Mentira de Verdade
Eduardo Olympio, 15/09/2014
Tenho
um compadre que ama os netos. Claro, também ama os filhos. Sou
testemunha de que a recíproca, de ambas as situações, é verdadeira.
Mas,
com relação aos netos, a afeição é, de certa forma, mais visível. Na
idade em que estão, a mesma, em média, em que a nossa amizade começou,
eles cativam com as graças e os carinhos naturais da primeira infância.
Em
geral, os avós se orgulham da sua condição e, sempre que podem, falam
dos pequenos objetos dos seus amores e, às vezes, até dos respectivos
amiguinhos.
Ontem,
fui ao aniversário da sua netinha caçula. A criançada estava reunida em
torno das atrações. Os pais, tios e avós saboreavam o prazer da
conversa alegre, prática que a atualidade não soube como conservar,
salvo em eventos assim.
Depois dos cumprimentos e votos de felicidades, sentei-me junto do compadre para trocarmos palavras sem compromisso.
Compreensivelmente,
ele logo se lembrou da originalidade e da propriedade com que os miúdos
se comunicam. E narrou um caso em que essas características afloraram
nas palavras de uma menina de possíveis quatro anos de idade.
Seu
neto, então completando três, era fã incondicional do Homem-Aranha,
esse super-heroi humano e tão popular, de absoluto sucesso nas telas,
que veio ao mundo em quadrinhos, na década de 60, e, portanto, foi
personagem nas leituras passadas de muitos avós de hoje.
O
petiz escolhera como tema da festinha esse ídolo. O avô soube disso,
mas não deixou transparecer que tomara ciência da seleção feita.
Entretanto, idealizou que o herói entrasse em cena durante a festa e operou neste sentido.
Sem
ninguém, além dele, saber do plano, pesquisou e contratou um artista
que fazia a criatura que, por acidente radioativo com uma aranha que lhe
picara, sofreu mutações e ganhou poderes aracnídeos.
No
dia da festa, em área externa à casa de lazer da família, com tudo
preparado, o avô do aniversariante reúne a meninada e aponta na direção
da caixa d’água:
- Olhem quem está ali!
Para
o espanto de todos, era o Homem-Aranha. O tema musical começa a ser
ouvido em alto e bom som. Alegria e excitação incontidas!
O
acrobata, com grande habilidade, põe-se a realizar os saltos e
escaladas típicos do original e a galerinha solta gritos, palmas e
risos.
Um delírio!
Mas, surpreendentemente, a pequenita de prováveis quatro anos mostra certo medo e se agarra às pernas da mãe.
Contou-me
o compadre que notou o desconforto da menininha e a tentativa da mãe em
melhorar a isolada situação, ao se chegar a ela e dizer:
- Querida, não se assuste, o Homem-Aranha que você está vendo é de mentira!
E logo, ouviu, uma vozinha sumida e chorosa dizer:
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