segunda-feira, 8 de setembro de 2014

sábado, 6 de setembro de 2014


ASSU, SEMPRE BRILHANDO NAS LETRAS NACIONAIS

 
Dialogo com as horas
mórbidas, pouco redutíveis,
quando querem
convencer-me de sua
embriaguez,
quando querem impor limites,
quando querem marcar
territórios.

Ao longo do litígio, mostro-me
mais provocador;
incorporando ora Fausto, ora
Mefistófeles.
Estamos lúcidos, embora até
uma simples contestação
seja movida por normas,
desregramentos, falácias;

O tempo para a réplica corta o
fio de todas as solidões.
Alguém, muito longe, canta
uma canção perdida em
sussurros,
que o vento roubou sem
solicitar direitos autorais;

que a noite inventou de gravar
em estúdio de pouca acústica.
Somente meu corpo silencia
calúnias,
Somente o sonho recupera quem sou.

sussurros,
que o vento roubou sem
solicitar direitos autorais;

que a noite inventou de gravar
em estúdio de pouca acústica.
Somente meu corpo silencia
calúnias,
Somente o sonho recupera quem sou.

Foto: ASSU, SEMPRE BRILHANDO NAS LETRAS NACIONAIS

Assu, minha terra natal querida, interior potiguar, onde a poesia eterna, mora, é uma terra que sempre se destaca nas letras brasileiras. O jovem Paulo Caldas, de família assuense, carrega no sangue a veia poética dos Caldas, de seu pai e dos Soares de Macedo (dos Açores, Portugal) de sua mãe. Paulo é "doutorando de literatura comparada", poeta,  escritor, ganhou vários concursos literários, estreou nas letras com o livro  intitulado no Ventre do Mundo, publicou ainda o volume Do Picadeiro Ao Céu: O Risos no Teatro de Ariano Suassuna, e está colocado em várias antologias como O Panorama Literário Brasileiro, dentre outras. Agora, ele aparece na antologia poética sob o título Sarau - 2014 "Concurso  novos poetas. "De 3.076 inscritos de todo o país, 250 poetas foram selecionados, Nela." Naquela antologia está publicado os versos intitulado Entre a Vigília e o Sonho, que veremos abaixo para o nosso deleite:

Dialogo com as horas 
mórbidas, pouco redutíveis, 
quando querem 
convencer-me de sua 
embriaguez,
quando querem impor limites, 
quando querem marcar 
territórios. 

Ao longo do litígio, mostro-me 
mais provocador; 
incorporando ora Fausto, ora 
Mefistófeles. 
Estamos lúcidos, embora até 
uma simples contestação 
seja movida por normas, 
desregramentos, falácias; 

O tempo para a réplica corta o 
fio de todas as solidões. 
Alguém, muito longe, canta 
uma canção perdida em 
sussurros, 
que o vento roubou sem 
solicitar direitos autorais; 

que a noite inventou de gravar 
em estúdio de pouca acústica. 
Somente meu corpo silencia 
calúnias, 
Somente o sonho recupera quem sou.
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sexta-feira, 5 de setembro de 2014

 
Da linha do tempo/face de Francisco Martins.

"MARINA SILVA INELEGÍVEL????"

"A candidata ambientalista Marina Silva poderá ficar inelegível.
Segundo o Ibama, ela tentou abater um tucano e liquidou uma anta em uma mesma semana!"

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

EM FAMÍLIA

Eduardo Olympio, 28/08/2014. (Poeta Baiano).

Pela terra brasileira,
Reconhecido demais,
Disse o poeta Limeira:
“Os tempos não voltam mais”.
Desgarro da sua esteira,
Lembrando tios e pais.

Porque gosto do passado,
É por onde meus pés finco,
Pois o tempo não voltado
Insiste em deixar-me o vinco,
Auguro-me retornado
E, com a memória, brinco.

Muitas histórias eu soube
Pelos próprios personagens.
Sinto que agora me coube
Contar as tais traquinagens.
E não há quem a mim roube
O prazer das homenagens.

Pelo Porto dos Tainheiros,
Helena ao mar se atirava
E pedia aos marinheiros
Da lancha que lá estava:
“Uma corda, cavalheiros”
E à corda se agarrava.

Fazer o que divertia
Helena tinha por norma.
“Gorda leve”, se dizia,
Naturalmente na forma.
Na corda, era a travessia,
Pelo mar, a Plataforma.

Julio Olympio, liberal,
Não se incomodava não,
Era o pai, de alto astral,
De cinco, sem confusão.
Mas, mexessem com a moral
E se dava a intervenção.

Certa vez, foram os filhos
No carnaval agitar,
Mas à marcha de estribilhos
“Mamãe eu quero mamar”
Ofereceu empecilhos,
Não a podiam cantar.

Vejam que Julio era amigo
Da noite, com prosa e festa,
Onde não via perigo.
Quem ía além na seresta
Contava com seu abrigo,
Jamais pensava em dar testa.

Preferia se ir embora,
Quando a música acabasse,
Soava-lhe antes da hora
Ir sem que a orquestra findasse,
Não houvesse um bota-fora
Ou o dia não raiasse.

Olhos “claros de cristal”
Da “Lourinha” ele adorava,
Mas a mãe, no carnaval,
Em respeito, não gostava,
Pois um valor perenal
A marchinha avacalhava.

Os filhos enfim chegaram
Com amigos ao Bahiano.
Mas, apreensão mostraram,
Pois a música do ano,
Que repetida escutaram,
Era “Mamãe..”, salvo engano.

Estatelados, um tempo,
Lembravam-se da mensagem.
Superar o contratempo
Demandaria coragem,
Precisava ser e a tempo
De sair da desvantagem.

Convocaram o presente
Filho com o nome do pai:
“Júlio, o quê você sente?”
“Olhe que o tempo se esvai!”
“Tou me sentindo doente”
“Mude pra nós isso, vai”.

E o mancebo percebendo
Que só “Mamãe…” se cantava,
A meninada sofrendo,
Dançar sem cantar não dava,
Sentenciou se moendo:
“Proibição vai à fava”.

Ainda, de carnaval,
Outra história me contaram:
Com máscaras, bem normal,
Amigos que se encontraram
- Uma turma jovial -
Pra Castro Alves rumaram.

