quinta-feira, 6 de agosto de 2015

ACADEMIA ASSUENSE DE LETRAS:

DISCURSO DE FERNANDO ANTONIO DE SÁ LEITÃO MORAIS NA SESSÃO SOLENE DE INSTALAÇÃO E POSSE

PATRONA: Sílvia Filgueira de Sá Leitão

A assuense Sílvia Filgueira de Sá Leitão é filha de Luís Correia de Sá Leitão e Maria Carolina Soares Filgueira Caldas. Nasceu em 17 de outubro de 1910, na Rua Frei Miguelinho, nº 137, sendo a quarta filha dentre 11 irmãos. Seus genitores, provenientes de famílias tradicionais, pertenciam ao grupo social que, juntamente a outras famílias, liderava movimentos culturais e intelectuais na velha Assú do início do século 20 – a Atenas Norte-rio-grandense.

No seio familiar, os pais zelavam pela sua formação e das demais filhas (Dulce, Corina, Carmen, Letícia, Maria Helena e Consuelo), educadas sob os auspícios dos princípios católicos, do trato social, das prendas domésticas e estímulo às artes.

Não se uniu em matrimônio. Entretanto, as funções do lar e de educadora, assim como as responsabilidades pela formação de outros sujeitos, não deixaram de ser desempenhadas, à medida que se tornou professora primária, educando meninos, meninas, moças e rapazes, e assumindo os cuidados com a sobrinha Maria da Anunciação, órfã materna aos dois anos.

Silvia, ou Silvinha como era conhecida por muitos, estudou no Grupo Escolar Tenente Coronel José Correia, em Assú, tendo acesso ao curso primário completo, isto é, às Escolas Infantil, Elementar e Complementar. Considerada aluna aplicada, se destacava pelas notas alcançadas que lhe rendiam elogios públicos. No jornal A Cidade (1925, p.6), a publicação dos resultados dos exames dos alunos do Grupo Escolar apresentava Silvia como a aluna do primeiro ano do Curso Complementar Misto que obteve os melhores resultados de aprendizagem, aprovada com distinção e média 9,66.

Na condição de aluna do Curso Complementar Primário, em 1925 e 1926 Silvia participou do Grêmio Complementarista do Grupo Escolar, fundado pelo professor Alfredo Simonetti. Em 23 de fevereiro de 1939, um mês após a morte do professor, Silvia, três de suas irmãs e outras colegas organizaram a Polianteia, um impresso em homenagem à memória de Alfredo Simonetti. O significado das ações empreendidas por este mestre é destaque no artigo por elas escrito “Descansa em paz”. Neste período contribuiu com outros escritos para o Grêmio Complementarista. Leitora contumaz, dentre seus autores diletos, estão os poetas Olavo Bilac, Manuel Bandeira, Gonçalves Dias, Cassimiro de Abreu e Cecília Meireles. Era amante da Lapinha – encenação natalina trazida para Assú pelo seu avô Joaquim de Sá Leitão em 1898, defendendo o cordão encarnado.

O envolvimento de Silvia com as letras avança no tempo e na qualidade, ganhando notoriedade, especialmente através de seus famosos cadernos manuscritos, aos quais, Maria Carolina Wanderley Caldas – Sinhazinha Wanderley, muito apreciava.

Os cadernos manuscritos foram cuidadosamente produzidos entre 1941 e 1979 e se constituem coletâneas de contos, modinhas, canções populares, hinos religiosos, poemas e planejamentos escolares e de cursos de formação, que inspirou o ensino de outras professoras. A caligrafia cuidadosamente caprichada denota o esmero, o amor e a entrega pelo ofício da escrita. Parte desses textos foi utilizada em práticas educativas como professora, inicialmente no Grupo Escolar Tenente Coronel José Correia, onde lecionou entre os anos de 1947 e 1960, e em seguida na Escola Estadual Juscelino kubitschek – ambas em Assú – até  20 de outubro de 1981, quando se aposentou, aos 71 anos.

