Título fotografia do blog.
Por Ezequiel Fonseca Filho*
Conheci Sinhazinha Wanderley sempre a mesma. A idade e a doença que a levou ao túmulo, não mudaram a sua fisionomia.
Alegre e jovial jamais a vi triste, apesar dela dizer o contrário em seus versos.
Baixinha, tipo brevelíneo, constituição robusta, andar sacudido e expressão mediata, sempre tinha uma história a me contar quando nos avistávamos. Cabelos brancos, herança de família, cortava-os à la garçone e repartia-os ao meio como os rapazes da época. Tez morena clara, sem pregas e manchas, tinha os olhos pequeninos.
Melhor do que nós, porém, Sinhazinha Wanderley fez o seu retrato em versos e diz:
Eu sou um ser pequeno, amorenado
De óculos ao nariz e pisar manso
O cabelo cortado e todo branco
Sou mesma um tipo amarrotado.
Trajo um vestido azul já desbotado
Nunca rio, meu riso não é franco
Evito tropeçar nalgum barranco
Por ter um pé já quase deslocado.
Uso tênes, um par em cada mês
Eu só os compro a Xandú, por cada vez
Que os outros estão esburacados
Passeio nas calçadas, pau na mão,
Procurando fazer a digestão
Quando engulo à tardinha algum bocado.
Essa mania de retratar em versos parece um mal de família: Seu pai, Dr. Luioz Carlos, abre seu livro "Lira do Amor" com um perfil em versos e sua sobrinha, Carolina Wanderley, faz o mesmo em seu livro "Alma de Versos".
Sinhazibnha Wanderley quando saía à rua, a sua maior preocupação era com os cachorros aos quais tinha horror e medo. Se por acaso encontrava um desses animais pela via pública, não vacilava, entrava pela casa que se lhe deparava.
Já no último quartel de suas existência, usava uma bengala talvez uma reminiscência dos antigos tempos de seu pai. Dizia então que aquele bastão servia-lhe de amparo e defesa quanto aos cachorros. Nunca se viu, no entanto, uma reação de sua parte diante dos mais feroz representante da família canina.
Filha de Dr. Luiz Carlos Wanderley e sua esposa Francisca Carolina Lins Wanderley, foi, entretanto, adotada pelos seus tios Francisco Justiniano Lins Caldas e sua mulher Umbelina Wanderley Caldas, na companhia de quem fez moça.
Nessa idade, escreve:
Palpita o coração, de manso, medo,
Dentro de um sonho virginal, formoso...
Há sorrisos em festa e um dulçuroso
Poema santo de um gentil segredo.
A brisa beija as franças do arvoredo
Trinam aves um hino langoroso...
E de ilusões o sonho vaporoso
Esplende meigo, doce, grato, ledo.
E quando, enfim, do coração se evola
A pureza da crença que consola
O desalento, a mágoa, o pranto, a dor
Vê-se que d´alma se arredia agora
A luz tão bela quanto a luz da aurora,
O sol, sem nuvens, do primeiro amor.
Seu nome em cartório é Maria Carolina Wanderley Caldas, porém em seus versos sempre subscrevia o da intimidade, Sinhazinha Wanderley, e dizia com um sorriso malicioso, "é para não confundir os meus versos com os de Mariquinhja", sua sobrinha - Carolina Wanderley.
Nasceu para as artes. Adorava a música. Era fã do verso. Enamorada de tudo que era belo na natureza.
Da revista açuense "ATUALIDADE!, edição N. 31, de 3 de setembro de 1950, extraímos da secção - Arte, Música e Poesia - o soneto abaixo de sua autoria:
Deus fez a luz, e a virgem Natureza
Trajou sorrindo as vestes cor de prata
Mensageira do Bem, ela desata
O argênteo véu por toda redondeza
Deus fez do céu, um manto de turqueza
O sol, astro que os astros arrebata,
O sol, o salso mar, a verde mata
Fez a lua ideal, nívea princesa
Deus fez o homem, deu-lhe inteligência,
O homem pediu mais força, ciência
Riqueza, amor, enfim, graças a flux!...
Sendo, porém, mortal insaciável
Fitando um dia, o espaço imensurável
Teve inveja do sol, pediu mais luz.
A Conceição Amorim, Sinhazinha dedicou este soneto intitulado "Ao Luar".