Entre os amigos, Helena,
Mascarada, no programa,
E, nem um pouco pequena,
Veste do pai o pijama,
Sob o disfarce, na arena,
Ao próprio, brincando, chama.

“Julinho, Julinho!”,
Dizia, com voz soprano,
Ao pai, que, em roupa de linho,
Chegara ao festim profano,
Com amigos de chapelinho:
“Você está lindo este ano”

Julinho, meio sem jeito,
Sem reconhecer a voz,
Nem o pijama perfeito,
Estreita casca de noz,
Com amigos do direito,
Que situação atroz!

Nunca soube como a história
Na verdade se findou,
Se houve uma vitória
Ou se o jogo empatou,
Mas risada meritória
Sei que ela provocou.

Esses fatos preciosos
A própria vida animaram,
Nos relatos venturosos,
Pela voz dos que os contaram
E são tão prodigiosos
Que os tempos pra mim voltaram.

AS DITADURAS GOLPEARAM O IDEAL DE UMA REPÚBLICA DEMOCRÁTICA





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Maria Luiza Tucci Carneiro

Nos momentos de instabilidade política, um Estado de perfil autoritário se apressa em nomear seus inimigos: anarquistas, comunistas, integralistas, feministas, terroristas. Serão eles os alvos prioritários da política repressiva.

O Brasil vivenciou dois momentos críticos de ditadura que cercearam o exercício da democracia: durante o Estado Novo comandado por Getulio Vargas (1937-1945) e durante a ditadura militar (1964-1983).Em ambos os períodos, a sociedade brasileira esteve sob a tutela de um Estado que agiu apoiado por um conjunto de aparelhos repressivos cuja ação trouxe graves consequências para o país.


Tanto durante a ditadura estadonovista quanto sob os militares, o Estado procurava evitar que ocorresse uma suposta revolução político-social no Brasil. Para reforçar esta missão, nos dois momentos foi criada uma polícia especial que deveria identificar e coibir reações políticas adversas, armadas ou não, que colocassem em perigo “a ordem e a segurança públicas”. Uma legislação específica para legitimar a repressão foi aprovada em 1935, e voltou a ser invocada na ditadura militar. Ela incluía a Lei de Segurança Nacional (LSN), o Tribunal de Segurança Nacional e as figuras do Estado de Sítio e do Estado de Guerra.

Após o golpe de 1964, as atividades da Polícia Política foram (re)orientadas pelos Atos Institucionais e pela outorga da Constituição de 1967 que, no seu conjunto, (re)instalaram o Estado de Segurança Nacional. Criou-se também uma rede de informações de combate à subversão, preconizada pela “Doutrina de Segurança Nacional”. Todos os demais órgãos repressivos estavam subordinados ao Serviço Nacional de Informações (SNI). Importante função foi delegada ao Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna – o conhecido DOI-Codi –, onde se concentraram representantes de todas as forças policiais.



ditadura

Assim, a tradicional lógica da desconfiança estava agora armada por uma logísticamilitar, oferecendo estratégias adequadas aos agentes da repressão interessados em aniquilar os grupos revolucionários.Preocupadas em comprovar o crime político, as autoridades procuravam manter a população sob constante vigilância.Agentes produziam informações que eram direcionadas ao SNI e órgãos de inteligência militares (Ciex, Cisa e Cenimar). Órgãos de repressão subordinados ao staff do regime foram instalados por todo o país sob a coordenação de um militar assessorado por uma elite de informantes. Agentes invisíveis emergiram por todos os poros da sociedade, que passou a viver em constante estado de alerta. Associações identificadas com as ideologias conservadoras – como a Tradição, Família e Propriedade (TFP), o Comando Geral Democrático e o Comando de Caça aos Comunistas – passaram a cooperar com o regime na luta contra o inimigo-maior: os comunistas. Outras informações eram obtidas sob tortura ou através de delações anônimas. A morte clandestina, extorções generalizadas e a arbitrariedade tomaram conta dos porões do DOI-Codi após 1964.

Dentre os profissionais mais visados como “subversivos da ordem” estavam os jornalistas, escritores, artistas, músicos, estudantes, livreiros, gráficos e editores. Com base na Lei de Segurança Nacional, cabia às autoridades policiais desvelar os segredos daqueles que, como arquitetos de um complô verdadeiro ou imaginário, viessem a minar a ordem estabelecida. Para isso, confiscou-se grande número de fotografias, correspondência particular, catálogos, periódicos, livros e objetos pessoais, todos devidamente anexados aos autos de investigação.

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Sucederam-se prisões ilegais de suspeitos, perseguições aos familiares, censura postal, invasões de domicílios, confiscos de objetos e documentos pessoais, deportações de estrangeiros, tortura e morte nos cárceres.Toda e qualquer arbitrariedade era justificada pela lógica da desconfiança. Os militares assumiram o papel de condutores da nação, afastando os civis das esferas de decisões políticas e transformando-os em meros coadjuvantes. A dor e o terror tornaram-se estratégias de controle das multidões.

Mas o desmoronar da República brasileira já tinha um precedente. Nos anos 1930 e 1940 ela foi minada em seus propósitos e traída em seus ideais por profissionais do poder. Sob a batuta de Getulio Vargas, os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade – herdados da República francesa – foram substituídos pela disciplina do corpo e do espírito, pelo culto à força e à raça eugênica.

Sob o slogan do “nascimento de uma nova nação” e com o auxílio das Forças Armadas, Vargas instaurou a ditadura colocando fim à nossa breve e turbulenta experiência democrática de 1934-1937, e assim traindo os ideais da Revolução de 1930.  O signo da “Ordem e progresso” continuou a ser reinvidicado pelo Estado, à custa da repressão policial, da domesticação da massa operária e do controle do pensamento. O golpe de novembro de 1937 representou o verdadeiro repúdio ao liberalismo político e econômico, consumado com o fechamento do Congresso Nacional, a extinção dos partidos políticos, das eleições e das garantias individuais.




