Hemerson passou por uma seleção entre vários atores. Foto: Shilton Araujo/Esp.DP |
A semana santa da capital pernambucana vai sofrer com uma lacuna importante em 2018. A Paixão de Cristo do Recife, maior evento público e gratuito do período, foi cancelada após 21 anos ininterruptos por conta de problemas com captação de recursos e pelo pouco tempo para recuperar o figurino e o cenário. A edição deste ano estava cercada de expectativa por ser a primeira vez na qual o ator, diretor e produtor José Pimentel cederia o papel de Jesus Cristo - que interpretou por 40 anos - a Hemerson Moura. Mesmo com esse revés, a intenção dos realizadores é fazer o evento retornar em 2019.
De acordo com o presidente da Associação dos Produtores de Artes Cênicas de Pernambuco (Apacepe) e um dos produtores do espetáculo, Paulo de Castro, a decisão foi tomada na quinta-feira passada. "O orçamento mínimo para realizar a Paixão de Cristo do Recife é de R$ 700 mil. Mesmo tendo R$ 250 mil da Prefeitura do Recife e R$ 150 mil do Governo do Estado, não conseguimos os R$ 300 mil restantes com a iniciativa privada. Agora, mesmo se conseguíssemos o dinheiro restante, não teríamos tempo de levantar a peça".
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A dificuldade crescente em manter o espetáculo já o havia colocado em xeque em anos anteriores. No ano passado, por exemplo, a peça estava para não acontecer e foi anunciada quase de última hora. Em 2018, a situação finalmente se tornou insustentável. "Tínhamos a consciência da necessidade de mudar o cenários e os figurinos, os mesmos desde o início, em 1997. Para completar, o material de cena, guardado em um armazém em Peixinhos, foi destruído por cupins. Só a mesa da Santa Ceia se salvou. Além disso, com a saída de Pimentel do papel de Cristo, houve várias mudanças no elenco. Precisávamos fazer uma nova trilha e isso não estava no nosso custo".
José Pimentel, por sua vez, está esperançoso com o retorno da montagem no próximo ano. "Eu estou bem, a vida continua. Este ano, vou ver a paixão de Cristo dos outros. Não quero ficar parado de jeito nenhum. Em julho, vou dirigir o espetáculo O massacre de Angico: A morte de Lampião e esperar outras propostas. Não tive culpa nesse cancelamento. Me disseram que estou velho para fazer o papel e achavam que bastava mudar o Cristo para o povo prestigiar, mas não foi assim. Você tem que ser um bom ator e acabou. Pretendo voltar em 2019, talvez não como Jesus Cristo, mas como outro personagem".
Pimentel não escondeu sua contrariedade no anúncio, em dezembro passado, do ator que o substituiria como personagem principal. Os ensaios para a edição deste ano começaram em janeiro, mas segundo o veterano, as arestas foram aparadas. "Hemerson estava praticamente pronto para fazer o Cristo. Para mim era difícil, pois vinha a minha marca na cabeça. Estávamos ensaiando apenas a voz, mas o processo estava tranquilo. Dei plena liberdade a ele como diretor".
Já Hemerson Moura, de 39 anos, vencedor da seleção para ser o novo protagonista da Paixão de Cristo do Recife, afirma que a situação já era esperada e se emociona ao falar da sua relação com a peça. Na Semana Santa, ele voltará a participar do Auto da Via Dolorosa, montagem musical realizada em igrejas do Estado pelo Coletivo Ditirambos, do qual ele faz parte. "É lamentável, pois quem perdeu foi a população. Havia um público fiel para a montagem, ela gerava empregos, reunia famílias. É uma tradição que se rompe", disse ele, durante ligação telefônica na qual chorou. Mesmo frustrado com a não realização do espetáculo neste ano, Hemerson diz ter ganho mais visibilidade como ator e aproveitado a oportunidade de conviver com Pimentel. "Ele é um artista de extrema gentileza, sempre foi generoso comigo. Se depender de mim, certamente estaremos no Marco Zero no ano que vem".
HISTÓRICO
A Paixão de Cristo do Recife teve sua primeira edição em 1997, imediatamente após José Pimentel sair da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, na qual intepretou o protagonista por 19 anos. Em seus primeiros cinco anos, a peça foi montada no Estádio do Arruda. Depois, passou para o Marco Zero, de onde só saiu no ano de 2006, quando foi encenada em frente ao Forte do Brum. Em sua última edição, contou com cerca de cem atores e quase 300 figurantes. De acordo com Paulo de Castro, mais de 18, milhão de pessoas viram a produção ao longo de sua existência.
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