O Congresso acelera para reencontrar os brasileiros
Os senadores e deputados federais que mais trabalharam em 2013 por um país moderno e competitivo
Fabiano Santos
Pelo terceiro ano consecutivo, VEJA publica o que chama de "ranking do progresso", a partir do posicionamento de deputados federais e senadores em relação a propostas de ajuste na legislação brasileira capazes de contribuir para a consolidação de um país mais moderno e competitivo, segundo os critérios da revista e da Editora Abril. A iniciativa, pioneira no Brasil, leva em conta nove eixos considerados fundamentais para que se alcance tal objetivo - da diminuição da carga tributária ao aprimoramento das relações entre empregadores e empregados.
Em parceria com o Núcleo de Estudos sobre o Congresso (Necon), do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj), VEJA se debruçou sobre 243 proposições de maior relevância entre as centenas de projetos de lei, medidas provisórias e propostas de emenda à Constituição que tramitaram na Câmara e no Senado em 2013. Classificou, então, aquelas que se enquadravam, favorável ou desfavoravelmente, nos nove temas predeterminados. Sobre essa lista, o Necon trabalhou com uma metodologia que desenvolveu levando em conta todas as etapas e caminhos de uma proposição, de sua gênese aos trabalhos dentro das comissões, até o voto final, com peso específico para cada uma das fases.
Antes, porém, da entrada em cena do Necon, a revista aplicou uma "cláusula de ética" na relação dos parlamentares responsáveis pelas proposições, expurgando aqueles envolvidos em escândalos ou de reputação duvidosa. Para tanto, VEJA se valeu de critérios próprios e de levantamentos da Transparência Brasil, organização independente e autônoma comprometida com o combate à corrupção. O resultado foi submetido à minuciosa análise do advogado Alexandre Fidalgo, do escritório EGSF, que se aprofundou na situação de deputados e senadores tendo em vista a Lei da Ficha Limpa, que passou a vigorar, em eleições, a partir de 2012, controlando o acesso ao Congresso de políticos desonestos.
Ao final desse trabalho, VEJA chegou ao ranking dos melhores desempenhos de 2013, encabeçado no Senado por Armando Monteiro (PTB-PE) e na Câmara dos Deputados por Onofre Santo Agostini (PSD-SC).
O que mais chama atenção quando se analisa a base a partir da qual todo o ranking foi montado é o extraordinário crescimento no número de matérias votadas pelo Congresso Nacional neste ano - ainda que 2012 tenha sido marcado por eleições, circunstância que provoca, naturalmente, uma queda na produção legislativa. O que teria ocorrido em 2013 para impulsionar de forma tão surpreendente a atividade de deputados e senadores? A resposta é simples: as manifestações de junho.
É verdade que o ritmo do Congresso já havia registrado um considerável aumento nos primeiros meses de 2013, se levarmos em conta o mesmo período de 2012. No entanto, tal desempenho não pode nem de longe ser comparado ao que ocorreu no trimestre maio-julho, que contemplou o mês em que setores importantes do Brasil foram às ruas. Armados com reivindicações como transporte público mais barato, fim da corrupção e hospitais "padrão Fifa" - a realização da Copa das Confederações proporcionou pretextos e palcos de enorme visibilidade para os protestos -, os manifestantes pressionaram os parlamentares em busca de soluções para problemas de transparência. Intimidados, os políticos correram para votar projetos que atendiam a alguns dos mais urgentes clamores da população. Não por acaso, 43% das votações nominais da Câmara e 46% do Senado, realizadas até outubro, ocorreram entre maio e julho.
Qual o perfil dos congressistas que acabaram recebendo uma melhor pontuação no ranking de 2013? Trata-se de um grupo de parlamentares que exibem em seu currículo uma vasta experiência política, dentro e fora do Legislativo. É comum ouvirmos o comentário de que a política brasileira é mal estruturada e que no Congresso se juntam aventureiros preocupados em defender apenas os próprios interesses. Muito distante dessa visão é a realidade que emerge dos dados sobre os quais nos detemos. Os parlamentares, à margem do toma lá dá cá, revelaram neste ano um forte empenho em torno de causas cruciais para o desenvolvimento econômico do país, numa atuação tanto mais eficaz quanto maior a experiência em termos de mandatos cumpridos.
Por último, mas não menos importante, registrem-se algumas observações sobre o conjunto dos rankings.
No primeiro, referente ao ano legislativo de 2011, concluiu-se que existia oposição de qualidade na política brasileira. Já em 2012, conforme observamos antes, a produção legislativa se mostrou reduzida. Congressistas dotados de potencial para se destacarem como defensores de propostas destinadas a impulsionar o Brasil gastaram boa parte de seu tempo envolvidos nas disputas em sua cidade de origem. Mais do que isso, em um ano voltado para o julgamento do mensalão, a oposição acabou mais focada nessa questão - e menos na definição de políticas públicas de efeito direto para os seus eleitores.
Em alguma medida, o ranking atual combina com os que o antecederam.
Discutem-se, como já ocorre há alguns anos, as reais possibilidades de a oposição fazer aquilo que lhe cabe, oposição. Há imensas dúvidas a ser entendidas. Dá-se essa interrogação por força do papel desempenhado pelo Partido Social Democrático (PSD), criado em 2011 no esteio da liderança do então prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Quatro deputados federais das dez primeiras colocações - incluindo o "campeão" - foram eleitos pelo Democratas, oposicionista, e depois migraram para o PSD. Mas Kassab, como é sabido, já declarou apoio à reeleição de Dilma Rousseff. No Senado Federal, o PTB aparece com destaque - o primeiro lugar pertence à agremiação; o predomínio é do PMDB e do próprio PT.
