segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

PAPAI NOEL


MONÓLOGO DO NATAL

Por Aldemar Paiva*

Não gosto de você Papai Noel.
Também não gosto desse seu papel
De vender ilusões a burguesia.
Se os garotos humildes da cidade,
Soubessem do seu ódio à humanidade.
Jogavam pedras nessa fantasia!

Você talvez nem se recorde mais.
Cresci depressa e me tornei rapaz,
Sem esquecer no entanto o que passou.
Fiz-lhe um bilhete pedindo um presente,
A noite inteira eu esperei contente,
Chegou o sol e você não chegou.

Dias depois, meu pobre pai cansado
Trousse um trenzinho velho, empoeirado,
Que me entregou com certa hesitação.
Fechou os olhos e balbuciou:
"É pra você... Papai Noel mandou..."
E se esquivou contendo a emoção.

Alegre e inocente nesse caso,
Pensei que meu bilhete com atraso
Chegara às suas mãos no fim do mês.
Limpei o trem, dei corda, ele partiu,
Deu muitas voltas, meu pai sorriu
E me abraçou pela última vez.

O resto só eu pude compreender
Quando cresci e comecei a ver
Todas as coisas com realidade.
Meu pai chegou um dia e disse, a medo:
"Onde é que está aquele seu brinquedo?
Eu vou trocar por outro na cidade".

Dei-lhe o trenzinho quase a soluçar,
E como quem não quer abandonar
Um mimo que lhe deu quem lhe quer bem,
Disse medroso: "Eu só quero ele...
Não quero outro brinquedo, quero aquele
E por favor, não vá trocar meu trem".

Meu pai calou-se e pelo rosto veio
Descendo um pranto que eu ainda creio,
Tão puro e santo, só Jesus chorou.
Bateu a porta com muito ruído,
Mamãe gritou, ele não deu ouvidos,
Saiu correndo e nunca mais voltou.

Você Papai Noel, me transformou
Num homem que a infância arruinou,
Sem pai e sem brinquedos. Afinal,
Dos seus presentes, não há um que sobre
Para a riqueza do menino pobre
Que sonha o ano inteiro com o Natal!

Meu pobre pai doente, mal vestido,
Para não me ver assim desiludido,
Comprou por qualquer preço uma ilusão:
Num gesto nobre, humano e decisivo,
Foi longe pra trazer um lenitivo,
Roubando o trem do filho do patrão.

Pensei que viajara. No entanto
Depois de grande, minha mãe, em pranto,
Contou-me que fora preso. E como réu,
Ninguém a absolvê-lo se atrevia,
Foi definhando, até que Deus um dia
Entrou na cela e libertou pro céu!

*Aldemar Paiva é jornalista, poeta, escritor, membro da Academia Pernambucana de Letras, animador cultural, radialista, apresentador do programa "Pernambuco Você é Meu", da Rádio Clube de Pernambuco. Paiva gozava da amizade com o poeta assuense Renato Caldas, a quem sempre visitava quando de passagem para. Paiva, sempre declama os poemas do velho poeta assuense, falecido em 1991, através daquela rádio da terra pernambucana.




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