Os textos selecionados por Silvia em seus escritos evidenciam maneiras de como viveu e pensou o mundo, foi educada e educou seus alunos e filhos do coração que a vida lhe deu, com vistas à formação de cidadãos de bem. Destacam-se os valores republicanos e conjunto de atitudes identificadas pela escritora Júlia Almeida (1930) como trabalho, inteligência, caráter, moralidade, magnanimidade de coração e crença na pátria e em Deus. Seus planos de aula constituem valioso registro histórico dos objetivos educativos da época, acrescido da perspectiva da escola não somente como uma extensão do lar, mas inspirada no ambiente familiar, a fim de oferecer uma atmosfera de segurança e afeto, condição propícia para uma boa aprendizagem.

Certa feita, a amiga Sinhazinha Wanderley presenteou-a com um poema intitulado Sílvia de Sá Leitão: 

É de boa estatura, a tez morena,
Tem dulçor, seu olhar,
O sorriso é suave, qual se fosse,
Um lírio a desabrochar

De rara inteligência, é esforçada,
Com zelo, com magia...
Tem cadernos de ponto e tem ainda,
De canto e poesia.

Tem uma paciência inesgotável,
Na arte de ensinar,
Vai à aula depois dos seus deveres,
No recinto do lar!

É muito preparada lá no Grupo,
Quinau, ninguém lhe passe!
Foi por merecimento nomeada,
Adjunta de classe.
Depois este lugar foi suprimido,
Pelo Departamento,
Mas ela, não ficou jamais avulsa
Nem mesmo um só momento

É pronta, a concorrer com seu auxílio
A quem a procurar
Ela vai com denodo e com carinho,
As turmas ensinar...

Eu dou-lhe o meu aplauso, o meu abraço,
De todo coração
Saudando a professora competente,
Sílvia de Sá Leitão.

Após galgar 72 degraus da vida, boa parte deles dedicados à educação, faleceu em 5 de setembro de 1982 e seu corpo sepultado no Cemitério São João Batista, em sua amada Assú.

A professora Sílvia Filgueira de Sá Leitão foi uma mulher notável, e através de suas práticas educativas, sinalizou condições vividas e partilhadas na formação social assuense. Evidenciou ideários educativos da sua época com vistas ao futuro, na construção de uma sociedade melhor.

Os seus “cadernos manuscritos” são cartas de amor às futuras gerações, eternizando versos, modinhas, contos... escritos com as tintas da generosidade e do afeto que desafiam a efemeridade do papel amarelado pelo tempo.

Nesta noite especial, onde minha felicidade só tem sentido por ser partilhada com familiares e amigos, ela não é minha, é de todos nós, é da cultura. Salve, Assú!

Muito obrigado.

Fernando Antonio de Sá Leitão Morais

* Algumas informações biográficas extraídas de trabalhos publicados pelas professoras Maria da Conceição Silva e Silvia Helena de Sá Leitão Morais.

quarta-feira, 5 de agosto de 2015


'' C O N T E P L A Ç Ã O ''
Meu olhar se perde contemplativo.
Nesta rara beleza da tela do céu .
Tudo se faz encanto , paz e alegria.
Maravilhosa pintura .
Na aquarela do céu.
A mais belas de todas as poesias.
Que da natureza o Senhor nos deu.
Autoria : Sara Camara
As 12:18 hrs
05/08/2015/

DISCURSO DE POSSE DO ACADÊMICO FRANCISCO JOSÉ COSTA DOS SANTOS


 
ASSU
O Assú envelhecendo
Com o seu tesouro imerso
Abre a fonte do progresso
Cumpre a ordem de Deus pai,
Teu nome quer dizer grande,
A tua história tem brilho,
Assú de João Celso Filho
Crescei e multiplicai. 
Nas tuas várzeas a brisa
Balança tuas palmeiras,
Das tuas carnaubeiras
Muita riqueza se extrai;
As tuas belas paisagens
Ao longe deslumbra a vista,
Assú de São João Batista
Crescei e multiplicai. 

