Por gurgelcarlos@outlook.com
poeta, produtor cultural
poeta, produtor cultural
Sempre é um lugar tão longe e inacessível. Sempre é quando, sem precipitação, ocupamos o tempo com palavras de ordem e um bom vinho. As noites, assim revestidas, ganham uma pequena e imperecível formosura. Peca, quem, ao se olhar no espelho, procura encontrar uma série de idiossincrasias onde personagens da cidade, transitam pelo centro, acompanhados de doses de ensolarada boemia e da rápida evolução da geração, que enfrentou pedras e impropérios. Naquela época a serenata pulsava como um raro e precioso folhetim. Quem não validasse sua existência, era sumariamente esquecido. O glamour de um evento cultural, absolutamente, se restringia ao espaço por onde desfilava seus sonhos e holofotes. Não, bem mais do que isso. Revelava-se nesses momentos, um apogeu de decifração. Esmiunçava-se as variadas formas humanas, tal qual no seio familiar. Como prova inconteste de tudo relacionado ao universo de uma cidade pacata, mas já esboçando-se como um pêndulo gravitacional de influências. Décadas são como pérolas pedidas. Décadas, são como a confirmação que o homem pode se manter ileso das suas contradições e ruínas. Décadas são como ávidos pássaros, rebuscando por sobre rotas, o sorriso perdido da humanidade. Décadas são tão afoitas, um simulacro de uma rara sinceridade. Décadas são como eternas pilastras, suportando o peso das suas catástrofes e sermões. Essa cidade que a gente vive, Natal, por diversos períodos, exibiu um glamour cultural invejável. Destilou entre seus simpatizantes uma euforia literária, pincéis e molduras, até hoje, impagáveis. Era comum, entre os aficionados, o testemunho que os mesmos endereçavam aos seus artistas preferidos, causando entre um diferenciado público, a febre de centenas de elogios e efusivas palmas. Naquela época, década de 50, a cidade se locomovia por sobre os trilhos que existia entre a Ribeira e o Tirol. Estava em curso uma evolução, logo após o final de um fratricida combate no planeta. Era a oportunidade que se tinha, para retomar uma produção de arte, que pudesse revelar novos valores, como capacidade de revitalizar-se. Assim, em curso, dava-se como certo, por sobre a sombra dos coqueiros emoldurando o litoral de Ponta Negra, tão virgem, nativo, bucólico, calmo, paradisíaco; essa aventura, esse desejo. Os paletós e suas gravatas. Chapéus em profusão. Bengalas e charutos. Daí, o aparecimento de um grupo, onde, dentre outros, pontificavam Dorian Gray Caldas e Newton Navarro. Formavam assim, uma dupla onde resplandecia o fruto da pura coragem, rebeldia tanta. Começava na cidade a cintilar, o desejo de artistas, que tinham um contraponto sem dúvida, a tudo que estivesse relacionado ao marasmo. Era uma juvenil força. Com todo ardor e fogo. Tipificando um novo e revelador gosto por uma refinada galeria poética/plástica. Aos poucos, foi-se formando na cidade, uma curiosidade por quem admirava essa expressão, fonte de tudo que destravava o óbvio reinante. Dorian Gray, pontifica. Luta pela sua pintura. Pelos seus traços. Por todas as imagens, que aos poucos, vê, cria, desenha, refaz. Ele, como condutor das paisagens da sua terra, revela-se um verdadeiro artista. Distante do vazio, sem condutor, da passagem por onde o bonde e seus habitantes, cortejam. Procura-se por quem procura pelas cores pintadas do sol, de uma cidade litorânea nordestina. Procura-se dia e noite, por quem escolheu seus pincéis e telas, como se fosse um mensageiro das nuvens e das dunas da sua cidade. Casarios, pescadores, seus transeuntes e uma infinidade de outros resplandecentes componentes que se inserem na sua obra. Pura criação de um condutor do fio que liga a imaginação com a realidade desbravadora. Procura-se por quem , o tempo todo, foi mestre e um intransigente defensor das nossas milhas e mares. Dos nossos morros e faróis, dos nossos quintais e vales. Procura-se, sem parar, por esse homem. Como uma missão. Onde ele está? Por que será tão difícil encontrá-lo? Por que será tão difícil ser revelado? Por que será tão difícil não percebê-lo na próxima esquina? Ou naquele litoral por onde passeia a saudade e a lembrança de uma realidade dedicada a celebração da lua, e das suas insuspeitas amantes? Essa cidade resfolega por quem dela, guia, sobre o descaso para com os seus arquétipos das cores. Daqueles condutores que redesenham sóis e enseadas, como se fora a sua própria criação, o que está lá, na natureza. Como se, não pudéssemos usufruir, do resultado, uso, esplendor das mãos e mente por quem manipula tantas, milhares de bisnagas, pinceis, telas ao sol e céu, dessa litorânea nau. Ser arte e ser sol, para embelezar as praças e seus coqueiros. Ser arte e ser varal, para encantar seus habitantes e passageiros. Ser arte e ser pontal, para se aventurar por sobre os corações anônimos e desconhecidos do povo, da gente do seu lugar. Velejar como comandante lúdico e lúcido das suas ruas e luas, tão belas, como inesquecíveis jornadas noturnas, vespertinas. Então celebremos esse valoroso artista. Aplaudindo sua coerência. Festejando sua imensa aquarela, espalhando amor e beleza. Celebremos seu vigor. Sua incansável luz. Sua indômita paixão pela Arte. Tenaz. Pintor incansável da beleza dos rios, casarios da sua terra. Celebremos pois, um cidadão imortal, como um companheiro, mensageiro, defensor de tantas e tantas relíquias que fazem parte da geografia do seu povo. Que Dorian Gray, sempre nos apazigue. Com suas cores, cronicas, poesias, apontamentos, pensamentos. Pois que sua obra seja eterna assim como seus passos de criança. Precioso ser. Entre o insubstituível marco da cidade, até a beira de uma praia repleta de seus pescadores, moradores, rendendo honras ao seu filho, ilustre e bendito. Tal como suas telas. Tal como seu verbo. Como sua pessoa: encontro do bom, com tudo que nos faz bem.
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