quinta-feira, 6 de abril de 2017

SE TU VIESSES VER-ME...
(Florbela Espanca)
Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...
Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...
Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
http://madalena-sonetos.blogspot.com.br
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Retrato
Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida a minha face?
Cecília Meireles

17 CURIOSIDADES SOBRE A VIDA BOÊMIA DE NATAL NO INÍCIO DOS ANOS 40

Por volta de 1939, bem no início da II Guerra Mundial
(aquela que já falei bastante aqui no blog), a vida noturna dos moradores de Natal era cheia de costumes e situações que a maioria das pessoas desconhece.

A boemia da cidade se iniciava depois das 9 horas da noite

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Ruas do bairro da Ribeira nos anos 40
Quando as famílias já tinham se recolhido.

Os cabarés mais famosos de Natal situavam-se na Ribeira

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Marinheiros americanos se divertindo em cabaré de Natal nos anos 40
Eles eram bastante freqüentados e populares. Eram como partes integrantes da vida boêmia da cidade.

Na vida noturna provinciana encontravam-se as prostitutas, os cáftens e os gigolôs

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Maria de Oliveira Barros (“Maria Boa”) na época proprietária do maior cabaré da cidade
Eles também serviam de inspiração aos poetas e escritores.

Na época a cerveja era vendida ao preço de mil e quinhentos réis

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Cédula, moedas e cervejas reais da época
E ela [a cerveja] era uma das bebidas mais consumidas pelos pândegos da boemia.

As mulheres “da noite” pediam Martini aos acompanhantes

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Marinheiros americanos em Natal em um cabaré dos anos 40
E este era servido ao preço de cinco mil réis a dose.

A popularização consumidora de uísque só chegou bem depois

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Militares americanos bebendo em um bar da cidade de Natal durante a 2ª Guerra Mundial
Mais precisamente com a chegada dos americanos a Natal.

Nos cabarés, às vezes, aconteciam brigas e pancadarias pelas madrugadas

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Elas aconteciam entre os freqüentadores dos cabarés, sendo necessária a presença da polícia pra acalmar os mais exaltados.

Normalmente, dentro das pensões alegres existia uma figura exótica

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Uma pessoa alegre, com requebros e trejeitos femininos, cabelos oxigenados, muito conhecida pelos frequentadores. Na época havia inclusive uma que era conhecida como “Afago Verde”.

Naquele tempo as parteiras eram responsáveis por grande parte das vidas que surgiam.

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O parto era feito em casa, com o resguardo de vários dias e muita canja de galinha. Em partos mais difíceis, surgia o médico, com a sua inseparável valise e o estetoscópio.

As pensões eram sempre alegres

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Foto da janela de um hotel em Natal na época
E eram freqüentadas por pessoas de diferentes níveis sociais.

À noite, já com o dólar correndo solto, surgiram os vendedores clandestinos

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Vendiam perfumes, isqueiros, sabonetes, whiskys, cigarros, etc.

As músicas mais tocadas nas radiolas de ficha eram os tangos e maxixes

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Que aos poucos foram sendo substituídos por swings, blues e fox trotes. Isso já na década de 1940.

Naqueles anos, apareceu na zona uma novata

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Uma morena, de olhos e cabelos negros, que circulou por várias casas noturnas e despertou a paixão de muitos freqüentadores. Os seus pretendentes eram selecionados pela disposição de abrir a carteira. Contam que ela terminou os seus dias abandonada e esquecida no Beco da Quarentena, tomando injeções diárias de “914”, aplicadas por um enfermeiro da Saúde Pública aos portadores de sífilis. A profilaxia era uma lavagem à base de permanganato.

As notícias da guerra via “BBC Londrina”

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E retransmitidas pela “Agência Pernambucana” antes da inauguração da REN – Rádio Educadora de Natal. Elas eram geralmente acompanhadas pela “Canção do Expedicionário”, que traduzia a saudade da pátria e a esperança de vitória dos Pracinhas Brasileiros, na Itália. Por ali se tinha notícias dos últimos acontecimentos da II Guerra Mundial na Europa.

Artistas encantavam os telespectadores no primeiro cinema que existiu na cidade

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O Cine Polytheama
No Cine Polytheama, na Praça Augusto Severo, Ingrid Bergman, Diana Durbin, Judy Erland e outros artistas encantavam os telespectadores.