Francisco Agripino de Alcaniz (Chico Traíra)

        Senhor presidente Ivan Pinheiro Bezerra, em nome de quem saúdo aos ilustres imortais desta Academia Assuense de Letras;
Sra. Waugia Maria Alcaniz, dileta amiga e filha do inigualável Francisco Agripino de Alcaniz, ou simplesmente Chico Traíra em nome de quem saúdo todos os representantes dos patronos aqui presentes;
Professora Francisca Livanete Barreto Ferreira, em nome de quem saúdo todo o público aqui presente, meu cordial boa noite.
         A constituição da Academia Assuense de Letras representa um marco indelével na história da cidade do Assu. Para mim, figurar entre os primeiros sete membros da Academia Assuense de Letras me enche de orgulho, pois suscita-me  o desejo inerente de, junto aos colegas de Academia, resgatar os valores culturais vividos em outrora e contribuir para que o título de Atenas Potiguar possa ser cada vez mais real e verdadeiro em todos os rincões deste estado e quiçá, deste país e deste mundo.
      Quero sequenciar minhas palavras apresentando o meu patrono Francisco Agripino de Alcaniz, ou simplesmente Chico Traíra. Nascido no Sítio Pau do Jucá, comunidade rural de Ipanguaçu em 08 de Janeiro de 1926, segundo o registro oficial. Desde muito cedo despertou dentro de si o gosto pela cultura, em especial a cultura nordestina. Relatos colhidos com familiares informam que ainda menino Chico Traíra era presença obrigatória nas rodas de viola da época. O apelido de Traíra veio por legado de família e acabou se confirmando culturalmente em função de suas tiradas sempre espirituosas. Nas cantorias de viola ninguém jamais conseguiu derrotá-lo na rima e se dizia que ele era escorregadio como uma traíra, daí a confirmação do apelido que lhe acompanhou por toda a vida e pela eternidade literária.
Viveu Chico Traíra da Arte, na Arte e pela Arte. Quando acometido de problemas pulmonares, se viu obrigado a abandonar a viola, dileta companheira, e dedicar-se ao folheto de cordel. Primorosos escritos surgiram dessa fase de meu patrono. Chico transitou com sua arte na política, na educação, na saúde, nas questões ambientais, culturais e principalmente na cidade do Assu. Ele também enveredou pela radiodifusão e mantinha programas de rádio em diversas emissoras. Foi um incentivador e assíduo colaborador do projeto MOBRAL de alfabetização.
Chico Traíra serviu de base para dezenas de estudos monográficos, de dissertações e teses de doutoramentos, algumas, inclusive, fora do país como é o caso da Tese: Chico Traíra: A popular poetry to the new world. Tese na qual o Dr. Richard Resbond Walsh, da Suécia, defende a obra de Chico Traíra como referência no cenário literário mundial.
Conforme o livro Fundação José Augusto, 40 anos, Chico Traíra foi considerado um dos maiores, violeiros que nasceram neste Estado. Seu improviso genial era reconhecido por toda a região e, mesmo, em outras partes do país. Entre seus inúmeros cordéis cabe destacar A minha vida de cantador pelo primoroso registro dos momentos mais representativos de sua trajetória artística, resumo admirável e ao mesmo tempo simples, ingênuo às vezes, no qual uma extrema sensibilidade perpassa cada estrofe.
Chico Traíra é um artista destacado no cenário cultural. “Um mestre em sua arte!” – esse parecer é unânime entre folcloristas e admiradores do gênero. É verbete no Dicionário de Repentistas e Poetas de Bancada, de Átila de Almeida e José Alves Sobrinho. Também é citado nas obras Poetas e Boêmios do Açu, de Ezequiel Filho  e Repentes e Desafios, de José Lucas de Barros.
É patrono do projeto Chico Traíra da Fundação José Augusto que estimula a produção e publicação de literatura de cordel no Estado do Rio Grande do Norte. Francisco Agripino de Alcaniz empresta seu nome à uma rua no bairro Frutilândia aqui na cidade do Açu. É constantemente homenageado e reconhecido como uma das cabeças culturais mais iluminadas do Rio Grande do Norte.
Foi casado com Dona Nilda Fernandes de Alcaniz com quem teve quatro filhos dentre os quais a senhora Waugia Maria de Alcaniz nos brinda com sua presença nesta solenidade de posse da Academia Assuense de Letras.
Chico faleceu em Natal, a 7 de maio de 1989, deixando pranteado o coração cultural do Rio Grande do Norte.
Minha escolha por Francisco Agripino de Alcaniz deveu-se a esse homem representar, de maneira inconteste, a cultura e a vida do povo potiguar seja através de sua viola, seja através dos versos, seja através da vida.
E, para encerrar minhas palavras gostaria de lhes recitar um pequeno trecho de um de meus trabalhos no campo poético denominado Minha História que diz:

