terça-feira, 2 de maio de 2017

Em quais pontos a reforma da Previdência mexe com servidores. E em quais deixa tudo como está

BSPF     -     

Texto em discussão na Câmara define idade mínima obrigatória para funcionários públicos e pode impor transição dura para quem assumiu cargo antes de 2003. Policiais e professores conseguiram manter regimes especiais e militares ficaram de fora.
Quando anunciou sua intenção em reformar a Previdência, em julho de 2016, o presidente Michel Temer cogitava criar um regime único de aposentadorias, que englobasse os servidores públicos e os trabalhadores do regime geral, vinculados ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
 A iniciativa chamou a atenção de quem defendia um tratamento equilibrado do governo em relação aos dois universos: quem trabalha no setor público e quem trabalha para a iniciativa privada. À época, o Palácio do Planalto havia acabado de apoiar a aprovação de reajustes para diversas categorias do funcionalismo, ao custo de R$ 69 bilhões até 2018, em plena recessão e alta do desemprego — e  uma semana depois de defender o congelamento dos gastos públicos por 20 anos.
 A proposta de emenda à Constituição para reformar a Previdência foi enviada em dezembro de 2016 à Câmara com algumas regras na direção de unificar a aposentadoria dos servidores com os dos trabalhadores vinculados ao INSS. A principal delas é o estabelecimento de uma mesma idade mínima obrigatória de aposentadoria para os dois sistemas — na versão atual do texto, de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres.
Ao longo de cinco meses de tramitação, algumas mudanças propostas sobre o regime de aposentadoria dos servidores foram suavizadas e outras, endurecidas. O texto deve ser votado em uma comissão especial da Câmara até o dia 3 de maio. Depois segue para o plenário da Casa, e ainda precisará ser votado pelo Senado.
Veja em que aspectos o texto da reforma da Previdência em discussão na Câmara mexe nas aposentadorias dos servidores e em quais ele não altera as regras.
Regra dura para servidores mais antigos 
Servidores que ingressaram no serviço público antes de 2003 tinham direito a dois benefícios na hora de se aposentar: integralidade (benefício igual ao valor do último salário) e paridade (benefício reajustado nos mesmos percentuais dos aumentos salariais concedidos ao pessoal da ativa). O relator da reforma da Previdência, deputado Arthur Maia (PPS-BA), propõe que esses servidores sejam obrigados a se aposentar pela idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres caso queiram manter o direito à integralidade e à paridade. A implementação da regra seria imediata, sem período de transição. A pressão dos servidores contrários a essa medida é grande e há chances de ela ser excluída do texto.
Aumento da idade mínima para todos 
Hoje, servidores podem se aposentar por tempo de contribuição (aos 60 anos de idade e 35 de contribuição para homens e 55 anos de idade e 30 de contribuição para mulheres), se tiverem no mínimo 10 anos de serviço público. Eles também podem se aposentar por idade, com 65 anos para homens e 60 para mulheres, com no mínimo 10 anos de serviço público. A proposta em discussão acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição e exige a idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres que desejam se aposentar — as mesmas idades que serão exigidas no regime geral do INSS.
Limites a quem acumula aposentadoria e pensão
 Hoje é permitido o acúmulo de pensão com aposentadorias. Uma aposentada servidora, por exemplo, que tenha sido casada com um servidor público já falecido, acumula sua aposentadoria e a pensão relativa ao seu marido. Se o texto for aprovado, o acúmulo será permitido somente até o valor de dois salários mínimos — R$ 1.874, em valores atuais.
Policiais conseguiram reduzir idade mínima
 No atual sistema, não há idade mínima exigida para um policial se aposentar. Homens têm direito ao benefício pelo valor integral após 30 anos de contribuição e 20 anos de atividade e as mulheres, 25 anos de contribuição e 15 anos de atividade. O texto fixa a idade mínima de 55 anos para se aposentar. A versão inicial da reforma pretendia equiparar a idade mínima dos policiais aos dos demais servidores e trabalhadores — nos termos atuais, 65 anos para homens e 62 para mulheres —, mas o relator concordou em suavizar a exigência.
Professores terão idade mínima de 60 anos 
Professores da educação básica têm hoje direito a aposentadoria especial, por idade ou por tempo de contribuição. Na aposentadoria por idade, homens podem requisitá-la aos 55 anos e as mulheres, aos 50. Na por tempo de contribuição, homens podem fazê-lo após 30 anos de atividade e as mulheres, 25. O texto acaba com a modalidade por tempo de contribuição e estabelece a idade mínima de 60 anos para se aposentar, com pelo menos 25 anos de contribuição, para ambos os sexos. Essa regra vale tanto para os professores do setor público como para os do setor privado.