O movimento no Porto da cidade era intenso e guarnecido pelos fuzileiros navais

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Porto de Natal em 1940
Estes sob o tema “Adsumus”, que significa “aqui estamos”, eram admirados e respeitados pela população, em virtude do exemplo de dedicação e profissionalismo em defesa da pátria.

As notícias da noite corriam velozes, de boca em boca, e terminavam no bar

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Bar O Grande Ponto em 1930
Os bar era o “Grande Ponto” (ou o Bar Cova da Onça), na Av. Tavares de Lira, onde o garçom, conhecido como “Cara larga”, atendia os clientes na parte de trás do estabelecimento.
Que bela viagem no tempo, ein? Isso me lembrou até aquele documentário incrível sobre a 2ª Guerra em Natal-RN
Fonte: Elísio Augusto de Medeiros e Silva e Manoel de Oliveira Cavalcanti Neto.
De: https://curiozzzo.com

quarta-feira, 5 de abril de 2017

João Celso Filho. Um poeta do Assu que engrandece as letras potiguares.
Na boca de uma mãe anda uma prece
Que as horas da noite andam murmurando...
- Meu filho, ninguém te esquece...
Esquece, mãe, também se vai cantando.
Mas para salvar teu coração criança,
Teu doce coração de ingenuidade...
Mãe, que saudade!...
Acalenta e vai dizendo essa esperança.

[Fica no mundo ainda maldade
Para matar essa esperança].
Mas, é verdade, isso tudo é verdade

(João Lins Caldas, poeta potiguar)

terça-feira, 4 de abril de 2017

1943 – UM DIA DIFERENTE EM PONTA NEGRA


 https://tokdehistoria.com.br

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Grupo de militares americanos se divertindo na Praia de Ponta Negra, perto de Natal, durante a Segunda Guerra Mundial. Mas nem todos os dias foram assim tranquilos nesta bela paisagem – Fonte – http://www.gettyimages.com.br/

MEMÓRIAS DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL EM NATAL 
Rostand Medeiros – Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte
Todos nós sabemos que diante da relevância da história da participação brasileira na Segunda Guerra Mundial, são bastante escassos os trabalhos ligados as memórias dos brasileiros que estiveram no front europeu.

Se a situação dos trabalhos de história ligados as pessoas que cruzaram o oceano para lutar na Itália é no mínimo limitada, mais difícil são os depoimentos daqueles que estiveram patrulhando as nossas praias, aguardando a chegada de um inimigo que poderia desembarcar a qualquer momento.

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Esses eram os inimigos – Submarino alemão U-848 atacado em 5 de novembro de 1943. Foto obtida a partir do avião do tenente Charles A. Baldwin, da reserva da marinha americana, esquadrão VB-107.
Defendendo o Nosso Litora
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Quatro meses antes do dia 22 de agosto de 1942, dia oficial da declaração de guerra do Brasil contra a Alemanha e a Itália, o então ministro da guerra, general Zenóbio da Costa cria o chamado “Plano de Defesa do Exército do Nordeste”. Em suas linhas estão as ordens para milhares de soldados brasileiros designados para esta missão. Eles deveriam exercer forte vigilância sobre o litoral e este trabalho cabia aos homens ligados a 7ª Região Militar, então um órgão de comando regional (atualmente extinto) do Exército Brasileiro, com sede em Recife. A Força Aérea Brasileira e a Marinha do Brasil também participavam destes esforços de defesa, mas de outras maneiras.

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Militares brasileiros em serviço de vigilância em uma praia potiguar. O primeiro a direita, de pé, é o sargento de infantaria Tertuliano de Souza Rêgo, de São Miguel, Rio Grande do Norte – Fonte – Livro “João Rufino, um visionário de fé”, de Rostand Medeiros, 2010, pág. 80.
Unidades do exército foram deslocadas para as praias nordestinas. Homens de várias partes do país ocupam o litoral, em uma forma de defesa um tanto questionável no sentido bélico. Na verdade eram mais observadores de ocorrências anômalas nas nossas praias, que propriamente uma força de combate capaz de deter uma possível invasão.

Mas eram importantes em sua função e esta atividade tinha seu valor.
Acredito que as altas patentes militares brasileiras apontavam para outros objetivos. Como o de evitar o desembarque de espiões através de submarinos e a própria questão do contexto psicológico de transmitir a população destas regiões costeiras que as nossas forças estavam presentes nas nossas praias, participando da nossa defesa.