Escrevi algumas “tretas”
Que se tornaram publicações
E na Academia Assuense de Letras
Vim viver novas emoções.

Tornando-me um imortal
Para a cultura exaltar
E pelas linhas da literatura
Valorizar o meu lugar.

Assim, trilho passos de amor
Canto o cântico da saíra,
Sob os auspícios de valor
Do grande Chico Traíra

Muito Obrigado e Boa Noite.

PADRE FLÁVIO MELO - COMUNICADO

Título do blog

Foto de Valéria Bulcão.
Fui convidado, nos últimos meses, a colocar meu nome como pré-candidato a prefeito da cidade de Assu, no Rio Grande do Norte. Consciente da responsabilidade, pedi um tempo para que pudesse refletir e tomar uma decisão amadurecida, buscando ouvir a voz de Deus.
Quero, inicialmente, agradecer ao nosso bispo Dom Mariano Manzana pelo diálogo franco e sincero. Ao prefeito de Assu, Ivan Júnior, pelo convite e ao deputado George Soares por endossar essa possibilidade, assim como as demais lideranças políticas pelas diversas manifestações de apoio.
Agradeço a minha família, aos irmãos padres, ao Conselho Pastoral de Assu, paroquianos e a todos que me conhecem por terem me acompanhado com suas orações neste momento da minha vida.
Hoje,04 de agosto, Festa de São João Maria Vianey, patrono dos padres, comunico a todos que não serei candidato a prefeito de Assu em 2016 e renovo, com muita alegria, meu compromisso de continuar servindo a todos no pleno exercício do ministério presbiteral a mim confiado no dia 23 de julho de 1994.
Pe. Flávio Augusto Forte Melo
Postado por Pauta Aberta.

terça-feira, 4 de agosto de 2015

ACADEMIA ASSUENSE DE LETRAS:

DISCURSO DE IVAN PINHEIRO NA SESSÃO SOLENE
LENDA MATUTA

Sô norteriograndense
Meu patrão, sou assuense
De alma, vida e coração
Pois, nessa terra bonita,
Eu tive a sorte bendita
De vê a luz, meu patrão.

Nascí, me criei, viví...
Muitas terras conhecí!
Muitas cidades maió.
Mas, pra falá a verdade,
Num achei outra cidade
Mais amiga, mais mió. 

Minha cidade Cabôca,
Qui anda de bôca in bôca
Causando admiração...
- Deus me perdoi a hirisia
Deu à luz – a Poesia,
Numa noite de São João.

Autor: Renato Caldas.
 
Autoridades, confrades, familiares dos patronos e dos acadêmicos que hoje tomam posse na Academia Assuense de Letras, senhoras e senhores, boa noite.

Falar sobre Renato Caldas, em Assu, não é necessário. A população mais madura o conheceu e a nova geração já ouviu falar de suas produções poéticas, de seus causos, de sua verve espirituosa. Sempre foi famoso, admirado e respeitado. Mas é preciso usar esta tribuna para falar um pouco sobre meu honroso patrono.

