quarta-feira, 18 de setembro de 2019

AUGUSTO SEVERO, O PIONEIRO ESQUECIDO


IMAGEM   DEIXE UM COMENTÁRIO

Gilberto Freyre (1900-1987) sociólogo, historiador e ensaísta brasileiro, autor do livro Casa Grande & Senzala.

Em 1942 o Pernambucano Gilberto Freyre Recordou Augusto Severo, Trazendo Interessantes Aspectos Sobre Essa Importante Figura da História Potiguar.
Fonte – Diário de Pernambuco, 30 de junho de 1942.
Esteve um desses dias comigo um parente que só conhecia de nome; o Sr. Sérgio Severo de Albuquerque Maranhão. Reside em Natal — de onde raramente sai — mais é filho de um grande nômade Augusto Severo. Um grande nômade que sempre se deliciou em voltar ao seu nativo Rio Grande do Norte, os olhos cheios de saudade da terra querida, as malas cheias de brinquedos para os filhos e de presentes para a mulher e os amigos.

Augusto Severo – Fonte – MUSÉE DE L’AIR ET DE L’ESPACE
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Durante longo tempo conversamos sobre aquela figura romântica do mil e novecentos brasileiro, meio esquecida pela gente de hoje; mesmo pela mais sensíveis aos encantos esportivos e os vantagens militares e econômicas da aviação. Quando a verdade é que Augusto Severo deveria estar hoje recolhendo homenagens tão entusiásticas como as que se dirigem a Santos Dumont.

Pois o grande romântico não era nenhum lunático de quem a mania de voar tivesse se apoderado de repente; nem um ricaço para quem o balão fosse apenas um esporte caro e snob. Era um nortista pobre, mas equilibrado e de boa saúde — um fidalgo do Norte pobre como tantos outros do seu tempo e até dos nossos dias — a quem o problema do dirigível sempre interessou: desde seus dias de adolescente. Já então, andando muito com meu tio e seu primo José Antônio Gonçalves de Mello, ele costumava dizer ao seu camarada, apontando para os urubus a voarem sobre os coqueiros pernambucanos, “seu Juca, precisamos achar um jeito de fazer o mesmo”. Parecia-lhe uma vergonha que, neste particular, o homem continuasse inferior ao urubu.

O Pax, dirigível de Augusto Severo, antes do seu acidente mortal em Paris, França.

Mas é Sérgio Severo quem agora me dá traços mais característicos da personalidade do inventor do balão Pax, ao mesmo tempo que me enriquece o material fotográfico sobre o mil e novecentos brasileiro destinado ao ensaio Ordem e Progresso, com uma serie interessantíssima de retratos de Augusto. Em todos eles, o inventor sobressai pela estatura de fidalgo eugênico pelo porte quase de oficial de exército europeu pelos olhos romanticamente negros, pelo bigode farto e magnífico de príncipe de ciganos que se tivesse desprendido dos adornos de ouro para passear pelas ruas de Paris, do Rio de Janeiro e do Recife, vestido sobriamente à moda ocidental.

No dia 12 de maio de 1952 foi lembrado o quinquagésimo ano da morte de Augusto Severo de Albuquerque Maranhão no Centro Norte-rio-grandense, no Rio de Janeiro. A solenidade foi comandada por Café Filho, então Presidente da República e contou com a presença de várias autoridades potiguares. O Centro Norte-rio-grandense ficava localizado no 8º andar do Edifício Rio Branco, na avenida homônima, número 257, no Centro do Rio de Janeiro.
EPORT THIS AD
Essa figura esplendida de aristocrata do Norte que nos surge de um passado ainda recente todo vermelho do próprio o sangue e não do sangue dos outros, está as merecer a atenção de um Gondim da Fonseca ou de um Francisco de Assis Barbosa — escritores a cujo talento, sensibilidade e coragem de pesquisa devemos páginas tão atraentes e lúcidas sobre Santos Dumont. Que aproveitem eles a memória ainda viva, as recordações ainda frescas, as fotografias ainda nítidas, os papeis ainda intactos, as relíquias preciosas, guardadas pelo próprio filho de Augusto Severo na sua casa provinciana da Rua Dr. Barata, em Natal. As recordações também de Gonçalves de Melo, figura ilustre de “bispo do Tesouro”, ultimamente aposentado e que foi tão camarada do primo inventor nos dias de sua mocidade.

