sábado, 27 de outubro de 2012

SABOR SAUDADE: ALFENIM - UM DOCE BRINQUEDO!




Alfenim. Que saudade que eu tenho desse doce! Pra mim era muito mais que um doce, era um doce brinquedo! Lembro quando ia para a feira das Rocas com o meu pai, e ficava encantada com a banca que vendia alfenins: doces branquinhos em forma de bonecos, flores, cachimbos, chupetas...todos contornados de vermelho. Eu tinha uma coleção deles, mas a coleção durava pouco pois criança alguma resiste muito tempo diante de um alfenim - o doce crocante que desmancha na boca! Infelizmente as gerações mais novas não conhecem o alfenim, que praticamente  deixou de fazer parte da nossa gastronomia e da infância de muitos jovens de hoje em dia.



Herança do tradicional doce de tabuleiro do Brasil colônia, o alfenim é um doce delicado e frágil, de cor branca, que se apresenta em formas esculpidas de bonecos, animais, flores e tudo mais que a imaginação criar. A história do Alfenim começa com os árabes, passa pelos portugueses e chega ao Brasil onde adquire forte significado cultural no nordeste brasileiro.  
Em 1939 Gilberto Freyre, escrevia no seu livro Açúcar "... Os doces com feitio de homem e de animal, sempre muito encontrados nas feiras portuguesas, e dos quais Leite de Vasconcelos já escreveu que parecem "relacionar-se com antigas formas cultuais" comunicaram-se ao Brasil, sobrevivendo nos mata-fomes de tabuleiro e nos alfenins. Os mata-fomes em forma de cavalo, camelo, camaleão, homem ou mané-gostoso; os alfenins, em formas também de homem, menina, galinha, galinha chocando, pombinhos, cavalo. Doces hoje raros mas que ainda se encontram no Nordeste..."


                                                  
Para Câmara Cascudo "Alfenim: alfenie, do árabe, valendo o alvo, o branco. Massa de açúcar branco, uma das  gulodices orientais. Em Portugal, já era popularíssima em fins do século XV e princípios de XVI. Citado em Gil Vicente, Jorge Ferreira e Antônio Prestes. Era um doce fino, sem as complicações portuguesas e brasileiras, onde tomou formas humanas, de animais, flores, objetos de uso, vasos, cachimbos, estrelas. Sempre com pequenos desenhos vermelhos. É açúcar e água, apenas. Passa-se goma nas mãos na hora de puxar o fio no ponto do alfenim. De sua fragilidade e mimo restou a comparação melindroso como alfenim. Pertenceu a doçaria dos conventos, ofertado nos outeiros e nas festas de recebimento nas grades nos abadessados portugueses no século XVIII".


                                                                                  

                           RECEITA DE ALFENIM
                                                                                                                                                                                                                   
"Desde a madrugada estava acordada, mexendo a calda de açúcar, acrescentando-lhe dedal de vinagre da receita. Agora os alfenins, já prontos, secavam em seu tabuleiro, no parapeito da janela da cozinha. Fui ver aquelas cândidas figurinhas: lírios de pétalas frágeis, pombinhos unidos pelo bico, corações entrelaçados.... Loucos por doces, João sentava num tamborete ao lado do fogão e ajudava a fazer o puxa-puxa. Os fios brancos se esticavam entre suas mãos, de uma palma a outra - clara sanfona.  Ele mesmo ficava com cheiro de calda queimada"!
                                 ( Heloneida Studart no livro "O pardal é um pássaro azul!")                                    
                          INGREDIENTES 


5 kilos de açúcar

                                          1 litro de água

                      1 colher de café de clara em neve

                                          1 colher de chá de limão


                                   MODO DE FAZER
                                      
                             Primeira Etapa: Calda Base

Misturar bem o açúcar, a água e a clara. Levar ao fogo sem mexer e quando começar a ferver retirar a espuma para limpar a calda. Acrescentar o limão, ferver mais um minuto, borrifar um pouco de água pela superfície da calda, desligar o fogo e reservar.
                                          