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Soldado brasileiro observando o litoral do Nordeste em busca de submarinos nazistas, mas em uma condição de trabalho muito limitada – Fonte – Coleção do autor.
Fosse ou não por estas razões, o certo é que a vida destes soldados do nosso exército em patrulhas litorâneas não era nada fácil.

Além de terem de aguentar as provocações daqueles que diziam que eles estavam na praia “tomando sol”, havia a precariedade de alojamentos, da alimentação, a incerteza da aparição do inimigo, a monotonia das praias desertas, o desgaste provocado principalmente pelo valoroso sol nordestino, pelo sal, pela areia, vento, da chuva que de vez em quando caía e a saudade de casa, principalmente para aqueles que tinham vindo de longe.

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Soldados brasileiros
Realmente a situação era monótona. Mas nem sempre!

A Triste Chegada de um Estrangeiro na Praia de Ponta Negra

Anos atrás, quando nem sonhava escrever livros sobre história, conheci o Senhor Clóvis Ramalho Ribeiro Dantas, pai de nossa grande amiga, a economista Vivianne Fernandes Ribeiro Dantas, esta uma competente funcionária do Tribunal Regional do Trabalho de Natal.

Seu Clóvis, como eu o chamava, era aposentado do antigo BANDERN, homem sério, trabalhador, maçom, calmo e que gostava de contar histórias da época da Segunda Guerra. Falava sempre de seus sofrimentos como um dos “praianos”, como eram chamados estes combatentes litorâneos. Narrava sobre as patrulhas, da falta do que fazer do desgaste de ficar olhando o dia todo o mar, das patrulhas noturnas vendo e do dia a dia desta função.

Mas um dia algo surgiu no horizonte e tudo foi diferente e movimentado.

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Praia de Ponta Negra na década de 1930, em fotografia de Jaeci Emereciano Galvão.
Seu Clóvis narrou que era no “começo do ano de 43, em janeiro”, ele estava de patrulha na região de Ponta Negra, na área próxima a atual Via Costeira, região bem deserta do nosso litoral naquela época, mas que atualmente concentra suntuosos hotéis que recebem milhares de turistas que visitam Natal.

Segundo ele foi um amigo seu, também militar, que foi o primeiro a avistar o pequeno barco. Para esta pessoa, o que chamou a sua atenção para o mar foi vários pássaros volteando sobre um ponto e depois ele percebeu a pequena embarcação.

Logo alguém, ou a própria maré, trouxe o barco para terra e vários patrulheiros brasileiros foram olhar. Seu Clóvis estava entre eles.

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Típica balsa de salvamento marítimo, utilizada em aviões norte-americanos durante a Segunda Guerra Mundial. Elas eram pintadas de amarelo para melhor visualização – Fonte – NARA.
O que chamou atenção dele, ainda quando estava caminhando a certa distância da balsa, foi o cheiro de carne podre. Dentro do barco salva-vidas estava a razão; havia um corpo humano em estado de putrefação. Era um homem, militar norte americano, com roupas e divisas de um oficial do exército daquele país. O corpo estava bem desidratado, muito queimado, com várias feridas na pele provocadas pelo sol e pelos pássaros, a cabeça pendendo na beira da balsa e, o que mais chamou a atenção de Seu Clóvis, os lábios do falecido se abrindo de forma grotesca e mostrando a arcada dentária, devido à ação do sol.

Na época ele me contou que se aguentou como pode, mas muitos colegas desandaram a vomitar diante do quadro. Outros fizeram o sinal da cruz e rezaram pela alma do morto.
Era a guerra que, mesmo sem chegar diretamente a Natal, mandava um recado dizendo que existia. 

Sinais de uma Tragédia no Atlântico

Outra coisa que chamou atenção do jovem soldado brasileiro era uma pequena bolsa que o americano trazia amarrada si. Um sargento abriu para verificar o conteúdo e encontrou, segundo Seu Clóvis, várias “plaquinhas, daquelas que tinham nomes”. 

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Ele estava falando das famosas placas de identificação, existente em vários exércitos envolvidos durante a Segunda Guerra Mundial. Utilizadas primariamente na identificação do seu portador em caso de morte ou ferimento, as plaquinhas serviam também como fonte de informações médicas para tratamento, sempre trazendo o tipo sanguíneo e outros dados. Os norte americanos chamavam este material de “Dog Tag”, por causa de sua semelhança com as placas colocadas em coleiras, utilizadas para identificar cachorros.

