quarta-feira, 16 de outubro de 2019

PERSONALIDADES QUE CONTRIBUÍRAM COM O PROCESSO DE EMANCIPAÇÃO DO ASSÚ

Villa Nova da Princesa prosperava em todos os sentidos. Alguns de seus filhos já apareciam como destaques. Os habitantes lutaram com garra visando a liberdade política e administrativa do município. Apesar do Assú já possuir uma câmara independente de Natal e ser considerado município, ainda detinha o nome de Villa. Na luta pela emancipação destacamos três cidadãos: Francisco de Brito Guerra, Manoel Lins Wanderley e João Carlos Wanderley. 
 
Padre Francisco de Brito Guerra - nascido na Villa no dia 18 de março de 1777, no cenário político norte-rio-grandense, e no regime monárquico, se destacou com uma brilhante folha de serviços, honrando a sua terra e seu Estado. Como deputado à primeira Assembléia Legislativa Provincial (1835-1837), instalada a 02 de fevereiro de 1835, foi neste ano, seu presidente.
 
Foi suplente de deputado-geral, com assento de 1831 a 1834 e reeleito para 1835-1837, quando então, foi eleito escolhido à Câmara Vitalícia ou Senado do Império para representar o Rio Grande do Norte, cuja posse se deu a 10 de julho de 1837, tornando-se o único norte-rio-grandense a alcançar essa elevada distinção. 
 
Foi Visitador Geral, Professor de latim, Comendador da Ordem de Cristo, um dos fundadores do ‘O Natalense’ - o primeiro jornal a ser publicado no Estado. Ordenou-se em Olinda no ano de 1801. Suas primeiras letras foram recebidas na antiga Villa Nova da Princesa, hoje cidade do Assú.
 
A esta proposição se baseia em seu próprio depoimento quando, em 20 de novembro de 1844, ao fazer o seu testamento, declarava: “Sou natural da Freguesia do Assú” e mais, o Presidente da Província Dr. Casimiro José de Morais Sarmento quando da publicação da Lei nº 124 de 16 de outubro de 1845, elevando à categoria de Cidade a então Villa Nova da Princesa, assim se expressou: “Pátria do finado Senador Francisco de Brito Guerra”. (Amorim, 1981; 53). 
 
Coronel Manoel Lins Wanderley – nascido no dia 22 de março de 1804 foi deputado provincial, tomando parte na instalação da Assembléia Provincial a 02 de fevereiro de 1835. Foi um dos homens do passado que mais conquistou a simpatia da população do Assú, e de quem o conheceu.
 
Espírito generoso, criativo e empreendedor, Coronel Wanderley era de um caráter que se salientava por sua imensa firmeza.
 
Pertencia à família Wanderley desta cidade. Abraçou a carreira comercial, onde desenvolveu o seu tino, mantendo um excelente estabelecimento comercial no pavimento térreo do casarão (atual sobrado da Casa de Cultura Popular), onde morou e depois residiram sua filha a Baronesa Belizaria e o Barão Felipe Néri. 
 
Coronel Wanderley fez notáveis melhoramentos nesta cidade, edificando vários prédios de feição mais moderna, entre os quais se verifica até hoje, além de muitos outros, o palacete citado.
 
Edificou também a atual matriz da cidade (ampliação e reforma), para cujo trabalho despendeu ele próprio com a maior parcela de capital e doou a imagem de São João Batista. 
 
Imortaliza-o na história o fato de haver tomado parte como revolucionário contra Pinto Madeira. Para enfrentar a “fera” armou 200 homens, solteiros e casados, e partiram para o interior dos sertões do Ceará, com gastos por sua conta, em defesa da Pátria.
 
Ao ter ciência da sua ida, temendo sua tradição de valente, o inimigo içou a bandeira branca pedindo paz, que lhe foi concedida na condição de dar a guerra por terminada, e assim, o confronto foi encerrado.
 
Isto ocorreu em 1832, contando ele apenas 28 anos de idade e havendo há pouco se consorciado com a Sra. Maria da Trindade Wanderley.
 
O regresso desses patriotas teve uma feição muito festiva. A população preparou-lhe uma manifestação toda espontânea. O grupo foi recepcionado pela população no Sítio Poaçá.    
   