Do firmamento azul na tela transparente
Desponta docemente a lua desmaiada
E garbosa desprende a coma desgrenhada
Orvalhando de luz as fímbrias do oriente
Lhe envia um terno afago a brisa perfumosa
Que beija brandamente a noiva peregrina
A namorar do lago a face cristalina,
Que a medo lhe retrata a face esplendorosa
Sinhazinha Wanderley
Constelações gentis de estrelas de esmeraldas
Lhe tecem com prazer belíssimas grinaldas
Num sublime transporte de mágico fulgor
E a lua vaga errante na esfera do infinito
Levando o lenitivo ao peito do proscrito
Vertendo a inspiração na mente do cantor.
Sinhazinha Wanderley não tem livros publicados como seus irmãos Segundo, Celestino e Ezequiel e as suas sobrinhas Palmira e Carolina. Deixou inéditos - Musa Sertaneja -, Torvas Infantis e Lira das Selvas.
Seus versos estão dispersos pelos jornais e revistas da terra que lhe viu nascer. Outro soneto dela:
Peço um retalho verde à natureza
Para enfeitar meus versos, quando escrevo
Tudo que penso e sinto, não descrevo
Nem posso expressar com bem clareza
Ouço as aves trinarem na deveza
Porém, a decantá-las não me atrevo
Das flores d´alma nem sequer um Trevo
Brota gentil! Porque tanta tristeza?!
Mas, eu não sei, porque, mesmo sorrindo
Os espinhos da dor vão me ferindo
O coração deserto e a alma triste.
A morte de Otávio Amorim, no dia 22 de julho de 1943, na capital do Estado, em consequência de um atropelamento de automóvel, em frente ao atual Colégio Salesiano, causou grande consternação na terra de seu berço. O saudoso desaparecido deixou na orfandade, dois filhos em tenra idade - Perceval e Margarida -. Sinhazinha Wanderley fez então estes versos, a Margarida:
Ontem foi branco, hoje é preto,
Que fatal contradição!...
Ontem, foi riso, alegria,
Hoje tudo e nostalgia,
Trevas junto ao clarão.
Ontem, natal radioso,
Aurora e resplandecer,
Hoje, o luto, a orfandade,
O triste pranto, a saudade,
O desalento, o sofrer!...
Ontem, cantos, esperanças,
Poemas de santo amor,
Beijos, carícias paternais,
Hoje, só bençãos maternas
Aliviam tua dor.
Mas, Deus criou a esperança
Criou o céu de porvir
Confia, crê, Margarida,
Na trajetória da vida
Hás-de ser feliz, fruir.
A virgem Mãe da bonança
Te envolve em cerúleo véu...
Manda-te o riso ao gemido
E o teu papai tão querido
Manda-te bênçãos do céu.
Foi professora do Grupo Escolar Te. Cel. José Correia, desde p ano de sua fundação. Mais de uma geração recebeu seus ensinamentos. Amava profundamente seus alunos. Depois de aposentada, frequentava diariamente as aulas, conversando e brincando com a garotada de quem dizia não poder se ausentar.
Antes de professora do Grupo exerceu o cargo de professora particular, administrando conhecimentos a uma plêiade de jovens, hoje com profissão definida no meio social e cultural de sua terra.
A poesia, entretanto, era os eu fraco. Seus versos, ora tristes, ora jocosos. Escrevia versos para si e para os outros. Não havia um batizado, festas de aniversário, bodas de casamento ou outro acontecimento social em que não estivessem presentes as quadrinhas de Sinhazinha Wanderley.
Já velha, alquebrada pelos anos e pela insuficiência cardíaca que a vitimou, pobre, morando em companhia de duas outras velhas escrevia aos seus ex-alunos e amigos em versos.
Depois de seu pai, talvez tenha sido Sinhazinha Wanderley quem mais compôs benditos e ladainhas para serem cantados na igreja de São João Batista do Açu... Vejamos uma Salve Rainha.
Salve rainha
Vida e doçura
Risonha e pura
Virgem de amor
Virgem que trazes
O alívio santo
Ao nosso pranto
A nossa dor.
Ninguém existe
Que não te adore
E orando, implore
A graça e a luz.
Luz da esperança
Serena e doce
Que vida trouxe
O teu Jesus.
Tu és a autora
Que acende os trilhos
Nalma dos filhos
No amor dos pais
E que transformas
Em riso e flores
As nossas dores
Os nossos ais.
Salve Rainha
Doce esperança
Luz de Aliança
Da terra e céus
Mãe dos que sofrem
Desamparados,
Dos desgraçados
E Mãe de Deus.