Confesso que me deliciei o ouvindo uma tarde inteira Sérgio Severo de Albuquerque Maranhão referir, em conversa despretensiosa, mas cheia de pitoresco humedecido pela melhor das ternuras filiais, traços do quase esquecido pioneiro sul-americano da aviação. Traços que nos revelam não só a profundidade, a densidade e a autenticidade de “brasileiro velho” de Augusto como a sua meticulosidade quase medieval de artesão, sua paciência de artista, a habilidade das suas mãos de quase gigante, para realizar as tarefas mais difíceis e mais finas. Ou simplesmente as mais domésticas.

Fonte – https://manoelmauriciofreire.blogspot.com/2009/01/biografia-de-augusto-severo.html

Era homem de descer a cozinha e ele próprio preparar um molho para o peixe do almoço ou um doce tradicional para a sobremesa do jantar: de pegar de um bordado da mulher e continuá-lo ou concluí-lo com e igual esmero. Essa aptidão para trabalhos delicados de agulha e de doçaria, para artes que, em geral, são de moças caseiras ou de velhas aias pachorrentas, juntava-se nele a uma sólida e aventurosa masculinidade de nortista bem nascido. Nortista de família célebre pelos seus homens agigantados e alourados que os arianistas menos ortodoxos não hesitariam em proclamar nórdicos desgarrados no Brasil tropical, fechando os olhos a mancha magnólia que nos Albuquerque Maranhão menos louros deve recordar o sangue remoto de avôs indígenas.

https://tokdehistoria.com.br

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Natal Nostálgica.
Estádio Juvenal Lamartine em dia de jogo, década de 20

ALECRIM… – LUÍS DA CÂMARA CASCUDO


Luís da Câmara Cascudo

Autor – Luís da Câmara Cascudo
Publicado originalmente – A República, Sábado, 10 de outubro de 1942


“O bairro do Alecrim, com todos os elementos sociais que caracterizam uma Cidade, já se espalha e derrama sua população em quilômetros e quilômetros, num avanço tentacular e dominador.
Há quem viva seis meses sem vir ao Natal porque o Alecrim é bastante para a ressonância de interesses comerciais e domésticos.
Como teria começado esse Alecrim?


Rua Amaro Barreto.

Não conta ainda cem anos de existência. Em abril de 1856, quando o Cemitério foi inaugurado, o Presidente Antonio Bernardo de Passos informava ter adquirido um carro fúnebre em razão da “grande distância entre o Cemitério e esta Cidade”.
O Alecrim ficava no fim do Mundo…
Em outubro de 1871, o Presidente Delfino informava que a única desvantagem da Fonte Pública (Bica), no Baldo, “era ficar no último ponto do bairro alto da Cidade”.


Foto postada no blog http://www.canindesoares.com
Em dezembro de 1878, o Vice-Presidente Manuel Januário Bezerra Montenegro aludia ao Cemitério, “situado à grande distância da Cidade”.
Raríssimas pessoas residiam naquele descampado. Era terra de roçados de mandioca e milho, zona de caçada para os Morros. Umas quatro casinhas, de taipa, cobertas de palha, sem reboco, denominadas “capuabas”, estavam dispersas num âmbito de légua quadrada.
Quando, a 7 de setembro de 1882, o Presidente Francisco de Gouveia Cunha Barreto pôs a primeira pedra para o “Lazareto da Piedade” (Asilo dos Alienados), o Alecrim era uma capoeira, entrecortada de tufos verdes de vegetação. Dizia-se que por ali passava a “estrada velha de Guararapes”. Nada mais.


Bonde da linha do Alecrim, fotografado em fins de 1942, pelo oficial da USAAF Robert C. Henning. Fonte – Livro Eu não sou herói-A história de Emil Petr, de Rostand Medeiros, 2012, pág. 92
Nos primeiros anos da República, o negro Manuel Lourenço possuiu o sítio mais distanciado, “Mangueira”, hoje Praça Gentil Ferreira.
Alguns cochicholos erguiam as humildes cumieiras na Av. José Bernardo e Praça Pedro II. No principio desta última residia uma velha que costumava enfeitar com raminhos de alecrim os caixões de “anjinhos” quando esses passavam caminho do Cemitério, carregados pelos meninos das escolas públicas. “A velha do Alecrim” deu origem ao apelido que se estendeu a todo bairro.
João Vicente Ferreira e Flora Lourival eram os únicos moradores, em casas distanciadíssimas, na primeira década republicana.


