(Renato Caldas era um poeta potiguar que escrevia em linguagem genuinamente matuta. Além dos seus poemas irreverentes, amorosos, engraçados, produzia versos retratando as calamidades que Afetam (como hoje ainda), o Nordeste Brasileiro como, por exemplo, a seca maldita. Um dia, na sua angustia, escreveu esse bardo assuense (discípulode Catulo da Paixão Cearense), que o Brasil consagrou, conforme adiante:
MINHA DÔ
Meu patrão, mecê pergunta,
Pula vida do sertão?
Eu num sei cuma cumece!..:
Mecê, tarvez desconhece
Nossa dô, nossa afrição.
Proque é qui vós mecê,
Que ôvi minha dô falá?
Que que descasque a ferida,
Qui tenho narma iscundida
E véve sempre a sangrá?
Apois bem, vou lhe dizê,
Vou lhe contá meu patrão,
A história mais repetida,
Passada in todas as vida
Dos fio do meu sertão.
Vivemos naquelas terras,
Cuma outro bicho quarqué,
Nós só tem uma deferença,
Qui Deus dá pru recompensa:
A cumpanheira, a muié.
Além da nossa muié,
A nossa satisfação:
É uma noite inluarada,
Um prato bom de cuiaiáda
E um cusido de feijão
Mas, quando a sêca malina,
Se alasta pilo sertão...
Rio, cacimba secando,
Esturricando, lascando,
Tudo, tudo meu patrão!
O póbe de sertanejo,
Vê tudo seu se acabá.
Dia e noite nas estradas,
Vão passando as retiradas
Sem sabê onde escapá.
Quantas vez, nessa viage,
Num perde um fio, ou muié...
Quantas vez, pulas estradas,
Se encontra uma cruz infincada,
Sem sabê de quem é?
- Eu já sofri tudo isso!
Sofri mais qui outo quarqué.
- Sei que mecê acredita -
Pois vi, a fome mardita,
Sucumbí minha muié.
E, à sombra duma oiticica,
Pejada de fruta e frô:
Deixei uma cruz infincada,
Trez parmo abaixo, interrada,
Minha muié! Meu amô.
Patrão, a história é cumprida,
Mas, num posso aterminá...
Fui descascá a ferida,
Qui tenho n'arma escundida...
Deixe a dô apalacá.
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