Durante muitos anos, Sinhazinha Wanderley regeu o côro da igreja de São João Batista. Vejamos outra composição mística. Agora é uma Ave Maria para ser cantada na Missa:
Vindo povo, colher flores
Cantar hinos de harmonia,
Entoando mil louvores
A sempre Virgem Maria,
Ave Maria
Quando nos campos amenos
Vai fugindo a luz do dia,
Nesta hora de saudade
Quando é doce essa harmonia
Ave Maria
Quando o nauta nas vagas
Já não tem rumo nem guia
Invoca a Estrela dos Mares
Saúda a Virgem Maria
Ave Maria
Quando o pecador, do crime
Sofre dura tirania
Sente ainda uma esperança
Invocando a Virgem Maria
Ave Maria
Quando o pobre aflito geme
Pelo pão de cada dia
Com o filhinhos de joelho
Recorre a Virgem Maria
Ave Maria
Em qualquer perigo ou dor
Na tristeza ou na alegria
Sempre na vida ou na morte
Invocamos a Virgem Maria
Ave Maria
Sinhazinha Wanderley era uma grande devota de Nossa Senhora. O mês de maio para ela, era o mês das inspirações. Em tudo que lhe oferecia a natureza, de grandioso, de belo, era motivo para exaltar a Virgem Maria. A 19 de maio de 1927, ela escrevia e musicava mais um hino:
Os louvores que entoamos
Aceitai Virgem Sagrada
Mãe celeste, abençoada
Do contrito pecador
Aqui vimos Mãe querida
Consagrar-te o nosso amor.
Vossas filhas devotadas
Vêm suplicar-vos Senhora
Sejais nossa protetora
Quer no prazer quer na dor.
Aqui vimos Mãe querida
Consagrar-te o nosso amor.
(...)
*Ezequiel Fonseca Filho foi quem escreveu aos 84 anos de idade, a primeira antologia dos poetas assuenses. Foi ele também prefeito do Assu, na década de trinta, tendo recebido em sua casa, onde hoje está assentado a Casa de Cultura, o presidente da república Getúlio Vargas. Ezequiel foi também deputado estadual, presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, cargo que equivalia ao de vice-governador do estado.
(Texto do livro intitulado de "Poetas e Boêmios do Açu", 1984, de Ezequiel Fonseca Filho).
Por Ezequiel Fonseca Filho*
Conheci Sinhazinha Wanderley sempre a mesma. A idade e a doença que a levou ao túmulo, não mudaram a sua fisionomia.
Alegre e jovial jamais a vi triste, apesar dela dizer o contrário em seus versos.
Baixinha, tipo brevelíneo, constituição robusta, andar sacudido e expressão mediata, sempre tinha uma história a me contar quando nos avistávamos. Cabelos brancos, herança de família, cortava-os à la garçone e repartia-os ao meio como os rapazes da época. Tez morena clara, sem pregas e manchas, tinha os olhos pequeninos.
Melhor do que nós, porém, Sinhazinha Wanderley fez o seu retrato em versos e diz:
Eu sou um ser pequeno, amorenado
De óculos ao nariz e pisar manso
O cabelo cortado e todo branco
Sou mesma um tipo amarrotado.
Trajo um vestido azul já desbotado
Nunca rio, meu riso não é franco
Evito tropeçar nalgum barranco
Por ter um pé já quase deslocado.
Uso tênes, um par em cada mês
Eu só os compro a Xandú, por cada vez
Que os outros estão esburacados
Passeio nas calçadas, pau na mão,
Procurando fazer a digestão
Quando engulo à tardinha algum bocado.
Essa mania de retratar em versos parece um mal de família: Seu pai, Dr. Luioz Carlos, abre seu livro "Lira do Amor" com um perfil em versos e sua sobrinha, Carolina Wanderley, faz o mesmo em seu livro "Alma de Versos".
Sinhazibnha Wanderley quando saía à rua, a sua maior preocupação era com os cachorros aos quais tinha horror e medo. Se por acaso encontrava um desses animais pela via pública, não vacilava, entrava pela casa que se lhe deparava.
Já no último quartel de suas existência, usava uma bengala talvez uma reminiscência dos antigos tempos de seu pai. Dizia então que aquele bastão servia-lhe de amparo e defesa quanto aos cachorros. Nunca se viu, no entanto, uma reação de sua parte diante dos mais feroz representante da família canina.
Filha de Dr. Luiz Carlos Wanderley e sua esposa Francisca Carolina Lins Wanderley, foi, entretanto, adotada pelos seus tios Francisco Justiniano Lins Caldas e sua mulher Umbelina Wanderley Caldas, na companhia de quem fez moça.
