Por Ezequiel Fonseca Filho
(Do livro Poetas e Boêmios do Açu, 1984)
Enquanto o impaludismo chegava a Várzea do Açu, trazido da África pelo Gâmbia, o mais terrível vetor dessa doença, Francisco Amorim escrevia um livro de versos intitulado "Seriema". Nessa época resolvi transferir minha família para Natal, deixando-me ficar como médico no foco da doença sobre a ação de atebrina.
Enquanto a copeira arranjava a mesa para o almoço, Francisco Amorim lia, para mim, alguns sonetos do seu livro. Vejamos este:
Vagando pelas ruas da cidade
A seriema cisma. , assim parece
Esquecer um vislumbre de saudade
Que cada dia no seu peito cresce.
A sua alma, talvez, creio, padece
a humana gente a pérfida maldade.
E, indiferente, cada vez mais tece
A mágoa que traz felicidade.
Alheia ao mundo filosofa a esmo.
Pára, absorta, na atitude mesmo
De quem até de si fica esquecida.
Horas a fio vendo-a meditando,
Eu também igual à Seriema eu sou na vida.
Levantando os óculos até a testa, pergunta-me: você acha que Seriema é uma ave cismarenta? continua:
A Seriema triste, recolhida
Aos recantos felizes da cidade,
Vive agora, de todos escondida,
Na sua ingênua infelicidade.
E quer assim viver, creio, esquecida
Dessa enganosa e vil humanidade,
Dentro do seu sonho, embevecida,
Gozar um pouco de tranquilidade.
No seu isolamento, cisma, pensa...
A visão do passado, viva, intensa,
Lhe traz o coração em desatino.
Pobre pernalta, à mágoa assim tamanha,
É igual, talvez, à mágoa que acompanha
As asperezas deste meu destino.
Chisquito, como o chamamos na intimidade, escreveu outro livro de versos a que deu o nome de "Teu Livro". Vamos ler outro soneto seu:
TEU LIVRO
Nem mesmo um só instante, flor que estimo,
Deixei de ver-te no meu pensamento.
O teu olhar, teu gesto, o teu arrimo,
Não fugiam de mim, um só momento.
Um detalhe sequer, que vale um mimo,
Se harmonizava com meu sentimento,
E se versos fazer ainda me animo,
É que tu és o meu deslumbramento.
Este livro, mulher, escrevi quando
Exilado de ti, olhar chorando,
Busquei no verso suportar a dor.
É teu. Não me pertence. Foi escrito,
Com o pranto que verti, quando proscrito,
Chorava a perda do primeiro amor.
Vamos ler mais um soneto
SÚPLICA
Vai alta noite já. Entro em meu quarto
À procura de um bem que não existe.
Passo as horas cismando, cheio, farto,
Desta saudade que em meu ser persiste.
Tenho opressão como se fosse enfarto,
Se processando na minha alma triste.
E se ânsias cruéis, sozinho parto,
Volto a te desejar. Ninguém resiste.
É a falta de ti que me aborrece.
E a insipidez da ausência me parece,
O longo isolamento do degredo.
Vem, já não suporto este martírio,
Aos meus olhos eu vejo a luz do círio,
Fica perto de mim. Não tenhas medo.
Chisquito não é só poeta. Tem livro também em prosa. "EU CONHECI SESYON" é um dos seus livros já em quarta edição. Além deste, tem outros: A "História da Imprensa do Açu"; A "História do Teatro", "Açu de Minha Meninice", e muitos outros. Chisquito é um dos mais salientes escritores de sua terra.
Em uma das eleições municipais para prefeito, Chisquito obteve maioria de votos. Eleito, exerceu a função de Prefeito, deixando um raio de luminosidade na sua Administração Municipal.
Postado por Fernando Caldas
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