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A Constituição de 1937, outorgada pelo próprio Vargas, conferiu plenos poderes ao presidente da República. Assim consagrou-se o ditador. A nova carta constitucional se fez baseada na centralização política, no intervencionismo estatal e contrariando o modelo liberal clássico de organização da sociedade. As liberdades civis foram suspensas, o Parlamento dissolvido, os partidos políticos extintos, nos moldes das experiências europeias recentes. De uma forma geral pairava no ar a ideia de que a “velha democracia liberal” estava em extinção. Apesar de Vargas negar qualquer similaridade com os regimes nazifascistas, a realidade política sustentada pelo Estado Novo afinava-se com os rumos trilhados na Alemanha e na Itália, cujos modelos ideológicos serviam de paradigmas para os intelectuais e dirigentes políticos integrados ao projeto étnico-político que marcou a Era Vargas.

O nacionalismo alemão transformou-se em fonte de inspiração para a construção de um Estado nacional, uniforme e padronizado cultural e politicamente. Esta uniformização implicava na exclusão de grupos estrangeiros estranhos ao projeto de nacionalização e que, de alguma forma, contestassem o regime imposto. Tal política recaiu contra as áreas de colonização europeia, com base nos decretos nacionalistas de 1938, contrariando o ideal de uma sociedade pluralista que abrigasse etnias diversidade. Em relação à imigração, o governo Vargas definiu-se pelo elogio ao homem branco, não semita ou não judeu. O povo foi seduzido por um discurso nacionalista e por mensagens legitimadoras da intolerância. À educação coube a tarefa de reforçá-las a longo prazo.

Após 1937, os sonhos republicanos caíram por terra, fragilizados pelos atos autoritários que obstruíram os caminhos que poderiam levar à soberania popular. O Estado procurou, de todas as formas, identificar e eliminar os signos de “erosão da identidade cultural brasileira”, ou seja, qualquer manifestação de identidade estrangeira ou subversiva.

O “estado de agonia” da República foi resultado da valorização de um Estado forte, intolerante e tutor da sociedade civil. Que defendeu, através de atos e programas legais, a homogeneidade racial e combateu o comunismo – tratado como ideologia “exótica” e assassina.

Já vivemos tempos sombrios, e não queremos que ressurjam. Cabe ao historiador, consciente dos silêncios propositais, desconstruir as versões divulgadas por qualquer Estado autoritário. Como num quebra-cabeça, nem todas as peças se encaixam. Registros comprometedores são escondidos e eliminados. Interessa ao autoritarismo que a história continue mal escrita.

Maria Luiza Tucci Carneiroé coordenadora do Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação do Departmento de História da USP e autora de Cidadão do Mundo: O Brasil diante do Holocausto e dos Judeus Refugiados do Nazifascismo, 1933-1948(Perspectiva, 2011)

Fonte: Tok de História.

No Brasil, a xilogravura se disseminou como técnica de expressão à medida que foi associada à literatura de cordel

Beliza Áurea de Arruda Mello

No princípio era a voz que se fez letra e, depois, xilogravura. Esta é a gênese do cordel no Brasil. A voz da poesia cantada que depois vira letra impressa no folheto e, por último, é acompanhada da xilogravura como ilustração. A história da xilografia, aqui, se mistura com a do cordel. Não há como desvincular uma da outra.
O folheto de cordel nasceu como forma de imprimir os versos entoados pelos cantadores-poetas do povo que interpretam os desafios. O primeiro folheto de que se tem notícia apareceu em Recife, em 1865, impresso na Tipografia de F. C. Lemos e Silva, com o título imenso de Testamento que faz um macaco especificando suas gentilezas, gaitices, sagacidade, etc. Mas foi a partir da abolição da escravidão do Brasil, em 1888, que houve o fortalecimento dessa nova forma de expressão.

Os ex-escravos podiam agora ser integrados ao mercado de trabalho formal e assalariado. Entre as novas profissões, proliferava a de vaqueiros, encarregados de transportar o gado pelos sertões do Nordeste. Muitos desses vaqueiros eram poetas do povo que entoavamaboios, canto típico do trabalho para tanger o boi; ou desafios, uma disputa poética cantada de improviso; ou ainda pelejas, outra espécie de luta poética de improviso em horas de trabalho, de folga e de festa. Os poetas, nascidos em zona rural, estavam “livres” e tinham certa autonomia para deslocamentos físicos.

Um dos primeiros e mais conhecidos poetas populares do Nordeste foi Leandro Gomes de Barros, nascido em 1865, na cidade de Pombal, no sertão da Paraíba. Em seus folhetos é possível encontrar narrativas sobre bois muito recorrentes nos sertões nordestinos, comoO Rabicho da Geralda. A história é tão comum que o escritor José de Alencar chegou a classificá-la de “poemeto sertanejo”.São dele célebres folhetos de cordel, como O cavalo que defecava dinheiro, que inspirou o Auto da Compadecida, do escritor Ariano Suassuna, e a Batalha de Oliveiros com Ferrabrás, um clássico baseado no tema do rei Carlos Magno e sua luta com o diabo. Pela qualidade dos seus cordéis, ele foi chamado por Carlos Drummond de Andrade de o “príncipe dos poetas”.
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Outros pioneiros – todos paraibanos – são: Silvino Piruá de Lima, nascido em 1848, que escreveu A História de Zezinho Mariquinha; Francisco das Chagas Batista, nascido em 1882, que em 1902 publicou Saudades do sertão; e João Martins de Athayde, nascido em 1880, autor de O preto e o branco apurando qualidade, de 1908, e responsável por introduzir ilustrações nas capas dos folhetos de cordel no Brasil. Tanta ebulição cultural na Paraíba produziu, em 1913, a Popular Editora, uma casa de cordéis criada pelo poeta Francisco das Chagas Batista – tão importante para a expressão cultural do Brasil que Mário de Andrade chegou a dizer que merecia ser “célebre no país inteiro, se nós fossemos verdadeiros patriotas”.
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Mas além das ilustrações trazidas por João Martins de Athayde, os poetas queriam mais inovações – e é aqui que o casamento entre cordel e gravura é celebrado. Começaram a usar esta antiga técnica de impressão principalmente por ser barata e simples: desenha-se uma imagem em madeira macia, como a cajazeira e a imburana, árvores nativas da caatinga nordestina, ou até mesmo em borracha de pneus usados; depois se escavam as partes destinadas a ficarem brancas; joga-se a tinta, que fica depositada nas partes mais salientes da matriz e, ao comprimir a madeira no papel, aparece a imagem, num processo semelhante ao do carimbo. É o mesmo processo usado na Idade Média europeia. Trata-se de uma técnica ancestral que provavelmente se originou na China, no século II a.C. No extremo Oriente, ela era utilizada para a impressão em tecidos, além do papel. Na Europa, foi amplamente empregada para ilustrações e impressão de cartas de baralho, imagens de santos, guerreiros, reis e rainhas, e cenas de calendários.
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A xilogravura ajudava a fazer a “propaganda” dos fatos que interessavam à população. Era tão popular nos século XIV, XV e XVI que passou a ilustrar os romances de cavalaria, e até os autos de Gil Vicente – peças teatrais curtas sobre temas religiosos e cômicos, que também influenciaram Ariano Suassuna noseu Auto da Compadecida.