Nessa idade, escreve:
Palpita o coração, de manso, medo,
Dentro de um sonho virginal, formoso...
Há sorrisos em festa e um dulçuroso
Poema santo de um gentil segredo.
A brisa beija as franças do arvoredo
Trinam aves um hino langoroso...
E de ilusões o sonho vaporoso
Esplende meigo, doce, grato, ledo.
E quando, enfim, do coração se evola
A pureza da crença que consola
O desalento, a mágoa, o pranto, a dor
Vê-se que d´alma se arredia agora
A luz tão bela quanto a luz da aurora,
O sol, sem nuvens, do primeiro amor.
Seu nome em cartório é Maria Carolina Wanderley Caldas, porém em seus versos sempre subscrevia o da intimidade, Sinhazinha Wanderley, e dizia com um sorriso malicioso, "é para não confundir os meus versos com os de Mariquinhja", sua sobrinha - Carolina Wanderley.
Nasceu para as artes. Adorava a música. Era fã do verso. Enamorada de tudo que era belo na natureza.
Da revista açuense "ATUALIDADE!, edição N. 31, de 3 de setembro de 1950, extraímos da secção - Arte, Música e Poesia - o soneto abaixo de sua autoria:
Deus fez a luz, e a virgem Natureza
Trajou sorrindo as vestes cor de prata
Mensageira do Bem, ela desata
O argênteo véu por toda redondeza
Deus fez do céu, um manto de turqueza
O sol, astro que os astros arrebata,
O sol, o salso mar, a verde mata
Fez a lua ideal, nívea princesa
Deus fez o homem, deu-lhe inteligência,
O homem pediu mais força, ciência
Riqueza, amor, enfim, graças a flux!...
Sendo, porém, mortal insaciável
Fitando um dia, o espaço imensurável
Teve inveja do sol, pediu mais luz.
A Conceição Amorim, Sinhazinha dedicou este soneto intitulado "Ao Luar".
Do firmamento azul na tela transparente
Desponta docemente a lua desmaiada
E garbosa desprende a coma desgrenhada
Orvalhando de luz as fímbrias do oriente
Lhe envia um terno afago a brisa perfumosa
Que beija brandamente a noiva peregrina
A namorar do lago a face cristalina,
Que a medo lhe retrata a face esplendorosa
Sinhazinha Wanderley
Constelações gentis de estrelas de esmeraldas
Lhe tecem com prazer belíssimas grinaldas
Num sublime transporte de mágico fulgor
E a lua vaga errante na esfera do infinito
Levando o lenitivo ao peito do proscrito
Vertendo a inspiração na mente do cantor.
Sinhazinha Wanderley não tem livros publicados como seus irmãos Segundo, Celestino e Ezequiel e as suas sobrinhas Palmira e Carolina. Deixou inéditos - Musa Sertaneja -, Torvas Infantis e Lira das Selvas.
Seus versos estão dispersos pelos jornais e revistas da terra que lhe viu nascer. Outro soneto dela:
Peço um retalho verde à natureza
Para enfeitar meus versos, quando escrevo
Tudo que penso e sinto, não descrevo
Nem posso expressar com bem clareza
Ouço as aves trinarem na deveza
Porém, a decantá-las não me atrevo
Das flores d´alma nem sequer um Trevo
Brota gentil! Porque tanta tristeza?!
Mas, eu não sei, porque, mesmo sorrindo
Os espinhos da dor vão me ferindo
O coração deserto e a alma triste.
A morte de Otávio Amorim, no dia 22 de julho de 1943, na capital do Estado, em consequência de um atropelamento de automóvel, em frente ao atual Colégio Salesiano, causou grande consternação na terra de seu berço. O saudoso desaparecido deixou na orfandade, dois filhos em tenra idade - Perceval e Margarida -. Sinhazinha Wanderley fez então estes versos, a Margarida:
Ontem foi branco, hoje é preto,
Que fatal contradição!...
Ontem, foi riso, alegria,
Hoje tudo e nostalgia,
Trevas junto ao clarão.
Ontem, natal radioso,
Aurora e resplandecer,
Hoje, o luto, a orfandade,
O triste pranto, a saudade,
O desalento, o sofrer!...
Ontem, cantos, esperanças,
Poemas de santo amor,
Beijos, carícias paternais,
Hoje, só bençãos maternas
Aliviam tua dor.