Logo chegaram à praia muitos militares americanos. Eram oficiais e praças, que reviraram o corpo, revistaram o que havia, fotografaram tudo, tomaram notas, buscaram informações junto aos patrulheiros através de intérpretes. Tudo sem muita conversa, sem choro, calados e reservados. Em pouco tempo os militares estadunidenses pegaram o cadáver, a bolsa com as plaquinhas, a balsa, colocaram em um veículo e foram embora.

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Treinamento de militares americanos em uma balsa salva-vidas.
O natalense Clóvis Ramalho Ribeiro Dantas nunca mais esqueceu este dia, nem este fato. Mas até a sua morte, ocorrida em 2008, nunca soube quem era o americano na balsa. Achava que o ocupante do barquinho fora vítima de algum submarino, que afundou um navio e jamais soube seu nome.
Vida que segue.

Foi Notícia até na Austrália

Eu nunca mais esqueci a história que Seu Clóvis me contou, até pela riqueza de detalhes e a forma eloquente como ele narrava este episódio. Mas ao mesmo tempo, devido à falta de informações transmitidas aos brasileiros sobre o corpo na balsa, poucos eram os detalhes sobre o caso.

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Nota sobre o evento de Ponta Negra em jornal australiano
Recentemente me lembrei da história de Seu Clóvis e como hoje temos esta inigualável ferramenta (tanto para o bem, como para o mau) que se chama internet, me veio a mente procurar manter contatos com pessoas pelo mundo afora, buscando alguma informação sobre este episódio. Em um fórum sobre aviação, deixei informações e, para minha sorte e surpresa, através do Sr. Henry F. Mann, de Sidney, na Austrália, me mandou uma prestativa mensagem onde remetia as fotos de duas páginas de antigos jornais do seu país. Os periódicos eram de janeiro de 1943 e havia uma interessante história sobre um acidente de aviação no meio do Oceano Atlântico.

Em uma nota do jornal australiano “The Mail”, da cidade de Adelaide, edição de 20 de fevereiro de 1943, na primeira página, informa que um pequeno bote salva-vidas de borracha, levando o corpo do major Arthur Mills, membro do “Army Air Corps Ferry Command”, derivou até uma praia perto de Natal, Brasil.

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Avião de transporte americano sendo abastecido
Segundo o correspondente da United Press lotado na capital potiguar, a nota acrescentava que no barco não havia nem comida e nem água, e que a balsa provavelmente tinha seguido a deriva por mais de 1.000 milhas, atravessando o Atlântico Sul.

Apontava a nota que o major Mills lutou para sobreviver, pois no pequeno barco havia ossos de peixes e que um daqueles tradicionais emblemas com uma águia (que os americanos colocavam nos quepes de oficiais durante a Segunda Guerra) foi transformado em um anzol improvisado.

Mais significativo era o fato de ter sido encontrado juto com o corpo, seis placas “Dog tag”, indicando que outros seis aviadores tinham falecido, provavelmente na balsa, em meio uma tremenda agonia de sede e fome. Os nomes dessas seis vítimas não foram divulgados.

Era uma história muito parecida a que me foi contada por Seu Clóvis.
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Já o periódico “The Sydney Morning Herald”, edição do dia 24 de janeiro de 1943, na oitava página, encontramos a notícia que segue. Dois membros da (R.A.A.F.) Royal Australian Air Force – Real Força Aérea Australiana, o piloto W. T. B. Smithson e o sargento H. V. Lamb, além de treze britânicos e doze americanos estavam desaparecidos em decorrência da perda de um avião de transportes americano no Atlântico Sul. A nota ainda informava que o corpo do Major Arthur Mills, havia sido levado em uma balsa salva-vidas para o litoral brasileiro.

A nota encerrava informando que alguns  bens pessoais de outros aviadores foram encontrados na balsa.

Um Velho Livro Ajuda a Entender Este Episódio

Então me lembrei que em Recife, um amigo possui um exemplar do livro “The eagle in the egg” e poderia ter alguma coisa sobre este caso.

Escrito em 1949 pelo tenente coronel Oliver La Farge, e publicado pela Hougton Biffin Company,, de Boston, este material com 319 páginas trás com detalhes a história do ATC – Air Transport Command (Comando de Transporte Aéreo), que foi o órgão que desenvolveu a rede de aviões, aeroportos, campos de pouso e toda estrutura do transporte aéreo americano na Segunda Guerra Mundial.