No Brasil, a xilogravura passou a ser produzida em 1808 pela imprensa, que fazia pequenos anúncios de publicidade em jornais, revistas, e também em ilustração de livros.A técnica propagou-se rapidamente no Nordeste. Quase um século depois, em 1907, apareceu o primeirocordel ilustrado com uma xilogravura: A história de Antônio Silvino,escrito por Francisco das Chagas Batista.
O desenho da capa é baseado no retrato de Antônio Silvino, cognome de Manoel Batista de Morais, nascido em 1875, na cidade de Afogados da Ingazeira, sertão do Pernambuco. Sua história é típica de cangaceiros. Seu pai, em virtude de brigas políticas com o governador de Pernambuco, decidiu formar um bando de homens que espalhava terror pelos sertões do Nordeste.Quando um dos elementos do bando foi preso, Manoel Batista assumiu o comando do cangaço e mudou o seu primeiro nome para Antônio e o segundo para Silvino, em homenagem ao tio, ex-chefe do bando, por quem nutria admiração. Passou a ser conhecido pelo nome de guerra, Antônio Silvino, e pelo apelido de “Rifle de Ouro”. Antes de Lampião, foi o cangaceiro mais famoso e temido do sertão nordestino.

Se a Paraíba é o estado dos pioneiros do cordel, o Ceará é um celeiro de bons xilógrafos, alavancados por José Bernardo da Silva, o maior editor de literatura de cordel durante os anos de 1940 a 1960. José Bernardo chegou a Juazeiro do Norte, no Ceará, na década de 1920, e logo iniciou suas atividades como folheteiro – como eram conhecidos os vendedores de cordel. Em 1932, comprou sua primeira máquina (uma rudimentar impressora de pedal) e fundou a Tipografia Lira Nordestina. Sua atividade editorial alcançaria o apogeu em 1950 por causa da ilustração em xilogravura de muitos folhetos do cordel: Alonso e MarinaJuvenal e o dragãoJoão Grilo e Donzela Teodora, entre muitos outros. Logo, a xilo passou a ser o grande atrativo dos cordéis. Graças ao incentivo de José Bernardo, outros grandes xilógrafos, como Mestre Noza, Antônio Relojoeiro e Expedito Sebastião da Silva, ficaram conhecidos. A tradição da gravura no Ceará se mantém até os nossos dias, com Abrão Batista, ilustrador dos seus próprios cordéis, e com o poeta e xilógrafo José Louzeiro.
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Também representante da nova geração de poetas de cordel e da xilogravura popular, o pernambucano Marcelo Soares alia o desenho da tradição ao design da modernidade. Bebeu nas fontes populares por influência de seu pai, José Soares (1914-1981), um renomado cordelista conhecido como “O poeta repórter”. Marcelo aprendeu a técnica da xilogravura fazendo capas para folhetos e participou de novas experiências com esta técnica no Rio de Janeiro, onde fez curso de xilogravura na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Expandiu suas atividades, criando capas e ilustrações para livros, discos, cartazes para cinema, shows, teatro e outros eventos.

A xilogravura, como imagem ilustrativa de folhetos de cordel, tem traços firmes e identitários da cultura nordestina, e é facilmente vinculada com o público popular. O trabalho em capas de folhetos de cordel mapeia a história da xilografia popular no Brasil. Vai além do universo dos poetas populares e se expande, com seus temas, para os gravuristas urbanos. O percurso da xilogravura no nordeste do Brasil é longo e rico. Sua relação com o folheto de cordel, além de informativa sobre histórias contadas, é a de capturar o olhar do leitor a partir da imagem da capa. Além de contar a história, contribui para gravá-la, mais facilmente, na memória.

Beliza Áurea de Arruda Melloé professora da Universidade Federal da Paraíba e autora de “Poética de um poeta popular: travessia da memória” (Sapienza, Recife, n. 1, 2009).
Do amor à guerra
Os folhetos de cordel são uns pequenos livrinhos em folhas de papel jornal. Podem ter dois tamanhos, dependendo da extensão da narrativa contada. Quando ela é curta, o folheto mede 11 x 36 cm e contém oito páginas; quando a narrativa é mais extensa, ele mede 13 x 18 cm e pode ter até 64 páginas.
Os temas são variados: seca, histórias de encantamentos, cangaço, gracejos, carestia, política, narrativas engraçadas para o povo rir, sátira. As narrativas mais extensas contam histórias de guerra e aventuras de amor, em poesia cantada e impressa. São os chamados romances. Originam-se do Romanceiro, um gênero poético oral de origem medieval, datado de 1421, que sempre narrava sobre algo que havia acontecido numa época concreta.
A memória desses romances vive nos cantos das brincadeiras de roda e nos folhetos de cordel que, quando começaram a circular no Brasil, não tinham nenhuma ilustração em suas capas. Na parte superior havia o título em grande destaque, com letra maior e com adornos; desenho centralizado, contornado com uma frisa tipográfica, uma espécie de pequeno traço colocado em torno do título para dar-lhe maior destaque; na parte inferior há indicação do local, data e nome da tipografia.

SAIBA MAIS
CARVALHO. Gilmar de. Desenho gráfico popular. Catálogo das matrizes xilográficas de Juazeiro. São Paulo: IEB/ USP, 1998.
SANTOS, Idelette Muzart Fonseca dos. “A imagem do folheto”. In: ___. Memórias das vozes: cantoria, romances & cordel. Salvador: Secretaria da Cultura e Turismo. Fundação do Estado da Bahia, 2006. p. 84-92.
SOUZA, Liêdo Maranhão de. O folheto de cordel, sua capa e seus ilustradores. Recife: Massangana, 1981.
Internet
Fundação Casa de Rui Barbosa – Literatura de cordel
http://www.casaruibarbosa.gov.br/interna.php?ID_S=99
Centro Nacional do Folclore – Xiloteca
http://www.cnfcp.gov.br/interna.php?ID_Secao=64

Fonte: Tok de História, de Jostand Medeiros

 

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Se tivesse que escolher
dos verbos o mais profundo
escolheria o SER, embora,
o TER valha o mundo.

Edith Barbosa

terça-feira, 2 de setembro de 2014

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

RELEMBRANDO CELSO DA SILVEIRA


Por Fernando Caldas

Celso da Silveira (1929-2004) era poeta, contista, jornalista, escritor consagrado. A sua memória precisa ser mais reverenciada, homenageada principalmente por nós assuenses. Celso, como tantos outros das letras potiguares não pode ficar "para depois, para mais tarde." Celso divulgou o Assu (sua terra natal) através das letras. Na aterra assuense onde foi vereador na década de cinquenta, fundou o jornal Advertência, juntamente com João Marcolino de Vasconcelos, além do primeiro Museu de Arte Popular no Brasil. Deu a sua colaboração literária em diversos jornais do Assu, bem como é autor de uma obra literária grandiosa que dignifica o Assu e engrandece o Rio Grande do Norte.

Autor de dezenas de livros publicados, em 1952 publicou o seu primeiro livro de versos sob o titulo "26 Poemas de Um Menino Grande", que teve a aprovação do grande poeta potiguar João Lins Caldas, e tornou-se popular no jornalismo. Ganhou prêmio como ator no II Festival Nortista de Teatro Amador, realizado em 1956, no Recife, além de ser cursado como intérprete pela Fundação Brasileira de Teatro. Na cidade de Natal onde morava desde os anos cinquenta, realizou "o primeiro espetáculo a céu aberto de Natal, o auto natalino O Caminho da Cruz além da peça Hoje tem Poesia, ambos de Newton Navarro."

Ainda na cidade de Assu (como não podia ser diferente para um jovem boêmio) fundou O Clube do Copo, que tinha como objetivo realizar serestas, tertúlias dançantes para movimentar a cidade. Afinal, ele imortalizou-se como "O Bocageano Potiguar", pelos versos ("ele conhecia o caminho da poesia fescenina") que produzira ao longo de sua existência prazenteira e feliz. 

Faleceu em Natal onde está sepultado. O seu sepultamento naquela capital potiguar ocorreu como teria pedido aos seus familiares e amigos: "sem choro nem vela, sem discurso nem flores."

E os versos daquele poeta humorista, extraído do seu livro intitulado "Peido, o traque - o valor que o peido tem", editado em 2002 pelo Sebo Vermelho, é gracioso. Vamos conferir:

O peido de um general
não pode ser comparado com
O peido de um soldado
Que em tudo é desigual
Tem gente que peida mal,
Há outros que peidam bem
Eu não conheço ninguém
Que ainda não tenha peidado
Mas o povo não tem dado
o valor que o peido tem.



"Perdi-me no labirinto que há em ti, à procura de ti no labirinto que és tu!
Perdi-me em ti por não te encontrar. E no fim, vivo à procura de mim, para
me reencontrar em ti que és o meu lugar."
________ João Morgado

De: Ponte de Sonhos

domingo, 31 de agosto de 2014


Fernando Caldas compartilhou a foto de Ponte de Sonhos.
9 h · 
"Nos teus dedos nasceram horizontes
e aves verdes vieram desvairadas
beber neles julgando serem fontes."
________ Eugénio de Andrade
em "Poesia e Prosa"

sábado, 30 de agosto de 2014

POETA PAULO VARELA PUBLICA LIVRO DE CONTO

Confesso que quando comprei o Livro 'CANTIGAS DE ESTRADAR' pensei que era mais um trabalho poético do fazedor de versos Paulo Varela. Fiquei impressionado com o enredo que dá sustentação a história (que segundo ele é baseado em fatos reais) e com a forma bem dividida dos capítulos. Outro fator que me chamou a atenção foi o linguajar utilizado pelo poeta matuto. A capital deu ares de sabença ao assuense e ele está dando um "banho de loja" na sua inteligência e está mostrando serviço na área cultural em todo o Rio Grande do Norte. 

Cheguei esta semana na multifeira 'Brasil Mostra Brasil', no Centro de Convenções e me deparei de cara com o poeta em lugar de destaque no salão de entrada do evento lançando seu livro, expondo e vendendo seus cordéis em estande próprio. Deu um orgulho danado vendo o Assu na linha de frente de um evento tão importante para a cultura Potiguar. 
Mas vamos ao que interessa. O livro CANTIGAS DE ESTRADAR tem Paulo Varela como autor, organizador de texto, digitador e desenhista. Possui revisão de Lima Filho, supervisão da impressão e acabamentos de Willames Laurentino e foi impresso pelo Departamento Estadual de Imprensa - DEI.

No prólogo Paulo Varela inicia mandando um abraço cheio de palavras ao "Assu - meu eterno lugar, que há de comer minhas carnes e roer meus ossos, porque não me acho em outro canto...". 

O apresentador da obra, professor literato Edilson Ramos, debulha com muita propriedade a vida do poeta e resume nesta frase: "Um gastador de "trocados" em prol da arte popular", lembrando que antes se refere a Paulo como "poeta popular, contador de causos matutos, cantador, cenógrafo, desenhador de coisas, brincador de bonecos e escrevedor de acontecências sertanejas. Dibuiador de versos, desses de ajuntar gente em mei de feira, fazedor de arte diversas, palestrante de cultura popular". Não esquece de informar que em setembro de 2006, o Ministério da Cultura concedeu a Paulo Varela a comenda de Mestre da Cultura Brasileira e que ele é membro efetivo da Comissão Note-rio-grandense de Folclore, membro da Academia Norte-rio-Grandense de Literatura de Cordel, dentre outros projetos culturais que participa.

