Por Públio José, jornalista
Veio à luz o resultado de uma nova
pesquisa do IBGE. E com um dado intrigante. O que ressalta o número de famílias
constituídas por uma só pessoa, as famílias unipessoais no jargão do
órgão. Pessoas que vivem completamente isoladas, justificando essa atitude com a
afirmação de que preferem “uma vida mais tranqüila, sem muito barulho”. Outro
detalhe importante no trabalho do IBGE é que no Rio Grande do Norte a média das
famílias unipessoais na faixa etária dos 30 aos 39 anos está acima da média
nacional. No Brasil é de 14,4%, no Nordeste de 14,3% e aqui de 17,5%. O mais
interessante ainda é que na faixa etária imediatamente anterior – dos 20 aos 29
anos – a média potiguar (9,5%) está bem abaixo da média nacional (12.3%) e
nordestina (12,5%). É realmente intrigante como pessoas de faixas etárias tão
próximas, se distanciam tanto no caminhar do dia-a-dia. Umas constituem
famílias, vivem em comunidade.
Outras dão total primazia à solidão. Por quais motivos? Quais as razões que
levam as pessoas a se isolarem numa fase da vida de potencialidade tão
expressiva? Afinal, esse período dos 30 aos 39 nos distingue com grandes
realizações e uma capacidade enorme para enfrentar e vencer desafios. Porque,
então, essa renúncia voltada para o nada? De onde vem essa indiferença
direcionada ao próximo? Tal comportamento só impede o solitário de extrair os
benefícios de uma convivência mais rica da presença dos outros, mesmo que isso
represente riscos. Olhando para as diversas formas de organização humana, vemos
que tudo gira, se firma, se estrutura na pluralidade. No mínimo a partir de
dois. Exemplo: na política, um presidente de república nunca está só. Ele tem um
vice. Na Polícia, fora do âmbito dos pelotões, dos batalhões, existe a dupla de
investigadores – os parceiros das ruas.
Nos filmes policiais americanos, essa instituição fica bem patente. Lá tem
sempre um Robert em dupla com um Michael. E se você ampliar o olhar pela rotina
da vida verá sempre um ser humano ao lado de outro, por mais diferentes que
sejam os ramos de atividade. A existência da família é um dado sintomático da
necessidade que o ser humano tem de privilegiar a convivência em grupo. Então,
porque a decisão de viver só? Porque trafegar na contra-mão da existência,
rompendo a ordem natural da vida? E porque a incidência maior dessa escolha na
faixa dos 30 aos 39 anos? Será medo? Medo originado de traumas anteriores no
relacionamento familiar, profissional, conjugal? Medo de enfrentar as mesmas
dores, as mesmas decepções, as mesmas angústias de tempos anteriores? Receio de
dissabores, do fracasso? Em qual momento a vida se tornou um fardo tão pesado,
que mereça a renúncia das alegrias futuras?
Lembremo-nos que estas só vêm pelo enfrentamento de novos desafios. Será que
viver assim é viver? Trago à memória agora o exemplo de Jesus Cristo. Segundo a
Bíblia ninguém foi mais rejeitado e injustiçado do que ele. No entanto, foi um
grande fazedor de amigos. Apesar de conhecer como ninguém as deficiências, as
falsidades, as fraquezas dos homens, Jesus nunca se absteve de conviver em
comunhão com os outros. Estava sempre arrodeado, alegre, prestativo,
influenciando positivamente a vida das pessoas, sem esperar nada em troca. Ao
contrário, sendo um verdadeiro manancial de aconselhamento e consulta na difícil
arte de viver. Era agradável estar ao seu lado, para conhecer a receita do viver
bem. Com Jesus, sempre se tem o que ganhar, o que se agregar de positivo, de
frutífero à nossa rotina de vida. Jesus sempre valorizou a convivência. Já
imaginou se ele marcasse o repartir o pão e o vinho da Santa Ceia com o selo da
solidão?
Tem algum perigo na escolha desse caminho de se viver só, isolado? Tem. E muito.
O isolamento, na maioria das vezes, nos induz à prática do egoísmo, do
individualismo exacerbado, das esquisitices, da rabugice, do mau humor – e é o
caminho natural para se pisar o terreno da depressão. Quem vive só, com raras
exceções, está propenso a cultivar a aridez de sentimentos e a se transformar em
alguém que não se alegra mais com o sorriso de uma criança, nem sabe mais
encontrar satisfação nas coisas simples da vida. São resmungonas, pouco se
preocupam com os problemas alheios e o estabelecimento de uma rotina que gira em
torno de si passa a ser a grande realização a ser perseguida. A vida passa pelos
solitários, mas eles não adentram nos mistérios da existência, nem apalpam a
riqueza do convívio com os outros. Ser solitário é empreender um caminhar
contínuo em direção à tristeza e ao mundo do silêncio. Parece até boi indo para
o matadouro. Não sabe para onde está indo. Só sabe que está indo. Só sabe que
vai.
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