Zé Areia (José Antônio Areia filho – 1901-1972) era tipo gordo, garboso, presepeiro, boêmio,gracioso. (Determinados autores potiguares já publicaram livros sobre suas estórias pitorescas). Barbeiro de profissão, vendedor de loterias, jogo do bicho e rifa (sorteio). Nasceu em Natal, no bairro Rocas, onde morou até morrer. Fazedor de versos populares irreverente. Suas tiradas de espírito lhe fez famoso por toda Natal então provinciana. Pois bem. À época da Segunda Grande Guerra, parte do exército norte-americano permanecia na capital norte-riograndense - Capital Espacial do Brasil. Tempo em que Zé Areia viveu os melhores momentos de sua vida. Conta-se que ele vendera um papagaio cego a certo milico americano. Dias depois, ao percebeu que aquele pássaro não tinha visão, o praça reclamou ao Consulado Americano que teria sido enganado na compra que fizera. O Consul logo tomou providências para que localizasse Zé Areia e, consequentemente, a sua presença no consulado para esclarecer o negócio. Se apresentando, o Consul fora logo interrogando: “O senhor vendeu um papagaio cego a esse soldado?” Areia não se fez de rogado respondendo assim: “Mas, “seu” Consul. Este soldado quer papagaio pra falar ou pra levar pro cinema?”
De outra feita, certo soldado americano embriagado se aproxima de Zé Areia com um litro de uísque na mão perguntando assim: “Do you like drink” (você gosta de beber, na tradução)?” Zé Areia respondeu: “É só o que eu laico!”
Noutra ocasião Zé Areia procurava vender uma sela (assento acolchoado de couro, para cavalo) pelo Centro de Natal. O primeiro conhecido que encontrou, ofereceu produto: “Seu” Mário. Compre esta sela!” “Eu não sou cavalo, pra que eu quero sela!” Respondeu o amigo Mário. Zé Areia que sempre tinha a resposta na ponta da língua, deu o troco: “Ela serve também pra burro, “Seu” Mário!”
Zé Areia não gostava de trabalhar. terminado a Segunda Guerra Mundial, a situação financeira ficou ainda mais difícil pra ele, Zé Areia. Passando por necessidades, certo amigo arrumou emprego de barbeiro pra Areia, na Casa de Detenção de Natal. Não durou muito tempo. Areia abandonou o serviço. Certo dia, aquele amigo ao se encontrar com ele, fora direto ao assunto: “Mas, Zé Areia. Você abandonou o emprego?” Zé Areia saiu-se com essa: “Amigo. Eu subloquei o serviço.”
Certo dia, Zé Areia bebia na Confeitaria Delícia, no bairro Ribeira, cidade do Natal. Certo frequentador assíduo daquele recinto, pedira para que ele, Areia, declamasse uma trova de sua autoria. Naquele instante, se aproximava um amigo a quem Areia devia certa quantia de dinheiro. Areia improvisou: “Não há dor igual à dor/ De um cabra que está devendo/.Todo cheio de remendo/ Diante de um cobrador."
Zé Areia rifou um carneiro pelo jogo do bicho. Pois bem. Certo amigo chamado Benvenuto, ao vê-lo passar pelas ruas da cidade com aquele carneirinho, perguntou ao gracioso amigo: "Zé, como se chama esse carneiro?" Sem nem pestanejar, Zé Areia respondeu: "Benvenuto."
Sobre Zé Areia, o escritor norte-riograndense Câmara Cascudo escreveu: "A morte de Zé Areia apaga em Natal o derradeiro representante da verve recalcitrante, do espírito da réplica, imediata e feliz, o último contribuinte para o patrimônio esfuziante da improvisação anônima e surpreendente. Desapareceu a 31 de janeiro de 1972 (mês em que nascera), quanto nos restava de Popular sem vulgarizar-se e constituir uma presença chistosa nas recordações bem-humoradas de todas as classes sociais da cidade. Sentindo a aproximação asfixiante do enfarte, ergue-se da rede, abraçando a mulher, vivendo a pilhéria da sua vida dolorosa: “Mulher feia! Quero morrer em teus braços!”.
Fernando Caldas
Nenhum comentário:
Postar um comentário