dos hebreus. Para outros grupos, como os essênios, a violência era desnecessária e o melhor mesmo a fazer era se retirar para viver em comunidades monásticas distantes das impurezas dos grandes centros. E Jesus, de que lado estava?
É quase certo que Jesus tenha tido contato com ao menos um líder apocalíptico de sua época, que preparava seus seguidores por meio de um ritual de imersão nas águas do rio Jordão. Se você apostou em João Batista, acertou.
O curioso é que, para a maioria dos pesquisadores, incluindo aí o padre católico John P. Meier, autor da série sobre o Jesus histórico chamada Um Judeu Marginal, o movimento apocalíptico de João Batista deve ter sido mais popular, em seu tempo, do que a própria pregação de Jesus. Os historiadores acreditam que é bem provável que Jesus, de fato, tenha sido batizado por João Batista nas margens do rio Jordão, e que o encontro deve ter moldado sua missão religiosa dali em diante.
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Representação moderna dos soldados romanos – Fonte – http://www.instonebrewer.com/visualSermons/Jesus%2BChildren/_Sermon.htm
Apesar de não haver nenhuma restrição para que um líder religioso judeu tivesse relações com mulheres em seu tempo, ninguém sabe ainda se entre as práticas espirituais de Jesus estaria o celibato. Da mesma forma, afirmar que ele teve relações com Maria Madalena, como no enredo de livros como O Código Da Vinci, também não passaria de uma grande especulação.
Uma morte marginal
O pesquisador Richard Horsley, professor de Ciências da Religião da Universidade de Massachusetts, em Boston, é categórico: a morte de Jesus na cruz em seu tempo foi muito menos perturbadora para o Império Romano do que se costuma imaginar. Horsley e outros pesquisadores desapontam os cristãos que imaginam a crucificação como um evento que causara, em seu tempo, uma comoção generalizada, como naquela cena do filme O Manto Sagrado em que nuvens negras escurecem Jerusalém e o mundo parece prestes a acabar. Apesar de ter sido uma tragédia para seus seguidores e familiares, a morte do judeu Yesua deve ter passado praticamente despercebida para quem vivia, por exemplo, no Império Romano. Ou seja: se existisse uma rede de televisão como a CNN, naquele tempo, é bem possível que a morte de Jesus sequer fosse noticiada. E, caso fosse, dificilmente algum estrangeiro entenderia bem qual a diferença da mensagem dele em meio a tantas correntes do judaísmo do período – assim como poucas pessoas no Ocidente compreendem as diferenças entre as diversas correntes dentro do Islã ou do budismo.
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Fonte – http://allchristiannews.com/wp-content/uploads/2016/03/Jesus-Crucifixion.jpg
Os pesquisadores sabem, no entanto, que Jesus não deve ter escolhido por acaso uma festa como a Páscoa para fazer sua pregação em Jerusalém. A data costumava reunir milhares de pessoas para a comemoração da libertação do povo hebreu do Egito. No período que antecedia a festa, o ar tornava-se carregado de uma forte energia política. Era quando os judeus pobres sonhavam com o dia em que conseguiriam ser libertados dos romanos.
Para a elite judaica que vivia em Jerusalém, contudo, as manifestações anti-Roma não eram nada bem-vindas. Afinal, como ela se beneficiava da arrecadação de impostos da população de baixa renda, boa parte dela tinha mais a perder que a ganhar com revoltas populares que desafiassem os dirigentes romanos, cujos estilos de vida eram copiados por meio da construção de suntuosas vilas (espécie de chácaras luxuosas) nas cercanias de Jerusalém.
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Fonte – https://pradoshmitter.files.wordpress.com/2009/12/the_crucifixion_tintoretto_1565.jpg
A própria opulência do Templo do Monte de Jerusalém, reconstruído por Herodes, o Grande, parecia uma evidência de que a aliança entre os romanos e os judeus seria eterna. A construção era impressionante até mesmo para os padrões romanos, o que fazia de Jerusalém um importante centro regional em sua época.
Em meio às festas religiosas, o comércio da cidade florescia cada vez mais. Vendia-se de tudo por lá, incluindo animais para serem sacrificados no templo. Os mais ricos podiam comprar um cordeiro para ser sacrificado e quem tivesse menos dinheiro conseguia comprar uma pomba no mercado logo em frente. A cura de todos os problemas do corpo e da alma (na época, as doenças eram relacionadas à impureza do espírito) passava pela mediação dos rituais dos sacerdotes do templo.
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Representação da crucificação de Cristo através do pintor italiano Giotto di Bondone (1266 – 1337) – Fonte – http://art-now-and-then.blogspot.com.br/2014/05/art-and-jesus-crucifixion.html
Não é difícil imaginar a afronta que devia ser para esses líderes religiosos ouvir que um judeu rude da Galileia curava e livrava as pessoas de seus pecados com um simples toque, sem a necessidade dos sacerdotes. A maioria dos pesquisadores concorda que atos subversivos como esses seriam suficientes para levar alguém à crucificação.
Quase tudo o que os pesquisadores conhecem sobre a crucificação deve-se à descoberta, em 1968, do único esqueleto encontrado de um homem crucificado em Giv’at há-Mivtar, no nordeste de Jerusalém. Após uma análise dos ossos, eles concluíram que os calcanhares do condenado foram pregados na base vertical da cruz, enquanto os braços haviam sido apenas amarrados na travessa. A raridade da descoberta deve-se a um motivo perturbador: a pena da crucificação previa a extinção do cadáver do condenado, já que o corpo do crucificado deveria ser exposto aos abutres e aos cães comedores de carniça. A idéia era evitar que o túmulo do condenado pudesse servir de ponto de peregrinação de manifestantes. De qualquer forma, a descoberta desse único esqueleto preservado prova que, em alguns casos, o corpo poderia ser reivindicado pelos parentes do morto, o que talvez tenha acontecido com Jesus.
O que aconteceu após sua morte?
Para os pesquisadores, a vida do Jesus histórico encerra-se com a crucificação. “A ressurreição é uma questão de fé, não de história”, diz Richard Horsley.
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A ressurreição de Cristo na visão do italiano Piero della Francesca (1415 — 1492) – Fonte – http://www.jesus-story.net/painting_resurrection.htm
Tudo o que os historiadores sabem é que, apesar de pequeno, o grupo de seguidores de Jesus logo conseguiria atrair adeptos de diversas partes do mundo. E foi um dos novos convertidos, um ex-soldado que havia perseguido cristãos e ganhara o nome de Paulo, que se tornaria uma das pedras fundamentais para a transformação de Jesus em um símbolo de fé para todo o mundo. Com sua formação cosmopolita, Paulo lutou para que os seguidores de Jesus trilhassem um caminho independente do judaísmo, sem necessidade de obrigar os convertidos a seguirem regras alimentares rígidas ou, no caso dos homens, ser obrigados a fazer a circuncisão. A influência de Paulo na nova fé é tão grande que há quem diga que a mensagem de Jesus jamais chegaria aonde chegou caso ele não houvesse trabalhado com tanto afinco para sua difusão.
Mesmo para quem não acredita em milagres, não há como negar que Paulo e os outros seguidores de Jesus conseguiram uma proeza e tanto: apenas três séculos após sua morte, transformaram a crença de uns poucos judeus da Palestina do século I na religião oficial do Império Romano. Por essa época, a vida do judeu Yesua já havia sido encoberta pela poderosa simbologia do Cristo: assim como os judeus sacrificavam cordeiros para Javé, o Cristo se tornaria símbolo do cordeiro enviado por Deus para tirar os pecados do mundo. Desde então, a história de boa parte do mundo está dividida entre antes e depois de sua existência.