        Renato Caldas nasceu em Assu no dia 08 de outubro de 1902 e faleceu em 26 também de outubro de 1991. Sua vida foi dedicada à arte. Violonista, compositor e poeta. Percorreu quase todo o País entre as décadas de trinta a cinquenta, fazendo show’s e divulgando o nome do Assú. Foi assim nas grandes e médias cidades do Nordeste: Natal, Recife, Aracajú, Maceió, João Pessoa e Salvador. Também no Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.

Ficou conhecido como o “poeta das melodias selvagens”, por seus versos simples e espontâneos. Para muitos um poeta rude, mas sempre original, ao retratar em versos do gênero matuto a simplicidade da vida do homem do campo, a natureza sertaneja, a beleza feminina e diversos aspectos do amor.

Apresentava-se como “um verdadeiro caipira”, provocando no público desopilantes gargalhadas. Afeto, paixão, amor, indiferença, ódio, desilusão... Cheias, farturas, progresso... Secas, flagelo, retiradas, desespero... Tudo isto Renato Caldas retratou em suas poesias. Soube levar além fronteiras a alma do matuto ao som de sua viola e dos seus versos.

Nesse gênero, podemos afirmar que, no Rio Grande do Norte, ninguém conseguiu superá-lo, até hoje.

Autor dos livros; “Poesias”, “Fulô do Mato”, “Meu Rio Grande do Norte” e “Pé de Escada”, este, em parceria com o também poeta João Marcolino de Vasconcelos – Dr. Lou. Mas, foi em “Fulô do Mato” que conseguiu reunir seus melhores trabalhos.

A poesia que deu nome ao livro diz o seguinte:

FULÕ DO MATO –

Sá Dona, vossa mecê,
É a fulô mais cheirosa,
A fulô mais perfumosa
Qui o meu sertão já botô!
Podem fazê um cardume,
De tudo que for prefume,
De tudo qui fô fulô,
Qui nem um, nem uma só,
Tem o cheiro do suo
Qui o seu corpinho suô.

-Tem cheiro de madrugada,
fartun de areia muiáda,
qui o uruváio inxombriô.
É um cheiro bom déferente,
Qui a gente sintindo, sente,
Das outras coisa o fedô.

Em 1939, casou-se com D. Fausta da Fonseca Nobre, após noivado de doze anos. Ela foi sua musa inspiradora. Sua “fulô do Mato”, seu “Intusiasmo”, sua “Hirisia”, sua “Cunfissão”, seu “Oiá Pidão”, seu “Munturo”...  Foi “A Muié e o Amô”.


O poeta orgulhava-se de sua família: uma mulher de fibra, uma filha, Dona Geiza, duas netas, uma sabiá, uma cachorrinha e uma gata, - tudo do sexo feminino.


Profissionalmente, Renato foi tipógrafo, um dos primeiros motoristas de caminhão do Assu, caixeiro viajante e Avaliador Judicial, cargo equivalente a oficial de justiça, em cuja função aposentou-se.


Boêmio e seresteiro, apreciador das cantigas populares. Dizia que quando estava com os amigos, sua bebida predileta era a cerveja. Sozinho: Cana.


Tralhava mais com versos em sextilhas. No entanto também fazia trovas e dizia que gostava muito da que fez para sua mãe.


“Mamãe foi feliz morrendo

Foi feliz porque morreu
Pois se me visse morrendo
Sofria mais do que eu”.

Quando adolescente se enrabichou por uma moça que foi morar no sudeste. Na sua partida ele entregou um bilhetinho com essa quadra:

Maria da Cunceição
Faça uma bôa viage.
E leve meu coração
Dento da sua bagage.

Decorrido certo tempo ouviu falar que ela tinha arranjado outro e ele não perdeu tempo e enviou outra quadrinha:

... Maria da Cunceição
Você fez bôa viage?
Devolva meu coração
Qui foi na sua bagage.

Homem de inteligência rara com presença de espírito inigualável. Além de tocador e poeta ele era um ótimo prosador. Resumiu sua trajetória de vida em uma trova quando disse:


Eu? trabalhar desse jeito,

Com as forças que Deus me deu
Pra sustentar um sujeito
Vagabunda como eu?