                   Segunda Etapa: Testar o Ponto de Moldagem

Quando esfriar, retirar a crosta de açúcar que se formou na superfície da calda. Em seguida, vai tirando porções de calda aos poucos e levando ao fogo para dar o ponto de moldagem, que se testa na água fria. Estende-se a calda no mármore molhado, espera esfriar uns poucos segundos, solta as bordas com uma espátula.
                                          
                         Terceira Etapa: Puxa-Puxa


Quando a calda chegar ao ponto de temperatura possível para ser manuseada, ela é puxada e repuxada, até o ponto ideal para moldagem.  
                                         
                          Última Etapa: Moldar as Figuras

A última etapa é a moldagem das figuras, usando goma para refrescar a mão e evitar queimaduras. Nesta fase a imaginação e a habilidade para moldar é que fazem toda a diferença.                                                                            
                                                                                
                                                                                    
                                                                             
Projeto Resgate do Alfenim
 no Rio Grande do Norte


Os chefes Graça França e Ângelo Medeiros quando  estudantes de gastronomia na UNP, caíram em campo para fazer um trabalho de faculdade a fim de resgatar o delicioso doce feito de açúcar. O trabalho acabou se tornando um projeto sobre "a extinção e o resgate do alfenim”. Segundo Graça, que também é jornalista, foi preciso um árduo trabalho de garimpagem e pesquisa in loco para saber por onde anda o alfenim no estado. A dupla tentou trazer o doce novamente às vitrines natalenses, mas os problemas práticos de fornecimento não deixaram a coisa ir pra frente. Mesmo assim o projeto repercutiu fora do estado, com a participação dos dois no "Mesa Tendências" um Congresso Internacional de Gastronomia organizado pelo SENAC/SP e a revista Prazeres da mesa. 

                                                                                                                                                            
                            Alfenins de Dona Terezinha - Assu - RN


Na fase de pesquisa do projeto, Graça localizou na cidade de Assu, a única doceira da cidade ainda em plena atividade no ramo. Dona Terezinha ou Tetê dos alfenins ainda trabalha  preservando a receita original, utilizando polvilho nas mãos, na hora da modelagem. Faz isso desde criança. Sua produção é toda caseira, que ela comanda junto às mulheres da família. Ultimamente Terezinha produz apenas sob encomenda, por ocasiões de quermesses, festas juninas e eventos religiosos no interior do estado. Seus alfenins podem ser encontrados em Natal durante a Festa do Boi.


                                            Enviado ao You tube por  diegocinaco7 em 16/12/2010

Vídeo sobre a produção do Alfenim na cidade do Assu-RN, durante a realização do projeto para o resgate do doce no estado.

FONTES:                      

  • Gilberto Freyre - "Açúcar, uma sociologia do doce com receitas de bolos e doces    do Brasil"
  • Luis da Câmara Cascudo -"Superstição no Brasil- Cap. Doces de Tabuleiro".
  • Maria Marluce Gomes -"História da gastronomia do Rio Grande do Norte"
  • Jornal Tribuna do Norte-Natal/RN -Caderno Fim de Semana -Matéria super especial sobre sabores em extinção "Ausentes na Mesa"
  • Diário de Natal -Muito-Edição de Domingo:Gastronomia: Sabor doce e delicado, por Jussara Freire.
  • Graça França e Ângelo Medeiros -Projeto resgate do Alfenim no RN  
FOTOS: Imagens Google 
                 Jornal Tribuna do Norte 
                 Jornal Diário de Natal 
                 Arquivos do   Projeto de Resgate do Alfenim  de 
                 Graça França e Ângelo Medeiros.







Nenhum comentário:

PELO DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA Se Guilherme de Almeida escreveu 'Raça', em 1925, uma obra literária “que tem como tema a gênese da na...