quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

ESTÓRIAS DE CORDELISTAS

Nenhum texto alternativo automático disponível.


O afamado cantador de viola, poeta cordelista chamado Chico Traíra (Francisco Agripino de Alcanis era o seu nome. Nasceu n Sítio Pau de Jucá, município de Ipanguaçu, porém adotara o Assu como sua terra), figura que eu tive o privilegio de ter convivido na cidade de Assu na década de oitenta. Ele apresentava um programa na Rádio Rural de Natal, Salvo engano, na década de setenta. Pois bem, cantando com outro célebre violeiro de nome Zé Cardoso, Traíra desafiou seu colega dizendo assim: 

Você aqui se pabula
Porque tá na sua terra,
Mas se for ao meu Açu
Lá você não me faz guerra.

Cardoso pegou na deixa, respondendo a Traíra (traíra é nome de peixe de água doce muito comum nos rios, açudes e lagoas) com a seguinte sextilha:

Se eu for na sua terra
No poço eu dou um mergulho,
Rebolo a minha tarrafa,
Pego você no embrulho,
Tiro o fato, escamo e asso
Pra acabar o seu orgulho.

Chico Traíra e Patativa (sem ser do Assaré) fizeram sucesso em Natal, alias em todo o Nordeste brasileiro com grande audiência através da Rádio Rural daquela capital potiguar. Pois bem, certo dia Zé Cardoso realizava uma cantoria com Domingos Tomaz (outro violeiro bastante conhecido), na casa de um amigo, em Natal. De repente chega Traíra e Patativa (patativa é nome de pássaro de canto melódico e suave). Domingos então saudou aqueles poetas repentistas, de versos populare, dizendo assim, no final de uma sextilha:

Veio a nossa cantoria
Uma dupla inteligente.

Zé Cardoso bom na viola e no repente, o saiu-se com os versos transcritos abaixo:

Traíra é bom no repente,
Patativa é na Viola.
Mas indo na minha terra
Vão sofrer a minha escola:
Traíra vem pro anzol,
Patativa pra gaiola.

Patativa e Chico Traíra viajando em cima da carroceria de um caminhão, de Natal com destino a cidade de Macau, interior potiguar, disse pro amigo Chico, a seguinte frase: "Traíra, eu acho que a nossa viagem não vai ser muito sublime." - Em razão da trepidante estrada esburacada. Chico não se deu por calada, versejando no melhor de sua criatividade poética:

Se o amigo não está
Achando a viagem boa
Você é pássaro, eu sou peixe
Eu mergulho e você voa
Você volta para o ninho
E eu volto à minha lagoa.

De outra feita, na cidade de Areia Branca (RN) cantando com outro poeta violeiro chamado Manoel Calixto, cantoria realizada na casa de um amigo, Traíra fora desafiado por Calixto, com a seguinte sextilha:

Aviso ao dono da casa
Que não vá fazer asneira
Tenha cuidado em Traíra
Que ele tem uma coceira
Se não quiser que ela pegue
De manhã queime a cadeira.

Chico retrucou:

Você é que tem coceira
Dessas que rebenta a calça
Está tomando por dia
Dezoito banhos de salsa
Quando a coceira se dana
Num dia acaba uma calça.

Certa vez, o mestre Câmara Cascudo, "o escritor potiguar mais conhecido no mundo, recebia homenagem da UFRN. Chico Traíra presente aquela solenidade, viola já afinada, deu o seu recado, num repente, enaltecendo Cascudo::

Eis o doutor Cascudinho.
Que valoroso tesouro!
Lá no sertão também tem,
Cascudo, aranha e besouro.
Os de lá não valem nada.
Mas este aqui vale ouro.

(Por Fernando Caldas)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

  UMA VEZ Por Virgínia Victorino (1898/ 1967) Ama-se uma vez só. Mais de um amor de nada serve e nada o justifica. Um só amor absolve, santi...