O livro CANTIGAS DE ESTRADAR conta a saga de Maria de Jesus - uma jovem, nascida na comunidade rural de Mendobim - Assu-RN, para pagar uma promessa a São Francisco na cidade de Canindé-CE, ao lado de diversos outros conterrâneos da aludida localidade. 

É uma história interessante e que merece o apoio da população assuense. O livro deverá ser lançado em breve na Terra dos Poetas e já se encontra a venda na Casa do Cordel - Cidade Alta - Natal. 

ADQUIRAM!

Parabéns ao amigo Paulo Varela.

(Do blog: Assu na ponta da língua, de Ivan Pinheiro)

sexta-feira, 29 de agosto de 2014


Fernando Caldas compartilhou a foto de Ponte de Sonhos.
1 min · 
"É que tem mais chão nos meus olhos do que cansaço nas minhas pernas,
mais esperança nos meus passos do que tristeza nos meus sonhos,
mais estrada no meu coração do que medo na minha cabeça."
________ Cora Coralina

AS BELAS CAVERNAS DE FELIPE GUERRA E A PASSAGEM DE LAMPIÃO E SEU BANDO


Publicado em 29/08/2014


Entrada da Caverna da Carrapateira, no Lajedo do Rosário, Distrito de Passagem Funda, Felipe Guerra-RN, local de abrigo de pessoas da região quando da passagem de Lampião para atacar Mossoró em 1927 - Foto - Solon R. A. Netto
Entrada da Caverna da Carrapateira, no Lajedo do Rosário, Distrito de Passagem Funda, Felipe Guerra-RN, local de abrigo de pessoas da região quando da passagem de Lampião para atacar Mossoró em 1927 – Foto – Solon R. A. Netto
Autor-Rostand Medeiros 
Poucos conhecem ou já ouviram falar da pequena e pacata cidade de Felipe Guerra, localizada na região do Brejo do Apodi, a 330 quilômetros da capital potiguar. Um lugar muito agradável, de pessoas trabalhadoras, tranquilas e extremamente acolhedoras, mas o que torna Felipe Guerra mais interessante é sua concentração de cavidades naturais, a maior do Rio Grande do Norte. Já foram descobertas mais de 80 cavernas no município, ali foi descoberta uma das maiores cavernas do Nordeste do Brasil, a Caverna do Trapiá, com 2.250 metros de extensão. A maioria das cavernas de Felipe Guerra está localizada no Lajedo do Rosário e os acessos a elas são bem complexos, passando pelas fendas e pelas afiadas rochas calcárias do lajedo.
Em uma das cavernas de Felipe Guerra com equipamento adequado para entrar nestes ambientes - Foto - Solon R. A. Netto
O autor deste texto em uma das cavernas de Felipe Guerra, com os equipamentos adequados para entrar nestes ambientes – Foto – Solon R. A. Netto
Tive o privilégio de participar de varias atividades ligadas ao conhecimento do patrimônio das cavernas potiguares, mas adentrar nas cavernas é um desafio à parte. Em algumas é preciso descer por árvores que brotam de dentro da caverna, se esgueirar por entre pedras e rastejar por alguns bons e dolorosos metros para chegar até as galerias ou salões, que são as partes mais amplas das cavernas e onde são normalmente encontrados os espeleotemas.
Além das cavernas, Felipe Guerra ainda possui uma das maiores cachoeiras do Rio Grande do Norte, a cachoeira do Roncador e lugares de águas cristalinas para banho, como o Olho D’água, localizado em propriedade privada.
Na região rural de Felipe Guerra trabalhei algum tempo em um projeto que envolvia o IBAMA-CECAV/RN e a SEPARN (Sociedade para Pesquisa e Desenvolvimento Ambiental do Rio Grande do Norte) e vi muita coisa bonita.
O bando de Lampião
O bando de Lampião
Mas uma das situações que me impressionava era como os habitantes locais mantêm a lembrança viva das agruras sofridas com a passagem do bando do cangaceiro Lampião, em seu ataque a cidade de Mossoró.
Em uma destas cavidades que alguns habitantes conseguiram um abrigo prático para os terríveis eventos que ocorriam próximos a suas casa e deixou na lembrança das pessoas do lugar um respeito muito grande por estes ambientes. 
Um Lugar Tranqüilo que Perdeu a Paz 
Nas margens do Rio Apodi, na então pequena Pedra de Abelha, a vida seguia tranquila naqueles primeiros dias do mês de maio de 1927. A pequena vila era então um simples aglomerado humano, com pouco menos de 1.200 habitantes, sobrevivendo da cera de carnaúba, da pequena agricultura e da pecuária. Na época dos invernos mais fortes, a pequena vila sofria as enchentes provocadas pelo Rio Apodi, como foi o caso das cheias de 1912, 1917 e a grande cheia de 1924.
Casas antigas de Felipe Guerra
Casas antigas de Felipe Guerra. Foto – Rostand Medeiros
Por esta época, Pedra de Abelha era um ponto de passagem de viajantes, tropas de burros, vendedores, vaqueiros e outros andarilhos que seguiam a estrada entre a pulsante e rica cidade de Mossoró e a progressista Apodi. Havia uma pequena feira que crescia a cada ano, sempre em ordem e em paz, pronunciando uma tendência de progresso para o pequeno lugar. Outra lembrança de boas perspectivas foi à passagem de alguns homens, de língua enrolada, que se diziam engenheiros, faziam medições e coletavam pedras no lajedo do Rosário, na Passagem Funda, um lugarejo a 8 km de Pedra de Abelha. Logo se espalhou a notícia que o lugar seria transformada em uma grande barragem, que haveria muitos empregos, que seria maior que a barragem de Pau dos Ferros e que a vida em Pedra de Abelha iria mudar para melhor. Mais a barragem não veio e a vida seguia tranquila.
No começo de maio chegam as primeiras das mais terríveis notícias que a região oeste do estado do Rio Grande do Norte iria conhecer. No dia 10, pela madrugada, o cangaceiro paraibano Massilon Leite e mais vinte bandidos atacaram Apodi, depois seguiram para Gavião (atual Umarizal) e na sequência, pilharam a pequena vila de Itaú. As notícias comentavam que apenas um cangaceiro fora preso próximo à cidade de Martins. Para a ordeira população de Pedra de Abelha, ficou o pensamento de que, se os cangaceiros haviam atacado Itaú, uma vila praticamente do mesmo tamanho do seu lugar, por que não atacariam o pequeno povoado a beira do Rio Apodi? Passou então a existir no seio da população uma forte intranquilidade.