Igreja São Pedro e Praça Dom Pedro II no Alecrim – Fonte – https://guiadeturismoblog.wordpress.com/2016/05/17/historia-do-bairro-do-alecrim/
O ponto mais longínquo era “Mangueira”, de Manuel Lourenço (Praça Gentil Ferreira), onde depois Fausto Leiros plantou um roçado.
Seguia-se o “Alto da Bandeira”, tendo essa denominação porque o industrial Amaro Barreto, abrindo a estrada de Macaíba para Natal, ali fincou uma alta e grande bandeira para orientar os trabalhadores. Ficou o topônimo: – “Alto da Bandeira” no cruzamento da Rua Fonseca e Silva com a Av. Presidente Quaresma, num comoro.
Aí se levantava, assombrando os tardios transeuntes, a “Cruz do Amaro”, recordando o assassinato de Amaro Xavier do Nascimento, em 1894.
Outro ponto de concentração demográfica era a “Baixa da Égua”, que o Vigário João Maria mudou para “Baixa da Beleza” e onde se construiu a capela de S. Sebastião.
Em 1905, na epidemia de varíola, o Alecrim estava densamente povoado, campo da inesgotável caridade do Padre João Maria. Ao redor da Praça Pedro II, as casinhas se aprumavam.
Mesmo assim, de Natal até o Baldo (Praça Carlos Gomes), havia caminho limpo. Para cima era uma trilha serpeando no meio do mato.


Fonte – https://guiadeturismoblog.wordpress.com/2016/05/17/historia-do-bairro-do-alecrim/

Em 1912 a Escola de Aprendizes Marinheiros ficou no Refoles, articulando-se com os centros do Alecrim pela Rua Silvio Pelico. Em 1914, o Governador Ferreira Chaves fala na “grande distância para Natal”. A 15 de agosto de 1919, Alecrim é freguesia com sede na Igreja de S. Pedro.
Apesar desse progresso, ainda em 1910 caçavam veados e cotias na Av. Alexandrino de Alencar.
Atualmente, com suas praças iluminadas, auto-falantes, cinemas, jogos populares, elegâncias, confeitarias, cafés, bilhares, namoros, brigas, delegacia de polícia, farmácias, médicos, dentistas, comércio ativo e farto, Alecrim recebe, hospeda e fixa dois terços dos visitantes dos sertões seridoenses e do oeste, no amavio do seu conforto e nas possibilidades de sua atividade incessante.
Diariamente suas ruas transbordam para o sul e para oeste, crescendo, crescendo…
O Alecrim é de ontem. Em plena meninice mostra o que será na futura maturidade.”
Fonte: A República, Sábado, 10 de outubro de 1942.

ALECRIM… – LUÍS DA CÂMARA CASCUDO






Luís da Câmara Cascudo

Autor – Luís da Câmara Cascudo
Publicado originalmente – A República, Sábado, 10 de outubro de 1942


“O bairro do Alecrim, com todos os elementos sociais que caracterizam uma Cidade, já se espalha e derrama sua população em quilômetros e quilômetros, num avanço tentacular e dominador.
Há quem viva seis meses sem vir ao Natal porque o Alecrim é bastante para a ressonância de interesses comerciais e domésticos.
Como teria começado esse Alecrim?


Rua Amaro Barreto.

Não conta ainda cem anos de existência. Em abril de 1856, quando o Cemitério foi inaugurado, o Presidente Antonio Bernardo de Passos informava ter adquirido um carro fúnebre em razão da “grande distância entre o Cemitério e esta Cidade”.
O Alecrim ficava no fim do Mundo…
Em outubro de 1871, o Presidente Delfino informava que a única desvantagem da Fonte Pública (Bica), no Baldo, “era ficar no último ponto do bairro alto da Cidade”.