Os voluntários entraram na cidade a pé e abraçados com as suas famílias, por entre o jubilo entusiástico da população. Ocorreu um banquete, à sombra de um frondoso tamarineiro (árvore que existia no muro da casa do seu pai, onde atualmente funciona a DIRED). Foi nessa ocasião que o povo, segundo uso da época, lhe conferiu pelo voto a patente de Coronel, como gratidão aos seus beneméritos feitos. (A. Fagundes; 37). 
 
O outro conterrâneo que certamente contribuiu decisivamente para os primeiros passos desenvolvimentistas desta terra e, sobretudo, para sua emancipação foi o Coronel João Carlos Wanderley. Membro do senado da Câmara, autor da Lei nº 124, que elevou a então Villa Nova da Princesa à categoria de cidade do Assú. Foi presidente da Câmara dos Vereadores e, nessa qualidade, governou a cidade. Foi sete vezes deputado. Secretário de Governo doze anos e Deputado Geral. Como Vice-Presidente da província, administrou quatro vezes o Estado. Advogado dativo. Sobre ele, Pedro II disse: “matuto da língua de prata”.
 
Foi um cidadão de inigualável amor pelo desenvolvimento social da sua terra berço, não ponderando ele sacrifícios nesse sentido, e tudo fazia com a alma vibrante de uma satisfação intima, por ter a ventura de prestar serviços à terra do seu nascimento. Trabalhou por muitos anos defendendo as belas causas e pugnando pelos interesses coletivos do município. 
 
Transferindo sua residência para a capital do Estado não se esqueceu ele de continuar ali a labuta dos seus serviços à sua terra. Envolto nos mantos da modéstia que sempre o caracterizou, deve-se o início da literatura assuense por ter sido o fundador do primeiro jornal (O Assuense – 1867) do interior do Rio grande do Norte. (A. Fagundes; 39/40). 
 
Afora estes, muitos outros deram sua contribuição. No entanto, sem desmerecer a participação de nenhum deles, destaca-se tão somente estas três personalidades.
  
 Emancipação política e administrativa do ASSÚ

No ano de 1845 assumiu, interinamente, a Presidência da Câmara Municipal de Villa Nova da Princesa, o Juiz de Direito Dr. Luiz Gonzaga de Brito Guerra até outubro de 1845. O Macapá (região do Assú onde fica a ‘Lagoinha’), nessa época, pertencia a Câmara Municipal. (Silveira, 1995; 77).  
 
No dia 30 de setembro de 1845 o então Deputado Provincial, João Carlos Wanderley, deu entrada ao Projeto Provincial, para elevar a Villa Nova da Princesa à categoria de cidade, com o nome de Assu, sendo aprovada pelos nobres deputados.
 
Finalmente, em 16 de outubro de 1845 foi sancionada a lei número 124, aprovada pela Assembléia Legislativa Provincial, elevando a Villa Nova da Princesa, pátria do finado Senador Francisco de Brito Guerra, à categoria de cidade, com o nome de ASSÚ - (com dois esses e acento agudo no “U”). Vejamos de conformidade com a original:

LEI Nº 124 – Elevando á categoria de Cidade a Villa Nova da Princeza, com a denominação de Cidade do Assú.
O Dr. Casimiro José de Moraes Sarmento, Presidente da Provincia do Rio Grande do Norte. Faço saber a todos os seus habitantes, que a Assembléa Legislativa Provincial decretou, e eu sanccionei a Lei seguinte:
Artigo Unico. Fica elevada á categoria de Cidade a Villa Nova da Princeza, patria do finado Senador Francisco de Brito Guerra, com a denominação de Cidade do Assú; e revogada qualquer disposição em contrario.
Mando, portanto a todas as Autoridades, a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumprão e fação cumprir tão inteiramente como nella se contém. O Secretario interino desta Provincia a faça imprimir, publicar e correr. Palacio do Governo do Rio Grande do Norte, 16 de Outubro de 1845, vigesimo quarto da Independencia e do Imperio.
(L. S.) Dr. Casimiro José de Moraes Sarmento.
Lei da Assembléa Legislativa Provincial, que V. Exc. Houve por bem sanccionar, elevando á categoria de cidade a Villa Nova da Princeza, com a denominação de Cidade do Assú.
Para V. Exc. Ver.
João Ferreira Nobre a fez.
Publicada e sellada nesta Secretaria do Governo do Rio Grande do Norte aos 16 de Outubro de 1845. O Secretario interino – José Nicacio da Silva.
Registrada á folhas 178 do livro primeiro de semelhantes. Secretaria do Governo do Rio Grande do Norte, em 17 de Outubro de 1845 – O Segundo Escripturario.
José Martiniano da Costa Monteiro.  (Silveira, 1995; 09).

