quinta-feira, 9 de março de 2023

 O PRÍNCIPE DA MODINHA


Espirituoso e maniático, Oswaldo de Souza pertenceu a uma plêiade de criadores, alguns bastante conhecidos, que transformaram em música de qualidade a própria alma duma brasilidade sonorosa que alimentou o estro de compositores originais, dentre os quais, Heitor Vila-Lobos, Waldemar Henrique da Costa Pereira e o potiguar que submergiu no esquecimento e resgatou e traduziu em dois substanciosos volumes criteriosamente pesquisados sobre as Canções dos Barqueiros do Rio São Francisco, publicados em edição há muito esgotada pelo Ministério da Educação e Cultura, aí pelos anos de 1970, uma referencia para musicólogos e pesquisadores em busca de nossas raízes culturais mais profundas e radiculares.
Pianista e concertista, bastante solicitados nas décadas de 1920 e 1930, a convite do governador Aluizio Alves em 1961 voltou ao Rio Grande do Norte, sua terra natal, para empreender o primeiro inventário oficial do nosso Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural, quando resgatou o Marco de Touros que há gerações se deteriorava a céu aberto, diante da indiferença de nossos governantes, sempre ocupados em ludibriar o povo. Esse inventario resultou em um livro mal editado, dez anos depois de escrito, pela Fundação José Augusto, instituição que a cada nova gestão, desde que foi criada, se repete como farsa através de gestores medíocres que se comprazem em desfaçatez e vaidade.
Durante a sua longa aposentadoria, dedicou-se a escrever e a dar forma à sua Obra Magna, A Modinha, publicada após sua morte sob o nome de suposto autor, oportunista e sonso, que se fez passar por especialista, ludibriando incautos e pessoas de boa-fé, prevalecendo-se ainda do desconhecimento e da subserviência de editores de jornais e repórteres desprovidos de cultura e infensos à prática do contraditório, como se o exercício da crítica fosse desnecessário. À criação e à cultura que se faz com substratos, repertorio, conhecimento e prática contínua que supera as dificuldades.
Gostava de receber para jantares requintados, à francesa. Levava muito à sério a fabricação de um licor de jenipapo que apurava durante meses com o qual distinguia um ou outro amigo que desejasse impressionar com a alquimia com que valorizava uma receita de família.
Como compositor, era sem dúvida um erudito enamorado dos ritmos populares oriundos de diversas culturas cheias de vigor e originalidade que fazem do Brasil um cadinho em permanente efervescência. Pingo d´água, uma de suas peças mais difundidas, foi gravada por grandes cantores líricos. Constitui exemplo perfeito de uma estética que se nutre de uma vertente musical espirituosa e faceta. Suscetível de cair, ao primeiro acorde, no gosto do povo.
Natal deve-lhe muito, sobretudo porque ajudou a fraudar a autoria de uma obra que só podia resultar, a um tempo, do instinto, da intuição e de conhecimentos musicais bem fundamentados, sofisticados e laboriosos. Sua obra precisa ser urgentemente resgatada e, mais que isto, ter a sua autoria restabelecida, por especialistas e, sobretudo, por uma questão de justiça e merecimento.
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