Foto postada no blog http://www.canindesoares.com
Em dezembro de 1878, o Vice-Presidente Manuel Januário Bezerra Montenegro aludia ao Cemitério, “situado à grande distância da Cidade”.
Raríssimas pessoas residiam naquele descampado. Era terra de roçados de mandioca e milho, zona de caçada para os Morros. Umas quatro casinhas, de taipa, cobertas de palha, sem reboco, denominadas “capuabas”, estavam dispersas num âmbito de légua quadrada.
Quando, a 7 de setembro de 1882, o Presidente Francisco de Gouveia Cunha Barreto pôs a primeira pedra para o “Lazareto da Piedade” (Asilo dos Alienados), o Alecrim era uma capoeira, entrecortada de tufos verdes de vegetação. Dizia-se que por ali passava a “estrada velha de Guararapes”. Nada mais.


Bonde da linha do Alecrim, fotografado em fins de 1942, pelo oficial da USAAF Robert C. Henning. Fonte – Livro Eu não sou herói-A história de Emil Petr, de Rostand Medeiros, 2012, pág. 92
Nos primeiros anos da República, o negro Manuel Lourenço possuiu o sítio mais distanciado, “Mangueira”, hoje Praça Gentil Ferreira.
Alguns cochicholos erguiam as humildes cumieiras na Av. José Bernardo e Praça Pedro II. No principio desta última residia uma velha que costumava enfeitar com raminhos de alecrim os caixões de “anjinhos” quando esses passavam caminho do Cemitério, carregados pelos meninos das escolas públicas. “A velha do Alecrim” deu origem ao apelido que se estendeu a todo bairro.
João Vicente Ferreira e Flora Lourival eram os únicos moradores, em casas distanciadíssimas, na primeira década republicana.


Igreja São Pedro e Praça Dom Pedro II no Alecrim – Fonte – https://guiadeturismoblog.wordpress.com/2016/05/17/historia-do-bairro-do-alecrim/
O ponto mais longínquo era “Mangueira”, de Manuel Lourenço (Praça Gentil Ferreira), onde depois Fausto Leiros plantou um roçado.
Seguia-se o “Alto da Bandeira”, tendo essa denominação porque o industrial Amaro Barreto, abrindo a estrada de Macaíba para Natal, ali fincou uma alta e grande bandeira para orientar os trabalhadores. Ficou o topônimo: – “Alto da Bandeira” no cruzamento da Rua Fonseca e Silva com a Av. Presidente Quaresma, num comoro.
Aí se levantava, assombrando os tardios transeuntes, a “Cruz do Amaro”, recordando o assassinato de Amaro Xavier do Nascimento, em 1894.
Outro ponto de concentração demográfica era a “Baixa da Égua”, que o Vigário João Maria mudou para “Baixa da Beleza” e onde se construiu a capela de S. Sebastião.
Em 1905, na epidemia de varíola, o Alecrim estava densamente povoado, campo da inesgotável caridade do Padre João Maria. Ao redor da Praça Pedro II, as casinhas se aprumavam.
Mesmo assim, de Natal até o Baldo (Praça Carlos Gomes), havia caminho limpo. Para cima era uma trilha serpeando no meio do mato.


Fonte – https://guiadeturismoblog.wordpress.com/2016/05/17/historia-do-bairro-do-alecrim/

Em 1912 a Escola de Aprendizes Marinheiros ficou no Refoles, articulando-se com os centros do Alecrim pela Rua Silvio Pelico. Em 1914, o Governador Ferreira Chaves fala na “grande distância para Natal”. A 15 de agosto de 1919, Alecrim é freguesia com sede na Igreja de S. Pedro.
Apesar desse progresso, ainda em 1910 caçavam veados e cotias na Av. Alexandrino de Alencar.
Atualmente, com suas praças iluminadas, auto-falantes, cinemas, jogos populares, elegâncias, confeitarias, cafés, bilhares, namoros, brigas, delegacia de polícia, farmácias, médicos, dentistas, comércio ativo e farto, Alecrim recebe, hospeda e fixa dois terços dos visitantes dos sertões seridoenses e do oeste, no amavio do seu conforto e nas possibilidades de sua atividade incessante.
Diariamente suas ruas transbordam para o sul e para oeste, crescendo, crescendo…
O Alecrim é de ontem. Em plena meninice mostra o que será na futura maturidade.”
Fonte: A República, Sábado, 10 de outubro de 1942.

segunda-feira, 2 de setembro de 2019

“QUEM DORME MAL, PENSA MAL, TRABALHA MAL, DECIDE MAL, VIVE MAL”