O Ato Público da Proclamação da Independência do Município e da posse do novo Presidente da Câmara Municipal Senhor Coronel Manoel Lins Caldas, o qual, a partir daquela data, assumiria os destinos do recém criado município do Assu, deu-se no “Alto do Império” – atualmente este local recebe o nome de Praça São João Batista.

Fonte: Assu - Dos Janduís ao Sesquicentenário.

Nilton Filhodj
"Nenhuma tatuagem, cabelo normal, chuteira preta comum, sem brincos e modinhas... Era futebol de verdade!!!!"

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Hômi, deixe de Guerra! - EP. 1

EVENTO DE LANÇAMENTO DO PROJETO DO SEBRAE – NATAL E PARNAMIRIM FIELD NA SEGUNDA GUERRA

https://tokdehistoria.com.br, de Rostand Medeiros


Rostand Medeiros – IHGRN
SITE DO PROJETO NATAL & PARNAMIRIM FIELD NA SEGUNDA GUERRA – http://www.segundaguerra.com.br/
Foi uma noite memorável na Casa da Ribeira, principalmente para aquele que pensam e realizam projetos relativos ao conhecimento e democratização da informação histórica dos eventos ligados a Segunda Guerra Mundial no Rio Grande do Norte.
Como comentou o amigo Yves Bezerra, gestor desse projeto, a proposta busca apresentar em Natal e Parnamirim os pontos de interesse cultural e histórico das duas cidades, que até então têm sido pouco explorados e que estes possam ser trabalhados por empresas de receptivo para atrair mais turistas e interessados no assunto.
Um salto verdadeiramente interessante para o turismo potiguar. Esse projeto faz parte das ações do programa Investe Turismo, que é promovido pelo Sebrae, Ministério do Turismo, Embratur e Secretaria Estadual de Turismo (Setur).
Depois de dois anos de trabalho, foi hora do SEBRAE-RN apresentar Natal & Parnamirim Field na Segunda Guerra. E tudo foi muito bom!
Com Zeca Melo, Diretor Superintendente do SEBRAE-RN,
Como foi comentado anteriormente, a presença de milhares de soldados americanos no cotidiano de Natal mudou a cultura e os costumes da cidade, a população bem sabe. No entanto, nenhum desses argumentos foi relevante para o Rio Grande do Norte ter um roteiro turístico para explorar esse fato histórico. Agora chegou a hora!
Meus agradecimentos aos amigos da Art&C e ao SEBRAE-RN, especialmente ao superintendente Zeca Melo pela confiança e apoio.
Com o amigo Yves Guerra de Carvalho, Gestor do Projeto Natal & Parnamirim Field na Segunda Guerra Investe Turismo RN.


A imagem pode conter: céu, noite, árvore, atividades ao ar livre e natureza
Assu/RN. Fotografia de Roberto Meira.
 
A imagem pode conter: árvore, céu, noite, crepúsculo, atividades ao ar livre e natureza

domingo, 13 de outubro de 2019

Dia cinza
Há dias o sol não aparece
E eu não consigo me mexer
Passo as horas pensando, pensando
Rejeitando a certeza de que não posso viver.
Que escuridão, que frio
Minha alma se acaba em arrepios
Cada vez que busco teus olhos no infinito.
Minha pele está rugosa e disforme,
Meus ossos estão doloridos
E eu não consigo sair...
Venha me buscar, ainda estou à sua espera
Quero mais um abraço
Preciso dos seus carinhos
Necessito falar-te mais uma vez.
Tire-me deste buraco profundo
Quero voltar pro teu mundo,
Não me deixe tão sozinho...
Marianna Melles.


 De: Psicografici
Saudade! - Tenho saudade
Do tempo em que não sabia
Que esta palavra "saudade"
Infelizmente existia.


"Deus não perdoa. Deus não perdoa porque Ele é Justo. E um justo não perdoa. Não existe justiça com perdão. Alguém que está sendo acusado de ter praticado um crime, se for considerado culpado, a justiça o condenará; se for considerado inocente, a justiça o inocentará. Dar a cada um aquilo que lhe pertence é a essência da justiça. Se o justo perdoasse o culpado, ele seria bondoso, misericordioso, totalmente amor, mas perderia sua qualidade de justo. O perdão é um ato de bondade, de misericórdia. A justiça não! Ela julga com retidão e dá àquilo que é de direito. Por isso, sendo Deus perfeitamente justo, não haveria de perdoar, já que um justo não perdoa."