Servidores estaduais e municipais serão afetados depois
 As regras do texto da reforma da Previdência não afetarão imediatamente os servidores estaduais e os servidores municipais filiados a regimes públicos de aposentadoria, o que compreende cerca de 5 milhões de pessoas. Em algumas cidades, os servidores são vinculados ao INSS — são cerca de 1,5 milhão nesse regime. A proposta em discussão na Câmara estabelece que os Estados e municípios terão seis meses, após o início da vigência da emenda constitucional — se aprovada —, para reformar seus respectivos regimes de Previdência. Os Estados e municípios que não reformarem seus sistemas públicos de Previdência no prazo de seis meses serão automaticamente submetidos às regras do texto aprovado pelo Congresso.
Militares não entraram na reforma
 A Previdência dos militares das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) faz parte do regime próprio dos servidores da União, mas tem outras regras. Diferentemente dos trabalhadores vinculados ao INSS e dos servidores públicos civis, os militares não têm parte do seu salário recolhido para o sistema de Previdência. A União paga integralmente a aposentadoria de quem trabalhou no Exército, na Marinha e na Aeronáutica, como se fosse uma despesa de pessoal. Eles contribuem somente para garantir parte do pagamento de pensões a que seus familiares têm direito. Os militares começam a receber aposentadoria quando entram para a reserva, após 30 anos de contribuição. Não há idade mínima. Inicialmente, o governo cogitou incluir os militares na reforma, mas recuou após pressão das Forças Armadas e do ministro da Defesa, Raul Jungmann. Agora, a promessa do Palácio do Planalto é enviar uma proposta com novas regras para as aposentadorias dos militares após a aprovação da reforma da Previdência.
Mais equilíbrio, com alguns privilégios mantidos
 O economista Pedro Nery, consultor legislativo do Senado e especialista em Previdência, afirmou ao Nexo que o texto da reforma da Previdência tem alguns pontos que trazem maior equilíbrio entre o sistema de aposentadoria dos servidores e o do INSS. Um deles é o aumento da idade mínima exigida para servidores se aposentarem, equiparando-a com a do regime geral. “Hoje vivemos uma situação paradoxal em que uma servidora pode se aposentar bem antes que sua empregada”, diz. Ele elogia a iniciativa do relator da reforma da Previdência de exigir que os servidores que ingressaram no poder público até 2003 tenham que se aposentar pela idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres caso queiram manter o direito ao benefício integral e à paridade. Contudo, Nery afirma que a reforma erra ao não atingir os servidores que já se aposentaram com o que ele chama de “privilégios” e ganham, hoje, benefícios incompatíveis com o valor que contribuíram para o sistema.
“Permanece um pensamento conservador em relação a quem ‘já chegou a outra margem do rio’: o aumento da contribuição dos inativos e o fim da paridade não estão no radar, e afetariam um grupo que foi pesadamente subsidiado pelo contribuinte, além de ajudarem na crise dos Estados” Pedro Nery Economista e consultor legislativo do Senado.
Desigualdade entre os regimes 
Diversos indicadores apontam assimetrias entre os sistemas de aposentadoria dos servidores públicos e o do INSS. Os pesquisadores Marcelo Medeiros e Pedro Ferreira de Souza, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão vinculado ao governo federal , realizaram um estudo sobre a concentração de renda nos regimes de aposentadoria, com dados de 2008 e 2009, para elaborar um índice de Gini — que mede a desigualdade de renda — em cada um deles. Esse índice vai de 0 a 1 — quando mais próximo de 1, mais desigual. Na época, o índice de Gini geral da renda do trabalho do país era de 0,563. Segundo cálculo dos pesquisadores, reportado pelo jornal “Valor”, o índice de Gini no sistema do INSS era de 0,474 — ou seja, menos desigual que o índice geral do país, atuando como redutor da concentração de renda.
Já o índice do sistema de previdência dos servidores da União era de 0,822 — reforçava, e muito, a desigualdade do país ao dar aposentadorias de valor muito alto para alguns e benefícios reduzidos para muitos outros. O valor do déficit por benefício — na prática, quanto a União tem de “pagar” para cobrir o rombo — também varia muito entre os sistemas. Em 2015, o regime geral, do INSS, registrou déficit de R$ 85,8 bilhões, para 28,3 milhões de benefícios (aposentadorias e pensões).
Para cada benefício, a União teve que adicionar R$ 3 mil no ano para fechar a conta. No sistema dos servidores públicos da União, o déficit no mesmo ano foi de R$ 35,5 bilhões, para 683 mil benefícios. Ou seja, a União pagou R$ 52 mil extras para cada benefício no ano, com o objetivo de fechar a conta do sistema. A situação é pior no regime dos militares. O buraco foi de R$ 88 mil por benefício em 2015 — resultado do déficit de R$ 32,5 bilhões no ano para 370 mil aposentadorias e pensões.

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