Teresa Paiva deu uma entrevista ao número de março de 2019 da revista Visão Saúde, nas bancas desde o início do mês. A entrevista tem como título  “quem dorme mal, pensa mal, trabalha mal, decide mal, vive mal”
A neurologista e especialista em medicina do sono, directora do Centro de Electroencefalografia e Neurofisiologia Clínica, referiu, por exemplo, sobre a importância do sono na capacidade e bem-estar das pessoas: 
“Está provado cientificamente que o sono é bom conselheiro no aspecto cognitivo e emocional”.
“Se aprendemos qualquer coisa e dormimos a seguir, há uma taxa de melhoria de aprendizagem. E durante o sono há uma reorganização da informação do dia a dia que leva a uma melhoria cognitiva, pois grande parte de memórias desnecessárias é deitada fora. As essenciais são guardadas e organizadas”, acrescentou.
E sobre as consequências de um mau sono disse Teresa Paiva :
“Dormir pouco é um risco social porque aumenta a violência, as más decisões, o número de doenças e de acidentes, aumenta a mortalidade precoce”.
http://www.isleep.pt

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Rosa - Marisa Monte

A misteriosa Ilha de Manoel Gonçalves

Por João Felipe da Trindade
A misteriosa Ilha de Manoel Gonçalves
Manoel Rodrigues de Melo tinha um sonho de escrever um livro sobre Macau, comemorativo ao 1º centenário desse município. Estava escrevendo, também, um livro sobre a família Rodrigues Ferreira, pois descendia do português Manoel Rodrigues Ferreira, um dos que deixaram a Ilha de Manoel Gonçalves para povoar Macau. Foi juntando informações, mas não sei se deixou alguma coisa pronta desses dois desejos. Mas, aqui e acolá vamos encontrando alguns registros deixados por ele.
Por um artigo na revista Bando, escrito por Manoel Rodrigues, sabe-se que houve um saque por parte dos ingleses, em 1818, na Ilha de Manoel Gonçalves. Nesse mesmo artigo cita o individuo Alexandre José Pereira como Chefe do Degredo da Ilha, revelando um lugar para cumprimento de pena. Há nesse mesmo documento trechos de uma carta escrita pelo Capitão João Martins Ferreira para o Governador José Ignácio Borges.
Não se sabe, exatamente, quando a Ilha de Manoel Gonçalves surgiu. Tampouco se sabe o ano em que ficou totalmente coberta. Se cogita, também, a possibilidade dela ressurgir. Há dúvidas, até hoje, quanto à origem do seu nome. Uns falam que se originou de um sesmeiro que a possuía, mas nunca apresentaram uma Sesmaria concedida a Manoel Gonçalves. Outros dizem que Manoel Gonçalves era um piloto que a descobriu. Como a ilha é de Manoel Gonçalves, poderia seu nome ter se originado de alguém com esse nome que viveu por lá. Talvez algum documento, ainda escondido, possa esclarecer mais adiante essa incógnita.
Acho que era um ponto de muitas atividades, e que muitas pessoas que tinham interesses na Ilha não viviam na mesma, mas sim, em algumas fazendas naquela região. Ali houve muitos casamentos e batismos. Passaram por lá padres, freis, militares, comerciantes, navegadores, degredados e outras pessoas em busca de oportunidades. É, entretanto incrível como poucas informações nos chegaram até hoje, por parte dos que moraram ou tinha algum negócio por lá. Nem os descendentes, dos que viveram ou passaram por lá, trazem informações mais precisas sobre a Ilha.
Encontramos o seguinte trecho no livro “A indústria extrativa do Sal e a sua importância na economia do Brasil” de Dioclécio Duarte
“Deixamos atrás a ilha de Manoel Gonçalves, que as águas arrebataram, há um século, criando a lenda da nova Atlântida nas terras do nordeste brasileiro. Para essa ilha, os antigos piratas, reza a tradição, conduziam o ouro que roubavam dos barcos que singravam o oceano.”
