Por Celso da Silveira, escritor assuense já falecido - texto escrito em 1987.
Júlio Soares foi poeta num tempo em que os poetas ou estavam tuberculosos ou eram boêmios inveterados, que se viciavam em bebidas para manter a convivência com o outro vício - a poesia.
Mas suas vertentes foram bem nascidas, numa casa onde o piano era uma presença constante e comandava o epírito familiar, sendo ele próprio um musicista reconhecido.
Há, em sua poesia, deixada em cadernos ou em jornais e, em maior número na memória dos seus familiares, dispersamente, inúmeros sonetos em que se auto-retrata invariavelmente maldizendo a sorte, depois de ter sido filho de rico industrial, ou refletindo a situação de alcoólatra a que chegou, depois de ser estudante no Rio de Janeiro num tempo em que ir à capital da República era uma condição de privilégio dos abastados. Há um soneto bem marcante dessa fase aguda em que todo o drama do viciado se vê reproduzido:
"Cinco horas, já se expande a passarada
Com o semblante de bêbado desperto
Acho a porta, ningém pela calçada...
A rua é triste assim como um deserto.
Quero beber. Não sei qual seja a estrada
Que me conduz ao botequim mais perto,
Sozinho traço o rumo da jornada
E parto, enfim, com o espírito liberto.
Paro no fim de uma deserta praça
Ouço de longe o buzinar de um carro...
Cresce-me o anseio de beber cachaça.
Entro num bar, gracejo, bebo, escarro,
Julgando ver a minha vida incerta
Na fumaça sutil do meu cigarro".
Em 1926 - Júlio Soares nasceu em 1898 e faleceu em 1954 - o poeta morava na rua do Catete, no Rio de Janeiro, como estudante, fazendo o curso comercial para um dia dirigir os negócios do pai, coronel José Soares Filgueira sobrinho, alto comerciante em Assu, comprador de algodão, cera de carnaúba, peles e couros, proprietário de terra e gados, com largo prestígio em política de então. Nessa época já fazia literatura, como atesta o escritor Aderbal de França, seu companheiro de "república", com quem dividia o cômodo na capital federal.
Sempre lendo e escrevendo, e cada vez estudando menos as disciplinas do curso, Júlio Soares voltou ao Assu e dali foi viver numa cidade cearense, aparentemente comportado em seus hábitos boêmios. Sem muita força de vontade, deixou-se de dominar, e outra vez em temporada assuense, Júlio Soares sóconhece poucas pessoas e é muito pouco conhecido. Retoma suas habilidades poéticas e escreve o seu CANTO DO CISNE - um soneto cujo terceto final é o seguinte:
"Chorando ou rindo, vou passando a esmo
E no vício morrendo lentamente
Fazendo assim o enterro de mim mesmo."
Júlio Soares, ressuscitado o seu passado de bebidas, violões, e abandonado, volta ao ceará e morre em Fortaleza.
Júlio Soares foi poeta num tempo em que os poetas ou estavam tuberculosos ou eram boêmios inveterados, que se viciavam em bebidas para manter a convivência com o outro vício - a poesia.
Mas suas vertentes foram bem nascidas, numa casa onde o piano era uma presença constante e comandava o epírito familiar, sendo ele próprio um musicista reconhecido.
Há, em sua poesia, deixada em cadernos ou em jornais e, em maior número na memória dos seus familiares, dispersamente, inúmeros sonetos em que se auto-retrata invariavelmente maldizendo a sorte, depois de ter sido filho de rico industrial, ou refletindo a situação de alcoólatra a que chegou, depois de ser estudante no Rio de Janeiro num tempo em que ir à capital da República era uma condição de privilégio dos abastados. Há um soneto bem marcante dessa fase aguda em que todo o drama do viciado se vê reproduzido:
"Cinco horas, já se expande a passarada
Com o semblante de bêbado desperto
Acho a porta, ningém pela calçada...
A rua é triste assim como um deserto.
Quero beber. Não sei qual seja a estrada
Que me conduz ao botequim mais perto,
Sozinho traço o rumo da jornada
E parto, enfim, com o espírito liberto.
Paro no fim de uma deserta praça
Ouço de longe o buzinar de um carro...
Cresce-me o anseio de beber cachaça.
Entro num bar, gracejo, bebo, escarro,
Julgando ver a minha vida incerta
Na fumaça sutil do meu cigarro".
Em 1926 - Júlio Soares nasceu em 1898 e faleceu em 1954 - o poeta morava na rua do Catete, no Rio de Janeiro, como estudante, fazendo o curso comercial para um dia dirigir os negócios do pai, coronel José Soares Filgueira sobrinho, alto comerciante em Assu, comprador de algodão, cera de carnaúba, peles e couros, proprietário de terra e gados, com largo prestígio em política de então. Nessa época já fazia literatura, como atesta o escritor Aderbal de França, seu companheiro de "república", com quem dividia o cômodo na capital federal.
Sempre lendo e escrevendo, e cada vez estudando menos as disciplinas do curso, Júlio Soares voltou ao Assu e dali foi viver numa cidade cearense, aparentemente comportado em seus hábitos boêmios. Sem muita força de vontade, deixou-se de dominar, e outra vez em temporada assuense, Júlio Soares sóconhece poucas pessoas e é muito pouco conhecido. Retoma suas habilidades poéticas e escreve o seu CANTO DO CISNE - um soneto cujo terceto final é o seguinte:
"Chorando ou rindo, vou passando a esmo
E no vício morrendo lentamente
Fazendo assim o enterro de mim mesmo."
Júlio Soares, ressuscitado o seu passado de bebidas, violões, e abandonado, volta ao ceará e morre em Fortaleza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário