JORNAL DO SÉCULO DEZENOVE
JORNAL CORREIO DO ASSÚ
O primeiro número do jornal Correio do Assú – periódico político, moral e noticioso sob a responsabilidade do redator João Carlos Wanderley circulou no dia 07 de setembro de 1873.
O primeiro número trouxe, além do editorial que transcrevemos abaixo, notícias sobre o aniversário da Independência Nacional; Missão dos capuchinhos em Mossoró; Circulação de notas falsas em Mossoró; publicação do romance “Mistérios de um homem rico” - de Dr. Luiz Carlos Lins Wanderley; a Casa de Caridade do Assú; o início das obras do lançamento do fio elétrico submarino entre Brasil e a Europa; artigo sobre a maçonaria; publicações pagas e ainda o seguinte anuncio: "ALUGA-SE uma criada livre ou escrava, para o serviço ordinário de uma casa de família. Nesta typografia se dirá quem a pretende."
A tipografia do Correio do Assú estava localizada na Rua Nova, Travessa da Rua da Cadeia. Tinha como impressor o senhor José Rodrigues da Silva.
Vejamos o seu editorial. Que bela peça jornalística:
CORREIO DO ASSÚ - Ao Assuense substitui hoje o Correio do Assú.
O prelo é novo, o tipo outro, o formato diferente; mas no programa é o mesmo:
Adoração à Deus, como verdadeiro católico; amor à pátria, como leal cidadão; dedicação à causa da liberdade, como decidido liberal; tal foi a tríplice divisa Assuense; tal será a do Correio do Assú.
Não há, pois, diferença na ideia pela somente adoção de um nome.
O crisma de hoje não nos é mais simpático que o batismo de ontem; uma circunstância, porém, toda particular e que só a nós diz respeito, fez-nos preferir o título com que hoje reaparecemos na galeria do jornalismo.
O Assuense, agora, pertence a história do passado, tendo perfeito o seu ciclo com o número 286; cumpre pois indagar se ele foi fiel ao seu programa; se foi coerente em suas ideias, se cumpriu a sua missão, ou se alguma vez saltou fora do trilho em que devera marchar.
Não nos acabrunham os erros, os defeitos, os desvios, que por ventura possam ser apontados no Assuense, em sua rotação de 6 anos; não nos acabrunham, sim, por que fica-nos essa tranquilidade que resulta da consciência que temos de haver obrado sempre da boa fé e com boa intenção.
Em sua difícil peregrinação, o Assuense nunca tomou voos de águia, porque rasteiro foi o seu moto; esforçou-se porém sempre, e com todo empenho e boa vontade, para não se deixar ficar atrás do movimento geral.
Nas grandes questões, que neste ultimo quinquênio se suscitaram no país, o Assuense tomou sempre parte mais ativa, emitindo com sua meia palavra a sua fraca opinião, marchando de acordo com o seu programa e com os ditames de sua consciência.
Na questão do elemento servil, foi em favor da liberdade, porque era liberal; na questão da reforma eleitoral, pugnou pela eleição direta, porque ai havia uma vontade mais decidida contra o poder pessoal, e uma passagem de menos para os abusos da autoridade; e neste último reencontro, entre o jesuitismo e a maçonaria, pronunciou-se em favor desta porque via ali a prática de uma virtude austera; enquanto ali via a exibição de uma ganância torpe, ou nefanda especulação.
Além destas, outras questões houveram em que o Assuense apareceu sempre atencioso para com as ideias contrárias, sempre coerente com os seus princípios.
Fez oposição decidida, mas sempre razoável e honesta, a algumas administrações, que incorreram na pena de graves censuras; e nunca desvirtuou atos que trouxessem o cunho da justiça e do direito, partissem eles de onde partissem.
Acusou também autoridades, pelos seus excessos e arbitrariedades; acusou juízes, pela parcialidade e injustiça de suas decisões; e nunca deixou de tomar à peito a causa dos oprimidos.
Fez ainda mais: uma ou outra vez foi obrigado a tocar o diapasão do personalismo, mas nunca o fez sem a mais dolorosa contrariedade, tendo sempre em mira moralizar e não maltratar.
E não haveria tropeços nesta marcha, sombras neste quadro, senões nesta pratica? Sim, houveram, provavelmente houveram, e nem há que admirar. “A cabeça maus segura lá uma vez tonteia.” Já o dissemos; o animo mais forte lá uma vez se acobarda; a vontade mais robusta lá uma vez se amolga; além de que, o sol também tem manchas, e o Assuense seria um impenitente vão, ou um farsola ridículo, se quisesse arrogar a si um privilégio que a ninguém é concedido; o da inerrância.
Só uma cousa protestamos e vem a ser: que nunca foi nosso propósito ferir susceptibilidades de quem quer que fosse.
Sim; a nossa intenção foi sempre boa, e o nosso mais fervoroso desejo foi sempre edificar, não demolir.
As questões locais criaram-nos desafetos; e bem era isto de esperar; se formos, porém, todos razoáveis e cordatos, havemos reconhecer que o Assuense tinha um circulo a fazer; e que aquele que imprudentemente se lhe atravessasse adiante, corria o risco de ficar esmagado.
O mesmo trilho percorrerá o Correio do Assú, para cuja circunvolução pedimos o auxílio de todos os bons liberais da província.
Atravessamos uma quadra difícil e excepcional; cumpre pois que todos se instruam , que todos saibam o que vai pelo mundo político, para se comportarem como bons cidadãos, em ocasiões precisas.
“A imprensa é a artilharia do pensamento” já o disse alguém, e é também o farol do espírito moderno.
Pela imprensa revelamos a nossa existência política; e bem triste cousa seria, si, a par daquele que escreve, não estivesse aquele que lê.
A imprensa é ainda o mais seguro veículo da queixa oportuna, da censura justa, da acusação fundada.
Cada cidadão que, podendo deixa de assinar o jornal que advoga suas ideias, e que pugna pelos seus direitos, comete uma extorsão, ou pelo menos um descuido imperdoável para consigo, e para com o seu partido; para consigo por que se deixa ficar nas trevas da ignorância; para com o seu partido, por que lhe nega a existência e auxílio de mais um dos seus adeptos.
A nossa senha política receberemos do “Liberal” que é o órgão principal do partido a que pertencemos, e que se publica na Capital desta província, sob a direção dos nossos chefes; e com fidelidade e exatidão transmitiremos a mesma senha aos nossos leitores, formando assim uma cadeia de boa harmonia, onde não haja nenhuma solução de continuidade.
É nosso desejo, pois, que se estabeleça uma comunicação direta entre o Correio do Assú e os liberais da província, máxime do centro; e é por isto que pedimos as suas assinaturas para auxílio da nossa empresa, que não poderá sustentar-se sem o concurso generoso de todos.
Está finalmente, explicado o nosso pensamento; está patente a nossa vontade, e indicado o caminho que havemos seguir; cumpre agora que concorram todos com igual empenho para o bom êxito e legítimo triunfo das nossas ideias.
Fonte: Marcas Que Se Foram - Livro inédito de Ivan Pinheiro.
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