sexta-feira, 30 de abril de 2010

'VIAJANDO O SERTÃO"

CÂMARA CASCUDO, Luis da. Viajando o Sertão . 3ª ed. Natal: Fundação José Augusto - CERN, 1984; por Mirella Farias


• Ementa:

"Viajando o Sertão" foi publicado em 1934 no formato de livro e também como uma série de crônicas no jornal "A República" de 31/05 a 22/07 de 1934. Precederam a primeira edição mais duas, uma em 1975 e outra, em 1984, decorrente da "I Semana de Estudos Cascudianos", promovida pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Livro composto por dezoito crônicas, que narram a viagem realizada por Luis da Câmara Cascudo, no período de 16 a 29 de maio de 1934, ao interior do Estado do Rio Grande do Norte. Cascudo faz esta viagem a convite do Interventor Federal Mário Câmara e ingressa na comitiva oficial composta por mais outras quatro personalidades ligadas a Educação, a Agricultura e Açudagem; Anfilóquio Câmara (Diretor geral do departamento de Educação), Antônio Soares Júnior (Prefeito de Mossoró), Alcides Franco (Chefe da segunda seção técnica do Serviço de Plantas Têxteis) e Oscar Guedes (inspetor do mesmo Serviço). Em 1934, Luis da Câmara Cascudo, ocupava o cargo de Chefe Provincial do Integralismo.
Segundo uma nota presente na edição de 1975, escrita por M. Rodrigues de Melo, o fato de Câmara Cascudo ser um integrante da comitiva oficial do Interventor Federal Mário Câmara, acabou por suscitar uma grande polêmica. A ala revolucionária do Integralismo não gostou nem um pouco, assim como, o grupo político que tinha por chefe o Deputado José Augusto Bezerra de Medeiros, segundo a nota, um "político apeado do poder pela revolução de 1930 julgando-se herdeiro natural da política do Seridó" e que por isto, não queria que "lhe escapassem as rédeas e a liderança da política do Estado." O Deputado levou publicamente a acusação de suborno (27 de abril de 1934), afirmando, que Luis da Câmara Cascudo teria recebido o " ‘pagamento de quatro contos e tantos mil réis’ " do governo do Estado, transformando-se em "orador das caravanas interventoriais". A nota apresenta a transcrição da acusação e da defesa.
Cascudo defende-se da acusação afirmando:
"(...) Tenho feito vários discursos em presença de chefes locais do Partido Popular e Povo, e desafio, de maneira formal, que qualquer um desses senhores afirme, sob sua assinatura, que me ouviu abordar qualquer tema que se referisse ao momento político atual. Se o tivesse feito, assumiria absolutamente toda e completa responsabilidade.
Chefe Provincial Integralista, miliciano convicto, considero os Partidos Políticos meras fórmulas desacreditadas e incapazes de uma renovação social. Não pertenço a nenhuma agremiação partidária e mantenho relações íntimas com vários próceres que não ignoram a retidão de minha atitude assumida publicamente a 14 de julho de 1933.
Aos ‘camisas – verdes’ de minha Província não dou explicações, porque eles me conhecem de perto. Aos políticos é desnecessária qualquer justificação em contrário às suas afirmações, porque ‘política é isso mesmo.’ (Ver "A República" de 04. 09. 1934.)"

31/05/34

"Viajando o Sertão (I)"

"Viajamos, da madrugada de 16 à manhã de 29 de maio, 1307 quilômetros: 837 de automóvel, 40 de auto-de-linha, 38 de trem, 30 de canoa, 2 de rebocador e 360 de hidroavião.
Esse cômputo é a expressão oficial e sisuda, mas não corresponde inteiramente à verdade. Andamos a pé, de cadeirinha, de macaquinho, dentro d’água, na lama (...), saltando de pau em pau (...), carregando maletas, levando companheiros no ombro, livrando os xiquexiques, galopando a cavalo, apostando velocidade nas retas areientas enquanto o Ford empacava, atolado."
"Falta anotar a fome, o frio das roupas molhadas, a fadiga das caminhadas, a mania obsequiosa do sertanejo oferecer-nos galinha e macarrão em vez de carne-de-sol e coalhada. Tudo se compensava, quando chegávamos aos povoados, às vilas e cidades embandeiradas e cheias de povo, assombrados com a ousadia dos ‘pracianos’."
"Minha curiosidade acendia-se ao contato dos temas prediletos. Os portões dos cemitérios, todos guardando reminiscências do barroco jesuítico (...); a jornada pelo rio Mossoró, noitinha, numa canoa balouçante, ao palor dum luar hesitante (...), vinte outros assuntos, perdem espaço para registo e saudade."
"(...) tipos, anedotas, casos, observações (...) a incrível espirituosidade das respostas sertanejas, são dignos de maior demora numa leve e breve série de registos."
[Termina afirmando]
"Por mim, não escreveria nada. Creio que não interessaria a ninguém saber se gostei ou não das terras que visitei. Mas pedidos foram muitos e em várias localidades. Acabei prometendo e as promessas, digam lá o que disserem, cumprem-se ..."

Assina desta forma:

L. da C. C.
02/06/1934

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