Manoel Rodrigues de Melo escreveu, sobre uma disputa de terras, entre os compadres Francisco Trajano Xavier da Cunha e o Capitão João Martins Ferreira, habitante da Ilha de Manoel Gonçalves, na Revista da Academia Norte-riograndense de Letras, de número 11, o que se segue:
“A Ilha de Manuel Gonçalves já não existia, em 1836, como centro de comércio e porto de pescaria, mas, tão somente como ponto de referência de um mundo velho que desaparecia em face de um novo mundo que surgia
E a prova é que, três anos depois, em 1839, realiza-se na povoação de Macau, em casa de aposentadoria do Capitão André de Sousa Miranda, Juiz de Paz Suplente, uma audiência, em que o Escrivão de Paz do Distrito de Guamaré, Antonio Carneiro da Costa, tomava por termo uma Petição de conciliação em que eram partes como Autores os Capitães Jacinto João da Ora, Francisco Trajano Xavier da Cunha, José Pedro da Silveira, Tenente Coronel João Marques Carvalho, e como Réus o Capitão João Martins Ferreira e sua mulher Dona Josefa Clara Lessa.”
A essa audiência compareciam, como procurador de José Pedro da Silveira, Tomas Vieira de Melo, e como procurador do Tenente Coronel João Marques de Carvalho da Silva Loureiro, o Coronel Jerônimo Cabral Pereira de Macedo.
Este documento, trás, a meu ver, muita luz à história de Macau, pois nele figuram Jacinto João da Ora e João Martins Ferreira, dados como fundadores da nova povoação, além do Coronel Jerônimo Cabral Pereira de Macedo, que teria mais tarde, grande atuação, na elevação à categoria de Vila e depois Cidade de Macau.
Além disso, as terras em questão eram as sobras denominadas Canafístula, da data do Curralinho, e Águas Novas, do mesmo município, ainda hoje conhecidas por estes nomes.”
Para concluir, transcrevo um registro de casamento na Ilha de Manoel Gonçalves, no ano de 1830, e um batismo em 1840. Lembro que Francisco Lopes Galvão casou na Ilha, em 1835, com Felipa Maria da Conceição.
“Aos dezoito dias do mês de Julho de mil oitocentos e trinta pelas nove horas da manhan na Capela de Nossa Senhora da Conceição da Ilha de Manoel Gonçalves, com minha presença e das testemunhas abaixo nomiadas, se receberão por Esposos presentes, Nicolau Vieira de Mello e Maria Francisca da Fonseca meus fregueses, Dispensados os Proclamas pelo Ilustríssimo e Reverendissimo Senhor Doutor Provisor. O Esposo de vinte e seis annos, filho legitimo dos fallecidos Vicente Correa de Mello e Maria Dantas Faria, a Esposa de vinte e dous annos filha legitima de José Antonio da Fonseca e Maria Magalona, naturaes e moradores neste Assu e sem impedimento logo lhes dei as bênçãos matrimoniaes, sendo primeiramente confessados e examinados na Doutrina Christan, presentes por testemunhas o Capitão João Martins Ferreira e o Capitão Silvério Martins de Oliveira, casados, todos deste Assu, e para constar fis este assento em que me assignei, Joaquim José de Santa Anna, Parocho do Assu.”
O último registro que encontrei, até agora, na Ilha de Manoel Gonçalves, foi o batismo de Maria, filha de Francisco de Sousa e Maria Ferreira, na data de 23 de Novembro de 1843, pelo Coadjutor Francisco Urbano de Albuquerque Montenegro. Esse mesmo Coadjutor esteve batizando no dia 25 em Alagamar, no dia 26 na Boca do Rio e em 1 de Dezembro, do mesmo ano, nas Oficinas.

segunda-feira, 26 de agosto de 2019

JESUINO BRILHANTE, O FILME

Em 1972 o povo hospitaleiro e generoso do Assu de tantos poetas, de tradições pioneiras, recebeu um grupo de atores (cabeludos) cinematográficos, para que aquela cidade e região, fosse cenário principal do primeiro filme longa metragem produzido no Rio Grande do Norte, intitulado "Jesuíno Brilhante, O Cangaceiro", produzido pelo cineasta potiguar de Ipanguaçu/RN, então radicado no Rio de Janeiro, onde veio a falecer em 1991 chamado artisticamente de William Coobet (Cosme na tradução, seu sobrenome de registro, família tradicional daquela terra ipanguaçuense).