Já no que se refere à atuação dos parlamentares, em 2013 houve, tal como foi dito anteriormente, uma atenção maior às reivindicações populares - pelo menos, no calor da hora do barulho das ruas.
Assim, se por um lado tivemos em 2013 uma admirável dinâmica de interação entre as dimensões representativa e participativa da democracia, por outro, não se sabe ao certo se isso trará aperfeiçoamentos na legislação brasileira em prol de um país mais competitivo.
Fabiano Santos é cientista político, professor e pesquisador do Iesp-Uerj e coordenador do Necon
O primeiro entre os senadores
Armando Monteiro (PTB-PE)
“Um grande desafio é mudar o ICMS.
Ninguém ganha mais com essa guerra fiscal”
Cristiano Mariz
EMPREGO - Para Monteiro, o mundo globalizado exige uma legislação trabalhista com maior flexibilidade
O Congresso deve tomar mais iniciativas para diminuir a carga tributária?
Nosso sistema tributário é anacrônico e disfuncional. Nós fazemos o absurdo de tributar investimentos, exportações. Uma reforma tributária ampla seria o ideal, mas infelizmente há muita disputa entre os entes federativos. A saída é promover mudanças pontuais. Tenho atuado para fazer a reforma e a diminuição dessas alíquotas interestaduais. É o primeiro passo para dar fim à guerra fiscal, que, hoje, é caótica.
Por que o Congresso enfrenta tanta dificuldade para fazer a reforma tributária?
Alguns estados não querem. O Nordeste não quer abrir mão do instrumento de redução de alíquotas. Há um ambiente na federação em que você perde uma visão de país. As empresas acabam se submetendo a situações díspares por causa das diferenças de tributação dos estados. Um dos nossos grandes desafios é começar a reforma do ICMS. Ninguém ganha mais com essa guerra fiscal. Precisamos criar as bases para ter um sistema tributário de classe mundial.
Como melhorar a gestão pública?
Precisamos dar um freio nos gastos de custeio. Impedir que o porcentual de crescimento se dê acima do porcentual de aumento do PIB. Se fizermos isso, poderemos em dez anos chegar a uma situação bem melhor do que agora. Desse jeito, poderemos ter recursos para investir em obras de infraestrutura. Mas isso tem de partir de uma vontade ampla da sociedade, passar pelo Executivo e pelo Congresso, claro. A eleição é um bom momento para esse debate.
Como tornar mais justa a relação entre empregadores e empregados?
É muito difícil tratar disso do ponto de vista político. Mas é fato que, no mundo inteiro, a legislação tem sido menos rígida, permitindo mais acordos diretos entre os empresários e os trabalhadores. Num mundo globalizado, é preciso ter uma legislação mais flexível, pois isso significa ter uma legislação pró-emprego.
Adriano Ceolin
O primeiro entre os deputados
Onofre Santo Agostini (PSD-SC)
“A Câmara é um cartório homologatório
do Executivo. A culpa é do Parlamento”
Cristiano Mariz
CONSCIÊNCIA - Santo Agostini é da base aliada do governo, mas frisa que vota de acordo com as próprias convicções
O Congresso pode ajudar o Brasil a ser mais competitivo?
Nós precisamos votar mais leis que diminuam a carga tributária. É necessário acabar com distorções, exageros. É fundamental fazer um trabalho de convencimento do governo e de toda a sociedade sobre a importância disso. Infelizmente há resistências.
O senhor está exercendo seu primeiro mandato...
Como deputado federal, sim. E já estou pensando em parar por aqui. Estou decepcionado. É muita conversa, muito faz de conta e quase nada anda. Eu sou diligente. Cobro meus projetos. Falo com o relator, com o presidente da comissão. E, ainda assim, é difícil.
Por quê?
Não funciona. As comissões são muito subordinadas ao governo. Eu sou da base aliada, mas voto de acordo com as minhas convicções. Voto com o governo quando as coisas são boas. Quando não são, eu não voto.
Mas por que existe essa lentidão no Congresso?
Não quero culpar só o governo. É culpa do Congresso, que se sujeita a aceitar as medidas provisórias que o governo edita. Elas deveriam ser usadas somente em casos emergenciais, mas, na prática, não é isso que ocorre. O Executivo só governa por meio de MPs. Infelizmente a Câmara dos Deputados é um cartório homologatório do Executivo. E isso é culpa do próprio Parlamento, que não se impõe.
Quais os projetos que o senhor apresentou que considera mais importantes?
Pedi o fim da cobrança de IPI para pessoas com necessidades especiais e para os aposentados. Mas eles não andam. O governo não deixa. Não quer perder arrecadação. Ao mesmo tempo, o governo não gasta onde tem de gastar. Na saúde, por exemplo, não aplica o porcentual exigido por lei. O plano do SUS é um dos melhores do mundo, mas não tem receita. Se o governo federal aplicasse o que estados e municípios aplicam, nós teríamos a melhor saúde do mundo. Sem dúvida.
Adriano Ceolin
Fonte: Veja