SAIBA MAIS –
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Fonte – http://www.crystalinks.com/isis.html
Nossa Senhora de Ísis
De onde pode ter se originado uma das mais belas imagens cristãs
Se você acha que conhece a imagem acima, é bom dar uma olhada com um pouco mais de atenção. À primeira vista, ela parece, de fato, representar a Nossa Senhora embalando o menino Jesus. Mas não é. A imagem da estátua é uma representação da deusa egípcia Ísis oferecendo o peito a seu filho Hórus. Apesar de não haver como provar que as imagens de Nossa Senhora tenham sido inspiradas diretamente em representações como essa, os pesquisadores sabem que o cristianismo sofreu, em seus primórdios, a influência de diversos cultos que faziam parte dos mundos egípcio e greco-romano. “Desde seu início, o cristianismo tinha uma diversidade assombrosa”, diz o professor de Teologia Gabriele Cornelli, da Universidade de Brasília. Na região do Egito, por exemplo, prevalecera o chamado cristianismo gnóstico, cujos textos revelam um Jesus bem mais parecido com um monge oriental. Alguns historiadores acreditam até que alguns cristãos gnósticos possam ter sido influenciados por missionários budistas vindos da Índia.

O luxo que vem de Roma – Diferentemente de Jesus, nobres judeus viviam muito bem, obrigado

Para a elite judaica que vivia na Palestina do século I, levar uma vida com requinte e elegância era sinônimo de viver como os romanos. Escavações arqueológicas em Jerusalém e outras cidades indicam uma clara influência da arquitetura e da decoração de Roma no interior das mansões. Para criar uma atmosfera palaciana, era comum, no interior das casas, a reprodução de afrescos e desenhos decorativos com motivos florais e geométricos. Em ambientes maiores, as colunas no estilo romano eram indispensáveis, assim como o uso de mármore para o acabamento dos detalhes – quem não podia pagar pelo mármore usava uma tinta de cor parecida para manter a aura palaciana. Fontes, vasos vitrificados e pisos de mosaico colorido também faziam parte do sonho de consumo dos novos ricos de Jerusalém, que costumavam receber os amigos influentes recostados confortavelmente no triclinium, espécie de divã usado na hora das refeições. Resquícios da importação de vinhos e outros ingredientes nobres da cozinha mediterrânea, como o garum, um molho especial de peixe típico da cidade de Pompéia, também foram encontrados no interior das mansões. Algumas delas deviam ter uma vista privilegiada para o Templo de Jerusalém, de onde os nobres podiam assistir confortavelmente à movimentação dos peregrinos ou mesmo à condenação à morte de rebeldes judeus.

EM DELÍRIO Por que é que nós vivemos tão distantes, Si estamos neste sonho todo incerto: - Eu ao teu lado em pulsações vibrantes, E tu, long...