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Não era para menos que os habitantes da singela Pedra de Abelha ficassem ainda mais apavorados quando, em 10 de junho de 1927, chega a notícia de que, incentivado por Massilon Leite, Lampião cruzou a fronteira da Paraíba e entra no estado Potiguar. Seguindo a cavalo, com cerca de 60 cangaceiros (número que gera muita polêmica até hoje), em direção a Mossoró.
Avançando para o norte, promoveram um verdadeiro bacanal de destruição, rapinagem e terror. Roubaram, tocaram fogo em diversas fazendas, assassinaram os que reagiam, entraram em confronto com a polícia e fizeram alguns prisioneiros, do qual só libertariam mediante resgate.
Com a chegada das notícias cada vez mais assustadoras, a população de Pedra de Abelha tratou de procurar refúgio aonde houvesse condições. Muitos seguiram para a fronteira do Ceará, outros foram para propriedades de parentes mais distantes e outros que conheciam melhor a região, buscaram o abrigo das cavernas. É bem verdade que a população do sertão possui um medo respeitoso em relação às cavernas, mais naquele momento, este medo foi deixado de lado e a escuridão da caverna passou a ser um abrigo mais acolhedor do que a incerteza da luz do dia e a presença de cangaceiros na região. 
O Abrigo 
A caverna da Carrapateira fica localizada no Lajedo do Rosário, próximo ao atual Distrito de Passagem Funda e a pouco mais de mil metros da margem esquerda do Rio Apodi. Entre as várias cavernas deste lajedo, essa é a que apresenta a maior facilidade de penetração. Sua entrada tem formato oval, com quatro metros de altura e possui desenvolvimento horizontal, No seu início encontram-se alguns blocos caídos e deslocados, também presentes localmente no interior da caverna. 
Foto - Solon R. A. Netto
O autor deste texto na Caverna da Carrapateira. Foto – Solon R. A. Netto
Chama a atenção à forma bem como a natureza moldou o túnel principal, sendo muito largo e alto para os padrões das cavernas das proximidades. Sua sinuosidade apresenta contornos de fluxo d’água, marcados nas paredes bastante lisas, lavradas, de rocha calcária limpa e de cor amarelada, com níveis de sedimentação a mostra. Os espeleotemas encontrados são escorrimentos de calcita, cortinas, algumas estalactites e estalagmites. Na parte posterior do corredor principal, aparecem outros tipos de espeleotema muito comum nas cavidades da região; o couve-flor.
Foto - Solon R. A. Netto
Foto – Solon R. A. Netto
Conforme adentramos a caverna da Carrapateira, o chão vai apresentando uma menor continuidade, mostrando reentrâncias, blocos rolados, até desembocar em uma bifurcação, de onde a caverna segue para salões mais apertados, seguindo por condutos menores. Neste setor, tem-se uma clarabóia de poucos metros de altura, aproximadamente três metros. Por ela pode-se sair do interior com facilidade.
Pelas dimensões do seu interior, pela proximidade com o rio e como na região encontram-se diversas provas da passagem de grupos de caçadores e de coletores, entre 5.000 e 2.000 anos atrás, essa caverna é a que melhor poderia sugerir a possibilidade de algum indicio arqueológico. Contudo, não foram vistos pinturas ou evidências nesse sentido e sua litologia é o calcário.
Foto - Solon R. A. Netto
Foto – Solon R. A. Netto
Não foram encontrados vestígios da ocupação dos habitantes de Pedra de Abelha na caverna. Como a passagem de Lampião e seu bando no Rio Grande do Norte duraram apenas quatro dias, acredita-se que a ocupação da caverna tenha sido por curto espaço de tempo. Mesmo tendo sido apenas por quatro dias, a região oeste do Rio Grande do Norte nunca esqueceu este episódio. 
O Avanço dos Cangaceiros 
Neste meio tempo, o bando de Lampião seguia em direção a pequena Pedra de Abelha, passou ao lado da povoação de Gavião (atual Umarizal) e seguiu depredando as propriedades “Campos”, “Arção”, “Xique-Xique” e “Apanha Peixe” e nesta última propriedade, para a sorte dos refugiados escondidos na caverna da Carrapateira e da maioria da população de Pedra de Abelha, o bando foi dividido. As sete da noite, seguiu o cangaceiro Massilon Leite, para assaltar pela segunda vez, a cidade de Apodi, enquanto Lampião seguia para Mossoró. Em Apodi houve resistência da população, obrigando Massilon a fugir. Devido a esta divisão, Lampião seguiu em frente por outra estrada, passando paralelo ao povoado. A população respirou aliviada e Lampião seguiu o seu caminho.
A fazenda da foto chama-se Mato Verde, também atacada por cangaceiros sob o comando de Lampião e próxima a Felipe Guerra. Foto - Solon R. A. Netto
A fazenda da foto chama-se Mato Verde, também atacada por cangaceiros sob o comando de Lampião e próxima a Felipe Guerra. Foto – Solon R. A. Netto 
Caminho que faria seu bando cruzar com o progressista comerciante e fazendeiro Antonio Gurgel do Amaral, proprietário de uma moderna fazenda em Pedra de Abelha, às margens do Rio Apodi, no atual Distrito do Brejo. Nesta propriedade foram empregadas muitas pessoas, o local possui uma estrutura muito moderna para a época, inclusive com eletricidade e mecanização. Antonio Gurgel havia acabado de chegar de uma viagem da Europa, aonde buscava trazer matrizes de novas raças bovinas para desenvolverem-se na região.