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C-87
A meu pedido ele fez uma busca e encontrou na página 194, que pouco antes da meia-noite de 17 de janeiro de 1943, um avião de transporte modelo Consolidated C-87 “Liberator Express”, número de registro 41-1708, decolou da cidade africana de Acra, na antiga Costa do Ouro, atual Gana, em direção a Natal. O seu piloto era o capitão Captain Orval Eknes Mijkpen e ele transportava basicamente passageiros. 
Consta no livro que devido a um bom e forte vento de cauda, o capitão Elwes planejava fazer a viagem sem escalas, apenas sobrevoando a ilha de Ascenção, uma rocha vulcânica no meio do Oceano Atlântico, pertencente à Inglaterra e igualmente uma importante base aérea de apoio.
Mas este avião simplesmente desapareceu.

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A base de Acra durante a Segunda Guerra Mundial.
Ao meio dia de 18 de janeiro, foram iniciadas as buscas da aeronave ao longo do percurso que, embora prejudicada por más condições meteorológicas, continuou até 30 de janeiro de 1943, tanto pelo ar, como por militares buscando nas praias brasileiras sinais trazidos do mar.

No dia 31 as buscas foram oficialmente encerradas e nenhum destroço foi encontrado.

Em 5 de fevereiro, uma sexta-feira, dezenove dias depois do C-87 41-1708 haver decolado na noite de Acra, os soldados brasileiros em Ponta Negra, entre eles Clóvis Ramalho Ribeiro Dantas, avistaram um bote salva-vidas onde estava o corpo desidratado do Major Arthur Mills.

Consta em “The eagle in the egg”, que os homens que padeceram sobre as águas do Atlântico, mesmo estando com uma caderneta, não deixaram registros ou documentos para elucidar o mistério do desaparecimento do C-87.

O Interessante foi que o autor confirmou a nota do jornal australiano, de que havia ossos e um distintivo de quepe de coronel, transformado em anzol.

Para o tenente Coronel La Farge, era evidente que o avião havia pousado com sucesso na água e que os homens a bordo  (ou parte deles) deveriam ter conseguido evacuar com sucesso da aeronave sinistrada, mas em grande pressa, pois aparentemente não traziam todos os seus equipamentos de sobrevivência na balsa. 

As Investigações

O inquérito que se seguiu apontou que o capitão Elwes era um dos melhores pilotos a voar sobre a África, que ele não estava cansado, não tinha bebido na noite anterior a partida de Acra. Os registros apontam que o comportamento de toda a tripulação antes do voo foi sem alterações. Ocorreu a habitual inspeção antes da decolagem e os motores estavam em ótimo estado.

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Embarque de militares em um avião C-54 do ATC – Air Transport Command (Comando de Transporte Aéreo) em Acra.
O livro afirma que o avião era relativamente novo em serviço, sem ter voado de forma excessiva. Além do mais não houve incidente incomum e nem mensagem alguma foi recebida do avião depois que seguiu viagem.
Para o autor do livro, tenente Coronel La Farge, a provável explicação deste acidente foi que poderia ter ocorrido algum problema com o combustível a bordo ou, o C-87 poderia ter sido derrubado por um submarino alemão, onde mesmo avariado ainda teve condições de pousar.

São apenas teorias. A verdade sobre o que realmente aconteceu ao C-87 “Liberator Express” provavelmente nunca será conhecida.

Uma Estranha e Interessante História

O Major Arthur Mills era um ex-piloto de transporte do correio aéreo nos Estados Unidos, era natural da cidade de Muscatine, estado de Iowa.

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Sargento Ross Ballard Moore Jr.
Entre os ocupantes da aeronave havia o sargento Ross Ballard Moore Jr., do Texas. Ele se graduou em 1940, depois ingressou no Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos e morreu neste acidente. Foi o único tripulante ao qual consegui uma fotografia e existe uma estranha história envolvendo este militar.

No site http://www.findagrave.com/cgi-bin/fg.cgi?page=gr&GRid=42650429, em meio a uma série de informações equivocadas em relação a este acidente, uma parente sua informa que na noite de 15 de janeiro de 1943, a irmã mais velha de Ballard, chamada Dorothy Lee, acordou vendo o rapaz ao pé de sua cama. 

Ela ficou surpresa e se assustou, pois sabia que o mesmo se encontrava na América do Sul. Pior foi que ela ouviu aquela figura dizer claramente que “-Você vai ter que cuidar da mãe agora, eu não vou ser capaz.” 

Consta que ela começou a perguntar o que ele estava falando e ele se foi. Segundo a informação encontrada neste site, a família só soube do acidente dois dias depois.

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