Renato não escondia que o poema que mais gostava era reboliço:


Menina me arresponda,

Sem se ri e sem chorá:
Pruque você se remexe
Quando vê home passá?
Fica tôda balançando,
Remexendo, remexendo...
Pensa tarvez, qui nós véio,
Nem tem ôio e nem tá vendo?

Mas, se eu fosse turidade,

Se eu tivesse argum valô,
Eu botava na cadeia
Êsse teu remexedô...
E, adespois dele tá preso,
Num lugá, bem amarrado,
Eu pedia: - Minha nêga,
Remexe pro delegado.

Eu, Ivan Pinheiro, numa parceria com Gilvan Lopes, em 08 de outubro de 2002 - dia do centenário do nascimento do poeta -, com o apoio da Prefeitura, da editora Sebo Vermelho e da sua família lançamos os livros: Renato Caldas – O Poeta das Melodias SelvagensCartas Para Fausta e reeditamos o primeiro livro Fulô do Mato do ano de 1939.


Renato deu mais nome ao Assú do que o Assú deu a Renato. A 'Terra dos Poetas' ainda não conseguiu retribuir seus feitos.

Por isso e por outras particularidades, tenho sobre meus ombros a imensa responsabilidade de sentar em sua cadeira, defender e difundir a sua e a minha produção literária.

Que o velho Renato Caldas possa interceder junto ao Pai para que me ilumine nesta difícil, porém, gratificante caminhada.

Muito obrigado! 

sábado, 1 de agosto de 2015

FERNANDO CALDAS


JOÃO LINS CALDAS

Deus deu-me tudo.
Deus deu-me tudo do que a mim amargurado Deus me devia dar.
Deus deu-me tudo.
Si amargurado, porque a mim as razões de me amargurar.

Escreveu, numa inspiração magoada, o lírico modernista João Lins Caldas.

Assu registra, na noite de hoje, mais um capítulo de sua relevante história, com a instalação oficial da sua primeira academia de letras.

Assumo, nesta instituição cultural, uma cadeira cujo patrono é ninguém menos que João Lins Caldas. Tão rico legado é para mim uma honra, além de uma grande responsabilidade. Porque Caldas é, senão o maior, pelo menos um dos maiores poetas da língua portuguesa; autor de uma obra literária vasta, multifária e bela, marcada de profunda ternura e melancolia. De sua autoria, evoco:

Fiz-lhe ver aquilo que representava para a minha vida.
O que representava para o meu destino.
Era a minha vida.
Era o meu destino.
Aos seus olhos porém nada que aquilo lhe representou.

E queimou a minha alma.
E queimou o meu destino.

Por volta de 1900, aos 12 anos de idade e já poeta feito, Caldas chega à aristocrática e poética cidade de Assu, terra de seus ancestrais paternos, acompanhando seus pais João Lins Caldas e Josefa Leopoldina Lins Caldas (dona Fefa), procedente de Goianinha, região agreste ao sul do litoral potiguar, onde nascera em 1888. Tinha ele um único e querido irmão, chamado José Lins Caldas. Passa a conviver entre a terra assuense e o povoado de Sacramento (atual Ipanguaçu), fundado pelos seus antepassados.