João Lins Caldas
Amanhecer... Perfeição da Natureza. Areia Branca/RN
Belo click nas lentes de Willgton Costa.  
 Da Linha do Tempo/Facebook de Lúcia Rodrigues

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

10 poemas memoráveis de Manuel Bandeira

Rebeca Fuks
Doutora em Estudos da Cultura

https://www.culturagenial.com
Manuel Bandeira (1886-1968) foi um dos maiores poetas brasileiros tendo ficado conhecido pelo grande público especialmente pelos célebres versos Vou-me Embora pra Pasárgada e Os sapos.
Mas a verdade é que, além dessas duas grandes criações, a obra do poeta comporta uma série de pérolas pouco conhecidas entre os leitores.
Na tentativa de preencher essa lacuna selecionamos aqui 10 poemas memoráveis do escritor modernista Manuel Bandeira com as suas respectivas explicações.

1. Os sapos

Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
O poema Os sapos (o trecho inicial encontra-se reproduzido acima) foi criado em 1918 e deu o que falar ao ser declamado por Ronald de Carvalho durante a emblemática Semana de Arte Moderna de 1922.
Numa crítica clara ao parnasianismo (movimento literário que definitivamente não representava o poeta), Bandeira constrói esse poema irônico, que tem métrica regular e é profundamente sonoro.
Trata-se aqui de uma paródia, uma maneira divertida encontrada pelo eu-lírico de diferenciar a poesia que praticava daquela que vinha sendo produzida até então.
Os sapos são, na verdade, metáforas para os diferentes tipos de poetas (o poeta modernista, o vaidoso poeta parnasiano, etc). Aos longo dos versos vemos os animais dialogarem sobre como se constrói um poema.
Conheça uma análise aprofundada do poema Os sapos e confira os versos declamados:

2. Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
— Respire.
— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Esse brevíssimo poema também muito conhecido do autor carrega no título o nome de uma condição médica. Ao longo das primeiras linhas vemos listados uma série de sintomas.
Se na primeira estrofe o doente sofre sozinho, na segunda parte do poema assistimos a uma consulta com o médico. O doutor dá instruções ao paciente na tentativa de conseguir diagnosticar a doença.
Por fim, assistimos a triste constatação da doença comorbidade. O paciente ainda tenta encontrar uma saída para o seu problema, mas o médico, num tom poético e ao mesmo tempo irônico, aponta a música como única solução possível.

3. O último poema

Assim eu queria o meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.
A morte é um tema frequente na poética de Bandeira, assim como, em termos estéticos, podemos apontar o uso de versos livresO último poema condensa essas duas características do poeta, que pretende estabelecer com o leitor uma relação de cumplicidade nesse poema metalinguístico.
Os versos acima são característicos de um metapoema, de uma lírica que se debruça sobre ela mesma. O eu-lírico aqui tenta, num tom quase de desabafo, por de pé tudo aquilo que gostaria de inserir no seu último poema.
O interessante é perceber que ao dizer como quereria construir o seu poema, o sujeito poético já constrói o próprio poema.

4. Vou-me embora para Passárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Eis o mais consagrado poema de Bandeira: Vou-me embora para Passárgada. Aqui encontramos um inegável escapismo, um desejo do eu-lírico de evasão, de sair da sua condição atual rumo a um destino altamente idealizado.
O nome do local não é gratuito: Pasárgada era uma cidade persa (para sermos mais precisos, foi a capital do Primeiro Império Persa). É ali que o sujeito poético se refugia quando sente que não consegue dar conta do seu cotidiano.
Tradicionalmente esse gênero de poética que almeja à liberdade propõe uma fuga para o campo, na lírica do poeta modernista, no entanto, há vários elementos que indicam que essa fuga seria em direção à uma cidade tecnológica.
Em Passárgada, esse espaço profundamente desejado, não existe solidão e o eu-lírico pode exercer sem limites a sua sexualidade.
Leia uma reflexão sobre o poema Vou-me embora pra Pasárgada.

5. Teresa

A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.
 Finalmente um poema de amor! Manuel Bandeira ao compor Teresa demonstrou, em versos, como se dá o encontro amoroso.
Desmistificando a noção de amor à primeira vista, o eu-lírico transparece no poema exatamente o que sentiu a primeira vez que encontrou Teresa.
Da segunda vez que se viram também o sujeito poético parece não ter ficado nada encantado pelos atributos físicos daquela que viria a transformar-se na sua amada.
É na última estrofe que testemunhamos o encantamento do eu-lírico, que já não consegue mais descrever a parceira e sim o turbilhão de afetos provocado pela presença dela.

