No instante em que presenciamos o espetáculo das águas do Rio Piranhas (de barreira a barreira, no dizer popular), Barragem do Assu, Açude do Mendubim e do Pataxó sangrando, deparamos também com as imagens dramáticas dos retirantes e desabrigados daquela região ribeirinha da várzea do Assu, agora castigado pela enxurrada que também destroi vilas, plantações e cidades. Um ano, dois, três, dez de seca, vem um ano de enxurrada. É assim o Nordeste brasileiro. E me faz lembrar o poeta matuto Renato Caldas que um dia, na sua aflição, escreveu o longo poema intitulado "Inxurrada Mardita", dizendo assim:
Seu moço, inda me alembro...
Me alembro cuma ninguém:
- O tempo véio num léva
Aquilo qui se quiz bem,
Nem hai dinheiro qui págue
Um amô qui a gente tem.
Faz muito tempo, seu môço,
Nós morava no sertão...
E a sêca véia danasca
Veio qui nem um ladrão:
Furtando os verde das fôia,
Rôbando ás águas do chão.
E, a sêca, qui levô tudo,
Qui quage acaba o sertão!
Trôve alegria, seu môço
Pru meu pobre coração...
E o marvado do inverno
Levô sem tê precisão.
Mecê num sabe o qui foi,
Eu vou dizê a mecê:
- Um dia de tardinzinha,
Ante do escurecê,
Tava na porta do rancho,
Pensando nem sei em quê?
Quando aparece na estrada,
Lá pras bandas do grotão,
Um bando de arritirante...
Seu môço, era um bandão!
E no mei daquela gente
Vinha a minha perdição.
Uma cabôca fermósa...
Tão bonita... cuma o que?!
Os óio, os cabelo dela,
Eram pretos de duê
E o resto daquele anjo,
Num tem quem possa dizê.
Apois bem: só pruque ela
Veio sê minha alegria,
Deus de inveja, de ciúme,
Mandô chuvê todo dia...
Inrolô um mêz chuvendo!
Quage a terra amolecia
Ficô logo tudo verde!
Logo. os riacho correu.
A cabôca foi simbora
com tudo que era seu
E ainda levô cum ela,
Argum pedacinho meu.
Levô foi tudo, seu môço:
A alegria do Sertão,
As notas daquela viola,
O batê do coração
Desse cabôco sarado
Nascido lá no Grotão.
É, cuma quem tem, seu môço,
Uma vasante aprantada...
Adespois, vem uma enchente,
Leva tudo na inxurrada
- Apôis eu tinha nos peito,
Uma vasante aprantada.
Ah! inverno miserave,
Inverno véio ladrão!
Truvésse o verde das foia.
Truvésse as águas do chão...
Mas, carregô na inxurrada,
O meu ppbre coração.
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