Em 1908 mora na cidade do Natal, onde colabora em jornais como ‘A República’ e começa a enviar seus escritos para calendários como Almanaque de Pernambuco e Literário de Pernambuco (do Recife), Popular Baiano (de Salvador), Brasileiro Garnier (do Rio de Janeiro), Contemporâneo Paulista e o Luso-Brasileiro (de Lisboa), além do Almanaque de Barry (de Nova York/Brasil) e no Brasil Portugal. Folhinhas e almanaques de farmácias como Maranhense (do Maranhão), Farmacêutico Granado e O Farol da Medicina (do Rio de Janeiro) também contaram com a prestigiosa colaboração de Caldas.  
Regressa ao Rio de Janeiro em 1912, trabalha como revisor em jornais e escreve milhares de páginas de poesias. Ingressa no serviço público e torna-se frequentador habitual da Biblioteca Nacional e das livrarias José Olympio e Garnier, construindo relações amistosas com grandes nomes da política e das letras nacionais, como Ribeiro Couto, Olavo Bilac, Monteiro Lobato, Augusto Frederico Schimidt, Lima Campos, Hermes Fontes e José Geraldo Vieira, dentre outros.
Colabora em jornais como ‘Correio da Manhã’ (do Rio de Janeiro), ‘Correio do Povo’ (de Porto Alegre) e ‘Correio de Bauru’ (interior de São Paulo), e também em revistas nacionais de destaque, como a popularíssima ‘Fon-Fon’. A propósito, na edição de 1º de março de 1924 vamos encontrar este poemeto seu:
Sonho tão cheio da minha crença...
Sonho da imensa crença do sonho...

Eu tive um sonho que Já foi crença...
Que já foi crença?...
Nem hoje é sonho.

Caldas, que tinha a sua própria forma de construção gramatical, escreve no eixo Rio-São Paulo treze livros, dentre os quais registro ‘Litanias de um doido’, coletânea cujos manuscritos viria impressionar o crítico literário Pereira da Silva, para quem a obra caldiana “está para a língua portuguesa assim como ‘Balada do cárcere’ de Wild está para a Língua inglesa.” Além de ‘Árvore de Raios – pensamentos’:

Com esses olhos grossos de chuva eu quero chorar – escreveu o Caldas pensador.

Postumamente estão publicados os volumes intitulados ‘Perfil de João Lins Caldas’, 1974, por Maria Eugênia Montenegro; ‘Poética’, 1975, organizado por Celso da Silveira (Fundação José Augusto) e ‘Poeira do céu’, 2009, organização de Cássia de Fátima Matos dos Santos, pela Editora da UFRN.

É preciso relembrar que em 1917, muito antes da Semana de Arte Moderna (1922), Caldas já cantava em verso livre, emancipado dos grilhões da métrica, conforme afirmação do potiguar Antônio Bento. Considerado um dos maiores conhecedores e críticos de arte moderna no Brasil, Bento tinha Caldas na conta de ‘pai do modernismo brasileiro’.

Em 1933 retorna à cidade de Assu. Tempos depois, por intermédio de Esmeraldo Siqueira, colabora em importantes jornais do Nordeste brasileiro como ‘Diário de Pernambuco’ e ‘Jornal do Commercio’ (do Recife), numa época em que Mauro Mota e Esmeraldo Marroquim, respectivamente, dirigiam os suplementos literários daqueles periódicos da terra pernambucana.

Em 1936 imortalizou-se. O escritor José Geraldo Vieira, consagrado um dos maiores autores do romance moderno brasileiro, o contemplou em seu romance urbano de ficção, “essencialmente carioca”, intitulado ‘Território humano’, encarnado no original e emblemático personagem Cássio Murtinho. A façanha se repetiria. Em 1946, em ‘Carta à minha filha em prantos’, outro livro de sua autoria, bem como em longo depoimento proferido na Academia Paulista de Letras, em 1971, o escritor Vieira revela ser João Lins Caldas o seu verdadeiro Cássio.

Pena que o poeta que sonhava ganhar um Nobel de Literatura, e que “temia não ver repassado ao mundo literário a sua produção intelectual”, tenha morrido em 1967 sem publicar-se trilíngue: em português, inglês e francês, conforme aspirava e demonstrava a convicção de que, publicado todo o seu trabalho, se consagraria como um dos maiores ícones da poesia universal.

E o poeta, afinal, cuja obra poética podemos conferir muito forte a presença feminina, escreveu ardente de paixão, o poema que declamo:
:
O teu mundo é novo. A tua carne é nova. Eu sou a velhice, o mundo abalado.
O teu mundo que me convida. O permanente mundo em flor da tua carne.
Beijar-te os olhos, acariciar-te os dedos, ter nas mãos a doçura do teu cabelo, tua nuca, o teu pescoço roliço para acariciados...
Dirás que a vida é bela. A vida é bela!
Mas eu, amor, já agora tão triste e tão cansado.