O filme tem fotografia de Carlos Tourinho, música de Mário Pariz e o seu protagonista é Neri Vitor, produção de Eliana Coobet. É uma produção em Eastmancolor. Suas filmagens tem duração de 1h40m., 35mm e o seu produtor associado é Jonas Garret. O enredo é sobre o cangaço e o gênero é de aventura - rodado que foi em reprise com destaque no 15º Festival de Cinema de Natal, realizado no mês de julho de 2006. Fez sucesso no Brasil e foi rodado especialmente a convite no Festival de Moscou, em 1973. Algumas das suas cópias estão espalhadas em diversos países como Russia, Espanha, Romênia, Checoslováquia, Índia e Polônia.

Conta a história de um cangaceiro romântico chamado Jesuíno Alves Calado (Jesuíno Brilhante), nome que herdara de seu tio, também cangaceiro. Jesuíno nasceu no sítio "Tuiuú", distante sete quilômetros da cidade de Patu, região oeste do Rio Grande do Norte.

Câmara Cascudo depõe que Jesuíno "é o primeiro cangaceiro na memória do oeste norte-rio-grandense. Deixou funda lembrança de valentia, destemor e fidalguia. Era o aut-low gentlil homem, imperioso, arrebatado, incapaz de insultos por vaidade ou de uma agressão inútil."

Voltando ao filme, participaram da filmagem, artistas de nome nacional como Neri Victor, Rodolfo Arena (como Soares), Vanja Orico (como Maria de Goes - lembro-me que Vanja fora hóspede da escritora Maria Eugênia - além de Waldir Onofre (como Zé), Miltom Vilar (como Francisco Limão), Hilda Melo (como Margarida), Maria Lucia Escócia (Jesuíno´s Mother), Wandick Wandré, Rojerio Tapajós (como Silvestre), Eriel José (como Jojeu), Helio Duda (como Juvenal), Mário Paris (como Cobra Verde, Anteór Barreto (natural de Ipanguaçu), além de Regina Accioli, Clementina de Jesus, Jesiel Figueredo (ator potiguar que fez uma cena no Forte dos Reis Magos como o governador da província), Tony Machado, Rui Marques, Daniel Rosental e Nestor Saboia.

Varias pessoas da sociedade assuense deram a sua colaboração como figurantes. Entre tantos: Pedro Cícero de Oliveira, José Caldas Soares Filgueira Filho (Dedé Caldas), Zélia Amorim, Francisco Evaristo de Oliveira Sales (dr. Sales) que foi médico em Assu durante décadas, José Marcolino de Vasconcelos (Dedé de Aiá), Raimundo Márcio Borges de Sá Leitão (Itinho de Durval), Monte Lacerda, Fernando Montenegro, entre outros.

Além do município do Assu, as filmagens fora produzida em Ipanguaçu, Mossoró, Tibau, Patu e nos cerrados de Lages, bem como na cidade do Natal, onde fora concluída a filmagem.

Voltando a vida de Jesuíno, Sinhazinha Wanderley no livro de Walter Wanderley intitulado Família Wanderley, 1965, conta que no Assu existiu um pequeno museu onde se encontrava exposto um pedaço do osso do braço de Jesuíno Brilhante que fora morto pela polícia da paraíba no lugar denominado Palha, distrito do Estado da Paraibano.

Fica, portanto, esse registro, como um fato cultural de muita relevância para o Assu, pois, esse filme é patrimônio cultural que deve ser relembrando e ficar catalogado nas paginas da historia assuense e do Rio Grande do Norte.

Fernando Caldas



domingo, 25 de agosto de 2019

TROVINHAS DE RENATO CALDAS


Renato Caldas viajando de Assu com destino à Natal, deu uma paradinha num certo restaurante à beira da estrada, para almoçar e tomar ''umas e outras'. Depois de uma dúzia de cerveja, pediu a conta e prosseguiu viajem. Ao chegar no lugar de destino, encontrou entre a sua bagem, uma colher que,.provavelmente, seria do restaurante onde antes teria almoçado e bebido cerveja. Aquele recinto tinha uma garçonete  muito bonitona que carinhosamente era chamada "Chiquinha", mulher que ele, Renato,  muito admirava. Dias depois, de volta ao Assu, sua terra natal, parou naquele mesmo restaurante e, ao adentrar naquele recinto foi logo em direção a Chiquinha, entregando a ela, uma um papel de cigarros com a inscrição que diz assim:

Estou de volta, Chiquinha,
Pra trazer sua colher.
De coisa que não é minha
Eu só aceito mulher.

