EGOÍSMO,
O ISMO DO EU
Públio José – jornalista
Todos nós já estamos acostumados com os ismos da vida. Nacionalismo,
esquerdismo, anarquismo, direitismo, numa sucessão sem fim, entronizada para
rotular tendências religiosas, políticas, econômicas, esportivas, culturais de
quem quer que seja. Por mais esforços que se faça, ninguém escapa de ser
encaixado em um ismo qualquer. É latente, intestina a necessidade no ser humano
de rotular, de entalar o outro num ismo. “Fulano é de um esquerdismo
revoltante”. Com certeza você já ouviu esse tipo de comentário de alguém
a respeito de outra pessoa. Ou por outra: “Sicrano não passa de um reles
defensor do capitalismo selvagem”. Os artistas, os intelectuais, os
políticos, sofrem muito com esse, digamos, rotulismo. Independente de serem ou
não o que os outros pensam a respeito deles, são logo encalacrados, mal surgem,
como sementes do modernismo, conservadorismo, populismo, expressionismo...
O ismo é um sufixo que encerra em si mesmo um projeto de doutrinação, um
conjunto de ações voltadas à implementação de uma tendência, de uma escola, de
um movimento ou princípio artístico, filosófico, político ou religioso. Tem
sempre atrás de si mil interesses. Nunca surge de graça, como também ninguém
inventa um deles por acaso. Ao longo da história da humanidade os ismos se
sucederam como panacéia para inúmeros males, ditando moda, hábitos, costumes,
além de pautarem a rotina das atividades artísticas, políticas, econômicas,
culturais e sociais. Alguns ismos se caracterizam pelo seu conteúdo exterior. É
o caso do militarismo, do expansionismo, do ativismo voltado a fazer uma
comunidade tentar um crescimento para fora de suas fronteiras. Outros são mais
intrínsecos aos sentimentos e posicionamentos interiores, como idealismo,
comodismo, egoísmo, altruísmo, individualismo – e por aí vai.
Há os de conotação política, como comunismo, nacionalismo, esquerdismo,
direitismo, como também os mais sintonizados com a administração pública:
monetarismo, liberalismo, capitalismo, socialismo, trabalhismo, todos,
logicamente, direcionando a visão, as políticas, ações e projetos nos governos
onde se enraizaram. A prática de um ismo qualquer diz bem a pessoa ou o
conjunto de pessoas adeptas de sua essência. O ateísmo, por exemplo, enquadra
em torno de si os que são contrários à existência de Deus. O altruísmo, por seu
lado, já inclui o sentimento de quem põe o interesse dos outros à frente dos
seus. E o egoísmo... Ah, esse é bronca! Bronca pura! Significa a eleição do
próprio ego, do próprio eu, como início, meio e fim de todas as coisas. Ou
seja, uma vida calcada na celebração de tudo que diz respeito a si. Só e
somente só. Em suma, a doutrina da valorização excessiva do eu.
Se o sufixo ismo caracteriza a junção de atividades em torno de uma tendência,
de um movimento, o egoísmo, por sua vez, encarna todo um posicionamento
interior no sentido de erguer um trono à própria personalidade, um culto
fanatizado à defesa dos próprios interesses. Entretanto, se o egoísmo ficasse
por aí tudo bem. O problema com seus detentores é que, na medida em que
supervalorizam os próprios interesses, agem no sentido contrário na escala de
importância em que catalogam as pessoas. Para o egoísta o próximo vale muito
pouco – quando não coisa nenhuma. E, muitas vezes, percebendo ou não, o
egoísta vai deixando pelo caminho um rastro de destruição e ódio, oriundo de
ações carregadas de um profundo menosprezo pelo outro. E agora? Agora? É
constatar-se, vida a fora, o altruísmo de uns poucos em contraponto ao egoísmo
de muitos. De muitos. Ah, o egoísmo... Que bronca!