Ontem que não chegou. Ontem que foi mesmo um dia amarelo...
Mas agora, que o dia é chegado...
Perdão, perdão, eu de mim mesmo é que já não sou belo.

Vai, e não leves de ti a tua desilusão...
O que me dói, o que ainda me dói...
(... E não ver essas roupas desmanchadas,
O azul desses olhos, a graça e a festa dessas mãos...)
Deixa que eu feche os olhos, e não te veja, e não veja mais nada...

Obrigado, e perdão.
_____

Muito obrigado.

Fernando Caldas



Fernando Caldas

Fernando Caldas. No telão, imagem do patrono João Lins Caldas







LITERATURA

No dia 1º de agosto é comemorado o Dia do poeta da Literatura de Cordel! Originária de Portugal, a literatura de cordel é um gênero literário popular que se espalhou pelo Nordeste brasileiro no século XIX e que hoje se faz presente também em outras regiões do país. Com grande importância para a manutenção das identidades locais e das tradições literárias regionais, os poemas são geralmente rimados e ilustrados com xilogravuras.

Conheça mais sobre este gênero literário em:
- A arte da escrever bem com a literatura de cordel (http://abr.ai/1ghbg7R)
- Ler por prazer no ritmo do cordel (http://abr.ai/1DJQNNZ)

Imagem: impressos de literatura de cordel à venda/Autor: Diego Dacal/Fonte: Wikimedia Commons

ACADEMIA ASSUENSE DE LETRAS

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A solenidade de posse dos acadêmicos na Academia Assuense de Letras (AAL) aconteceu ontem quinta-feira 30/07. O evento teve início às 19h30 no Cine Teatro Pedro Amorim, em Assú. A Academia Assuense de Letras (AAL), associação civil de direito privado sem fins econômicos, tem por finalidade o cultivo, a preservação e a divulgação do vernáculo, da literatura, da história e da atividade cultural em seus múltiplos aspectos. A primeira diretoria da AAL, constituída por sete membros eleitos por aclamação dentre os sócios fundadores tem como presidente Ivan Pinheiro Bezerra; vice-presidente Auricéia Antunes de Lima; 1º secretário Francisco José Costa dos Santos; 2º secretário Fernando Antônio Caldas; 1º tesoureiro Fernando Antônio de Sá Leitão Morais; 2º tesoureiro Francisco de Assis Medeiros e secretário de Comunicação, Antonio Alderi Dantas. Os primeiros ocupantes e as respectivas cadeiras da Academia Assuense de Letras ficou assim definido:
Cadeira nº 1 – Patrono: Palmério Augusto Soares de Amorim Filho, Titular: Antonio Alderi Dantas;
Cadeira nº 2 – Patrono: Celso Dantas da Silveira, Titular: Auricéia Antunes de Lima;
Cadeira nº 3 – Patrono: Francisco Augusto Caldas de Amorim – Chisquito, Titular: Francisco de Assis Medeiros;
Cadeira nº 4 – Patrono: Francisco Agripino de Alcaniz – Chico Traíra, Titular: Francisco José Costa dos Santos;
Cadeira nº 5 – Patrono: Renato Caldas, Titular: Ivan Pinheiro Bezerra;
Cadeira nº 6 – Patrono: João Lins Caldas, Titular: Fernando Antônio Caldas;
Cadeira nº 7 – Patrona: Silvia Filgueira de Sá Leitão, Titular: Fernando Antônio de Sá Leitão Morais.
O evento contou com cerimonial Lilas . Tom , vejam as fotos feitas por Dedé Ramalho.
Texto: Alderi Dantas.

De:  Assu Antigo E QUEM SE LEMBRA DA FORMAÇÃO DO GRUPO DOS 11, DO ASSU Era 1963, tempo efervescebte no Brasil, o presidente João Goulart (Ja...