6. O impossível carinho

Escuta, eu não quero contar-te o meu desejo
Quero apenas contar-te a minha ternura
Ah se em troca de tanta felicidade que me dás
Eu te pudesse repor
-Eu soubesse repor -
No coração despedaçado
As mais puras alegrias de tua infância!
Um poema de amor que recorre aos sentimentos vividos durante a infância, esse é o mote que move O impossível carinho. O eu-lírico não deixa transparecer nenhum aspecto físico ou psicológico da amada, o que sabemos são apenas descrições do sentimento que o arrebata.
Já pela primeira palavra vemos que o sujeito se dirige a alguém, a dona do seu afeto. É com ela que ele deseja partilhar o seu mais íntimo desejo que resulta do sentimento de gratidão. A moça faz com que ele se sinta tão bem que o que brota nele é a vontade de retribuir tudo de bom que recebe.
As alegrias da infância são o oásis sonhado, o lugar de plenitude que o sujeito poético pretende oferecer à amada como forma de agradecimento.

7. Poética

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o
cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de excepção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora
de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário
do amante exemplar com cem modelos de cartas
e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare
– Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.
Nos versos de Poética, Manuel Bandeira se debruça sobre o próprio processo de escrita do poema. Aqui o eu-lírico enfatiza aquilo que aprecia e o que tem repulsa no âmbito da lírica.
Tido como um dos mais importantes poemas do Modernismo brasileiroPoética é um retrato não só da poética de Manuel Bandeira como também de toda uma geração de escritores que não se identificava com o que vinha sendo produzido até então.
Escrito quase como uma espécie de manifesto, por um lado Bandeira nega uma composição rígida, severa, que cumpre normas rigorosas (como faziam os parnasianos) enquanto por outro lado celebra os versos livres, a linguagem informal e a tão contemporânea sensação de liberdade experimentada pelos poetas.

8. Arte de amar

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus – ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.
 Esse poema de amor de Bandeira é marcado por uma tristeza e por uma alegria: observamos ao longo dos versos a impossibilidade dos amantes se comunicarem, por outro lado celebramos o fato dos corpos se entenderem apesar das limitações da comunicação.
O sujeito lírico aqui parte do pressuposto que há uma divisão básica entre a alma e o corpo. A alma, segundo o eu-lírico, só é capaz de encontrar sossego em Deus ou no sobrenatural e não em algum ser humano.
Diante dessa lamentável condição, o poema sugere que os corpos - ao contrário das almas - são capazes de se entenderem. O título Arte de amar, versa justamente sobre a oposição corpo e alma e sobre o lugar dos afetos nessa equação.

9. Desencanto

Eu faço versos como quem chora
De desalento… de desencanto…
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.
Meu verso é sangue. Volúpia ardente…
Tristeza esparsa… remorso vão…
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.
E nestes versos de angústia rouca,
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.
— Eu faço versos como quem morre.
Desencanto é considerado um metapoema, ou seja, um poema que procura descrever o próprio processo de criação literária.
Nos versos acima é como se o leitor fosse convidado a visitar o escritório do poeta e entender as engrenagens que movem a escrita.
A literatura, nesse caso, é tida como uma espécie de válvula de escape, o lugar onde o sujeito encontra alento para o seu profundo sofrimento. Através da leitura do poema somos capazes de enxergar a dor e o desemparo do poeta, que labuta para transformar os seus transtornos pessoais em palavras.

10. Consoada

Quando a Indesejada das gentes chegar
(Não sei se dura ou caroável),
talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
— Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com os seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.
O poema, todo construído a partir de uma metáfora, trata de um tema duro: a preparação para a chegada da morte. É curiosa a escolha do título, bastante simbólico: a consoada é o banquete que acontece na noite de Natal ou na véspera do Ano-Novo.
O tom da escrita é de informalidade, de intimidade e de espontaneidade: o eu-lírico transparece as possíveis reações que teria com a chegada da Indesejada. Os versos, aliás, se constroem com base em duas oposições-chave: a vida e a morte, o dia e a noite.
Podemos concluir, após a leitura dos poucos versos, que embora pareça conformado com o inevitável comparecimento da morte, o sujeito lírico não deseja a sua chegada.

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