Sentado a esquerda vemos o coronel Gurgel
Sentado a esquerda vemos o coronel Gurgel
Assim que soube do avanço dos cangaceiros, seguira para a sua fazenda para organizar sua defesa. No meio do caminho, na localidade chamada Santana, foi preso por membros do bando. Era o dia 12 de junho e somente no dia 25, Gurgel seria libertado no Ceará, juntamente com outra refém. Por ser Gurgel um homem inteligente, de boa conversa, índole calma e que sempre procurou a tranquilidade junto aos bandidos, ele nada sofreu. Durante sua convivência forçada, escreveu um diário que é tido como um dos mais completos documentos sobre a vida e o dia a dia destes cangaceiros. No fim de sua provação Lampião lhe deu duas moedas de ouro para serem presenteadas a sua neta e, como pagamento de uma promessa feita pela sua liberdade, sua mulher construiu uma capela na Fazenda Santana, que continua de pé até hoje, bem como a sede de sua fazenda, na atual Felipe Guerra. 
Mossoró, 13 de junho de 1927, a Derrota de Lampião 
Na Segunda-feira, 13 de junho de 1927, dia de São Francisco, ás 16:30 da tarde, com o céu nublado, os cangaceiros atacaram a maior cidade do interior do Rio Grande do Norte. O seu Prefeito, Rodolfo Fernandes, praticamente sem ajuda do governo do estado, conseguiu reunir desde advogados, dentistas, comerciantes, padres e pessoas comuns, entrincheirando-os em vários locais.
1- Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião
Os cangaceiros foram derrotados depois de uma hora de combate, não mataram ninguém e perderam um cangaceiro na hora e outro, o temível Jararaca, foi ferido e capturado logo depois. Acabou assassinado pela polícia local no dia 20 de junho e o mais interessante foi que seu túmulo tornou-se um local de peregrinação religiosa popular.
Lampião sofreu a sua mais terrível derrota, comentou que “Cidade com mais de quatro torres de igreja não é para cangaceiro”. Sem conhecer o seu tamanho e a sua capacidade de defesa, acabou enganado pela promessa de Massilon de pouca resistência e muito dinheiro.
O seu ataque a Mossoró causou repercussão em todo país, sendo noticiado em muitos jornais, foi um verdadeiro choque, que impulsionou ainda mais a sua fama. Mesmo já sendo bem conhecido e frequentador de jornais cariocas, foi a partir deste episódio que o seu nome ficou muito conhecido no sul do país.
Após a derrota em Mossoró, o bando em Limoeiro do Norte-CE
Após a derrota em Mossoró, o bando em Limoeiro do Norte-CE
Após fugir do Rio Grande do Norte, para onde nunca mais voltou, o bando seguiu para o Ceará, aonde pensavam que estariam protegidos e foram implacavelmente perseguidos. O mesmo ocorreu na Paraíba e em Pernambuco. Em 1928 cruzou o Rio São Francisco e conseguiu uma sobrevida de mais dez anos, praticando atrocidades na Bahia, Alagoas e Sergipe, aonde foi morto, com a sua companheira Maria Bonita, na Grota de Angico.
Aqui vemos o caminho ainda original da passagem dos cangaceiros, no sentido de quem segue para a cidade de Governador Dix Sept Rosado
Aqui vemos o caminho ainda original da passagem dos cangaceiros, no sentido de quem segue para a cidade de Governador Dix Sept Rosado
Para a população de Pedra de Abelha, sempre que as notícias sobre Lampião surgiam, voltava as lembranças dos medos e aflições de junho de 1927. Com a sua morte (1938) e o desbaratamento do cangaço (1941), passa a existir um alívio intenso nesta população. Com o passar dos anos, ocorre o desaparecimento das vítimas sobreviventes dos atos cruéis dos cangaceiros e muitos dos descendentes destas vítimas deixam a região, emigrando para grandes centros. Falar sobre os fatos da época do cangaço deixa de ser um tabu. A partir dos anos 60, o mito deste cangaceiro o torna um dos personagens históricos mais famosos da cultura popular brasileira, aonde muitos lugares do País Lampião é encarado como símbolo de nacionalidade e o cangaço como um expoente de luta da cultura e do povo nordestino.
Para conhecer as cavernas de Felipe Guerra, muitas vezes devido a localização, só acampando para facilitar. Foto - Solon R. A. Netto
Para conhecer as cavernas de Felipe Guerra, muitas vezes devido a localização, só acampando para facilitar. Foto – Solon R. A. Netto
Apesar de possuir potencial turístico, em Felipe Guerra (assim como em todo RN), a exploração das cavernas só é feita de âmbito científico e, assim, não existe estrutura alguma para a prática do chamado espeleoturismo. Quem quiser conhecer essas maravilhas, só participando de algum grupo de espeleologia ou então se aventurando naquelas cavernas de mais fácil acesso. 
Como chegar a Felipe Guerra: A partir de Natal, pegar a BR-304 até Mossoró, seguida da BR-405 e RN-032. Contato: (84) 3329-2211 (Prefeitura de Felipe Guerra)
Bibliografia:
FERNANDES, Raul, A MARCHA DE LAMPIÃO, ASSALTO A MOSSORÓ. 3 ed. Natal, Editora Universitária, 1985.
NONATO, Raimundo, LAMPIÃO EM MOSSORÓ. 5 ed. Mossoró, Coleção Mossoroense, Fundação Vingt-Un-Rosado, 1998.
QUEIROZ, Maria Isaura Pereira, HISTÓRIA DO CANGAÇO, 4 ed. São Paulo, Global Editora, 1991.
CHANDLER, Billy Jaynes, LAMPIÃO, O REI DOS CANGACEIROS, Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra, 1980.
FACÓ Rui, CANGACEIROS E FANÁTICOS, GÊNESE E LUTAS, 7 Ed. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1983.
PERNAMBUCANO DE MELLO, Frederico, QUEM FOI LAMPIÃO, Recife, Editora Stahli, 1993.
DELLA CAVA, Ralph, MILAGRE EM JUAZEIRO, Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra, 1976.


EM DELÍRIO Por que é que nós vivemos tão distantes, Si estamos neste sonho todo incerto: - Eu ao teu lado em pulsações vibrantes, E tu, long...