Mas, Deus criou a esperança
Criou o céu de porvir
Confia, crê, Margarida,
Na trajetória da vida
Hás-de ser feliz, fruir.
A virgem Mãe da bonança
Te envolve em cerúleo véu...
Manda-te o riso ao gemido
E o teu papai tão querido
Manda-te bênçãos do céu.
Foi professora do Grupo Escolar Te. Cel. José Correia, desde p ano de sua fundação. Mais de uma geração recebeu seus ensinamentos. Amava profundamente seus alunos. Depois de aposentada, frequentava diariamente as aulas, conversando e brincando com a garotada de quem dizia não poder se ausentar.
Antes de professora do Grupo exerceu o cargo de professora particular, administrando conhecimentos a uma plêiade de jovens, hoje com profissão definida no meio social e cultural de sua terra.
A poesia, entretanto, era os eu fraco. Seus versos, ora tristes, ora jocosos. Escrevia versos para si e para os outros. Não havia um batizado, festas de aniversário, bodas de casamento ou outro acontecimento social em que não estivessem presentes as quadrinhas de Sinhazinha Wanderley.
Já velha, alquebrada pelos anos e pela insuficiência cardíaca que a vitimou, pobre, morando em companhia de duas outras velhas escrevia aos seus ex-alunos e amigos em versos.
Depois de seu pai, talvez tenha sido Sinhazinha Wanderley quem mais compôs benditos e ladainhas para serem cantados na igreja de São João Batista do Açu... Vejamos uma Salve Rainha.
Salve rainha
Vida e doçura
Risonha e pura
Virgem de amor
Virgem que trazes
O alívio santo
Ao nosso pranto
A nossa dor.
Ninguém existe
Que não te adore
E orando, implore
A graça e a luz.
Luz da esperança
Serena e doce
Que vida trouxe
O teu Jesus.
Tu és a autora
Que acende os trilhos
Nalma dos filhos
No amor dos pais
E que transformas
Em riso e flores
As nossas dores
Os nossos ais.
Salve Rainha
Doce esperança
Luz de Aliança
Da terra e céus
Mãe dos que sofrem
Desamparados,
Dos desgraçados
E Mãe de Deus.
Durante muitos anos, Sinhazinha Wanderley regeu o côro da igreja de São João Batista. Vejamos outra composição mística. Agora é uma Ave Maria para ser cantada na Missa:
Vindo povo, colher flores
Cantar hinos de harmonia,
Entoando mil louvores
A sempre Virgem Maria,
Ave Maria
Quando nos campos amenos
Vai fugindo a luz do dia,
Nesta hora de saudade
Quando é doce essa harmonia
Ave Maria
Quando o nauta nas vagas
Já não tem rumo nem guia
Invoca a Estrela dos Mares
Saúda a Virgem Maria
Ave Maria
Quando o pecador, do crime
Sofre dura tirania
Sente ainda uma esperança
Invocando a Virgem Maria
Ave Maria
Quando o pobre aflito geme
Pelo pão de cada dia
Com o filhinhos de joelho
Recorre a Virgem Maria
Ave Maria
Em qualquer perigo ou dor
Na tristeza ou na alegria
Sempre na vida ou na morte
Invocamos a Virgem Maria
Ave Maria
Sinhazinha Wanderley era uma grande devota de Nossa Senhora. O mês de maio para ela, era o mês das inspirações. Em tudo que lhe oferecia a natureza, de grandioso, de belo, era motivo para exaltar a Virgem Maria. A 19 de maio de 1927, ela escrevia e musicava mais um hino:
Os louvores que entoamos
Aceitai Virgem Sagrada
Mãe celeste, abençoada
Do contrito pecador
Aqui vimos Mãe querida
Consagrar-te o nosso amor.
Vossas filhas devotadas
Vêm suplicar-vos Senhora
Sejais nossa protetora
Quer no prazer quer na dor.
Aqui vimos Mãe querida
Consagrar-te o nosso amor.
(...)
*Ezequiel Fonseca Filho foi quem escreveu aos 84 anos de idade, a primeira antologia dos poetas assuenses. Foi ele também prefeito do Assu, na década de trinta, tendo recebido em sua casa, onde hoje está assentado a Casa de Cultura, o presidente da república Getúlio Vargas. Ezequiel foi também deputado estadual, presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, cargo que equivalia ao de vice-governador do estado.
(Texto do livro intitulado de "Poetas e Boêmios do Açu", 1984, de Ezequiel Fonseca Filho).