Renato, aos seus 70 anos de idade,  já sentia o peso da idade, a tristeza da cegueira (catarata quando não ainda não tinha cura), trovou com aquela irreverência que lhe era peculiar:

Está cegando Renato,
Pois, um objeto qualquer
Só conheço pelo tato...
Principalmente mulher.

E essa outra trova afirma o quanto ele, Renato, era conformado com a cegueira que lhe acometera durante grande parte de sua vida. Vejamos:

Meus olhos estão cegando,
Não maldigo a escuridão!
Pois cinto que vai raiando
A luz da conformação.

Nas eleições municipais de 1988, eu, Fernando Caldas, o editor deste blog, disputei a reeleição para vereador. Passando pelo centro da cidade me deparo com certo vendedor de canjica (iguaria típica da culinária do Nordeste brasileiro). Comprei aquela iguaria e pedi ao vendedor que entregasse a Renato Caldas. Dito e feito. Renato entendeu que eu estava querendo agradá-lo, para conquistar novamente o seu voto. Ele não perdeu a oportunidade, me enviando por aquele vendedor, essa trovinha escrita num pedacinho de papel:

Fernando, você triste fica
A proposta não convém,
Por um prato de canjica
Eu não voto com ninguém.

Chico Dias, Mirranha, Bodinho e JB, são figuras folclóricas da cidade de Assu. Nas eleições municipais de 1976, ambos se candidataram disputando uma cadeira na Câmara Municipal da terra assuense. Amos usavam o mesmo carro de som para falar ao povo da cidade e fazer a propaganda política. Chico era estudante, Mirranha motorista de profissão, Bodinho era funcionário da prefeitura (fiscalizava a carne vendida na pedra do Mercado Público) e JB, funcionário aposentado dos Correios que gostava de tomar 'umas e outras'. Pois bem, ficaram sendo chamados por adversários políticos local, como palhaços. Chico procurou Renato para fazer um versinho em sua defesa e dos demais. Renato trovou:

Dias fala aos estudantes,
Mirranha aos motorista.
Bodinho fala aos marchantes
Aos bêbados fala Batista.

Renato Caldas veraneando na casa de praia de seu cunhado Manoel Soares Filgueira Filho, mais conhecido como Bilé Soares (Bilé era pecuarista no Vale do Açu e fora superintendente da Caixa Econômica Federal/RN, nomeado por Café Filho, quando presidente da república, ambos eram amigos íntimos). Noite alta, acordou e, ao sair de casa para apreciar as belezas do mar, escreveu a trova (Conta-se que Câmara Cascudo muito apreciava esses versos), escreveu no melhor de sua inspiração, irreverência e criatividade poética:

Saí de casa andando,
Com vontade de mijar
E vi a lua cagando
No penico azul do mar.

Num certo Concurso Nacional de Trovas que tinha como tema "A Andorinha", Renato participou e, como não podia ser diferente em razão do seu estilo irreverente de poetar, mandou essa trova, pra sua desclassificação:

Uma andorinha assustada
Por cima dos capteis,
pensa em dar uma cagada
Na cabeça dos fiéis.

O ex-deputado  estadual Nelson Montenegro reunia costumeiramente amigos em sua casa da praça Getúlio Vargas ou praça da Matriz, para um amistoso bate-papo. Renato era um dos seus frequentadores assíduos. Pois bem, Nelson Certa vez fora picado por um potó (inseto de mijo ardente). Renato escreveu:

Sofre o pobre e sofre o rico
Todos tem o mesmo fim.
Porém, eu não sou penico
Pra potó mijar em mim.

Renato andou o Brasil de ponta a ponta, nas suas intermináveis andanças de romântico caminheiro, no dizer de Expedito Silveira. E de ponta a ponta ficou conhecido. Visitando a  cidade de Pedreira, interior do Piaui, alguém lhe pedira para fazer um verso em homenagem aquela terra piauense. Renato Caldas não deixou para depois:

Jardim de pedras imensas
No engate da pedra bruta,
Quem disse que esta merda presta
É um grande filho da puta.

Fernando Caldas

O INTELIGENTE E O SABIDO

Há duas categorias de pessoas que, sobretudo no Rio Grande do Norte, merecem um debruçamento maior, uma atenção mais atenta, um enfoque mais...