REMINISCÊNCIAS DA RELIGIÃO:
BISPO DE OLINDA VISITA A PARÓQUIA DO ASSÚ
No período de 15 a 23 de outubro 1839 o 18º Bispo de Olinda, Dom Frei João da Purificação Marques Perdigão (atuação de 1829-1864) visita o Assú e faz relatório:
“... Chegamos à
Vila do Assú pelas 7 horas, vindo ao meu encontro alguns cavaleiros,
precedidos do pároco, que já pela manhã tinha vindo ao meu encontro, e
de quem recebi mui boas notícias a cerca do seu comportamento, gozando
eu complacência a tal respeito por ter sido por mim ordenado de
presbítero. Desde o princípio da vila fui conduzindo à Matriz debaixo do
pálio, acompanhando-me considerável número de povo. Entrando na Matriz
cantou-se o Te Deum por dois seculares, e posteriormente à oração diante
do Santíssimo Sacramento, fui hospedado pelo pároco com decência,
passando a despedir os que me acompanhavam, depois de lhes dar a mão a
beijar, e lhes significar o fim de minha visita. Também foi ao meu
encontro o padre Baylon (assuense Padre Francisco Teodósio de Seixas
Baylon), professor de gramática latina e por mim ordenado de presbítero,
que se tem conduzido dignamente, ouvindo eu dizer que desde a mais
tenra idade jamais experimentou os efeitos provenientes de irregular
conduta.
Dia 16. Despachei alguns requerimentos.
Dia 17. pelas
10 horas fui à Matriz conduzido debaixo do pálio, e abri a visita,
praticadas as cerimônias do costume, cujo ofício foi cantado. O
sacrário, a custódia, a pia batismal, os paramentos e mais utensílios
estão decentes. A igreja está muito suja por causa da grande inundação
de morcegos, que no tempo de inverno ser acoutam dentro. Mas por que a
capela mor está decente, consenti que ali existisse o Santíssimo
Sacramento, concebendo esperança de se reparar a igreja, de maneira que
não seja mais ocupada por morcegos.
Dia 18.
Examinei sinodalmente o padre Manoel Januário com os vigários de Buique e
o desta freguesia, concedendo-lhe licença para confessar um e outro
sexo por espaço de 6 meses, no fim dos quais deve examinar-se com o
Visitador (o Visitador era o Padre Francisco de Brito Guerra) desta
província, antes que parta para o Rio de Janeiro na qualidade de
Senador, e cujo exame deve ser-me apresentado para lhe deferir para o
futuro. De tarde crismei mais de 100 pessoas, assistindo à prática mais
300. Este ato foi celebrado fora da porta da matriz por causa do mau
cheiro dos morcegos, ficando as mulheres dentro da igreja, por que o
campo existia mui quente, por causa da ardência do sol. Nesta freguesia,
como em outras, tem recorrido a mim muitos pais de família para que eu
obrigue a casar com suas filhas os moços, que delas tem abusado com
promessa de casamento, fazendo-lhes vez por esta ocasião quais deviam
ter sido os seus deveres, e como se deviam conduzir segundo as leis
existentes. Neste dia compareceu o vigário encomendado dos Angicos (era o
padre Manoel Antonio dos Santos Moraes Pereira Leitão – 1836 a 1838)
para me visitar, e nesta ocasião fui ciente de que ele é brasileiro
adotivo, quando natural de Lisboa.
Dia 19. Foram
por mim convocadas as principais pessoas desta vila para lhes fazer ver a
urgente necessidade de repararem as ruínas da matriz, e prestando-se
todas a concorrer, e assinando cada um sua esmola, montaram as quantias à
soma de 700$ réis, inclusa a minha esmola de 50$ réis que logo
entreguei. No mesmo ato compareceu o novo tesoureiro dos bens da matriz
nomeado pelo juiz de direito, e foram nomeados para administradores da
obra o coronel Wanderley (Coronel Manoel Lins Wanderley – 1804/1877) e o
juiz de direito Bezerra, homens pobres e honrados. O vigário da
freguesia deu 100$ réis, e mandei suplicar a outras pessoas as suas
assinaturas, acreditando que depois deste ato se principiará a dita
obra, outrora malograda. De tarde crismei quase 300 pessoas, assistindo à
pratica mais de 400.
Dia 20. Ouvi
missa na matriz, cujo padroeiro é São João Batista, e depois
compareceram algumas pessoas, prestando assinatura para a obra em
projeto. Neste dia me visitou o vigário de Santana do Matos (o vigário
de Santana do Matos, em 1839, era o padre João Teotônio de Sousa e
Silva, de 1822 a 71, colado), 10 léguas distante desta vila. De tarde
crismei quase 500 pessoas, assistindo à prática maior número. Por
motivos atendíveis tenho principiado a crismar pelas 6 horas da tarde,
finalizando tais atos, quando havia maior concorrência de povo, pela
meia noite, e uma hora com a melhor ordem e atenção, que prestavam às
práticas ordinariamente pelo tempo de uma hora.
Neste dia concedi uma dispensa de cunhados por motivos urgentes.
Dia 21. Fui
passar o dia em casa do tenente coronel Fonseca, 2 léguas distante desta
vila, onde crismei quase 100 pessoas, pelas 6 horas da tarde, antes de
regressar para a vila.
Dia 22. Crismei
particularmente algumas pessoas que vieram da distância d 8 léguas, e
depois conferenciou comigo o vigário de Santana do Matos acerca de
vários objetos, respectivos à sua freguesia. Este pároco goza bom nome, e
me parece existir nele inteligência sob os seus deveres paroquiais.
Veio ter comigo um militar, suplicando-me nova nomeação de pároco para a
freguesia de Touros, visto que o proprietário existe presentemente em
Pernambuco por causa de moléstia. Como, porém o padre, que ficou fazendo
às vezes de vigário, não me tenha suplicado demissão, nem dele existia
queixa, não deferi a tal súplica. Concedi uma dispensa de cunhados a um
quase moribundo, amigado com uma cunhada, de quem tem alguns filhos,
atentos os motivos que me foram expostos por 3 pessoas de probidade,
sendo uma destas o vigário desta freguesia, à qual os agraciados
pertencem. Nesta freguesia como em outras tenho feito ver em minhas
práticas, que não existe faculdade para dispensar este 1º grau, para que
os cunhados se abstenham de suplicar tais dispensas, bem como não
poderem os filhos menores casar, sem licença de seus pais ou do
competente ministro, e sem serem proclamados, pois que os párocos me têm
asseverado como são vexados para por em prática os maus desígnios de
seus paroquianos a respeito. Concedi outra dispensa de cunhados,
concubinados e constituídos em iminente perigo de vida, ambos nascidos e
moradores desta freguesia, precedidos os depoimentos do costume em tais
casos.
Dia 23. Saí do Assú pelas 6 horas da manhã, acompanhado de alguns cavaleiros, pernoitando em Santa Quitéria.
Fonte: MARINHO,
Francisco Fernandes. O Rio Grande do
Norte Sob o olhar dos Bispos de Olinda. Natal/RN, 2006.
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