"O centenário de um senhor parlamentar
Djalma Aranha Marinho nasceu vocacionado para servir ao parlamento na plenitude democrática ou ameaçado pelas intérpéries ocasionais do autoritarismo. Com prudência e saber jurídico deu sua colaboração ao país quase à beira de colapso constitucional em 1961, quando os militares se opuseram à posse do seu vice-presidente João Goulart, após a renúncia de Jânio Quadros. Foi o relator da emenda constitucional que instituiu o parlamentarismo e evitou o impasse que teria gerado um conflito imprevisível assegurando a posse de Goulart no dia 7 de setembro daquele ano.
Contrário a licença para processar o então deputado Márcio Moreira Alves solicitada pelo governo militar ao STF, naquela crise que resultaria na edição do AI-5 em 1968, defendeu com veemência a inviolabilidade da instituição, embora não tivesse concordado com o discurso inoportuno do deputado oposicionista. Valeu-se da frase do escritor espanhol Calderon de La Barca para concluir suas palavras na sessão histórica da Cãmara Federal no dia 12/12/1968: "Ao Rei tudo, menos a honra". Após o discurso, renunciou a presidência da Comissão de Justiça, em sinal de protesto ao gesto abusivo do abítrio.
Sentia-se bem no parlamento e útil a instituição na condição de guardião de suas prerrogativas constitucionais e na condenação aos excessos praticados por governos populistas com viés autoritário. Integrar aquela turma privilegiada pelo saber jurídico e intelectual, representava uma láurea consagradora.
O deputado Djalma Marinho integrou o grupo e foi bem recebido por todos. Destacavam-se, dentre outros, Carlos Lacerda, Afonso Arinos, Bilac Pinto, Pedro Aleixo, Miltom Campos, Aliomar Baleeiro, Prado Kelly, Adauto Lúcio Cardoso e Oscar Correia, para citar apenas alguns que se tornariam mais tarde juristas consagrados e ministros do Supremo Tribunal Federal. Na Câmara, as galerias superlotadas aplaudiam aqueles oradores que incendiavam o plenário da Casa pelo brilho da oratória demolidora e impecável. A "banda da UDN" tocava afinada com partitura até de olhos fechados.
Apesar da timidez que o caracterizava, avesso a qualquer tipo de publicidade, o parlamentar norte-rio-grandense conseguiu obter notoriedade entre seus pares, tendo sido indicado para as relatórias de projetos polêmicos como a fusão do estado da Guanabara com o Rio de Janeiro e da CPI do acordo Globo/Time-Life, este lesivo aos intereses nacionais, segundo afirmou o deputado em seu parecer. Desincumbiu-se airosamente das tarefas difíceis, contrariando poderosos, graças à responsabilidade de renomado jurista.
Iniciou sua vida pública como deputado estadual constituinte de 1946 pela UDN, ao lado de figuras como Dix-Huit Rosado, Mário Negócio, Gomes Lemos, José Gonçalves, Pereira de Macedo, José Xavier, Moacyr Duarte e outros. Obteria mais tarde sete mandatos de deputado federal. Perdeu duas eleições majoritárias que lhe marcaram profundamente: o governo do Estado paras Aluízio Alves em 1960 e o senado da República para Agenor Maria em 1974.
Mas, a derrota que mais o machucou foi a perda da presidência da Câmara Federal para o colega Nelson Marchesan em 1980, num momento em que o poder Legislativo massacrado pelo regime vigente começava a reagir à condição de vassalo do Executivo, que tantas vezes tinha estuprado sua autonomia em nome do arbítrio. A derrota mexeu com sua estrutura emocional. Morrera pouco tempo depois.
A sala da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara tem o seu nome. Hoje, foi homenageado lá, pela pasagem do centenário ocorrido no último dia 30. Uma lembrança justa a quem teve uma atuação marcante no parlamento nacional. Infelismente, no Rio Grande do Norte, a data foi completamente esquecida.
Lamentavelmente, temos desapreço à memória dos homens públicos que se portaram com correção na vida pública".
Autor: João Batista Machado
(Transcrito do "Jornal de Hoje", 7/6/2008)
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