quinta-feira, 9 de maio de 2013


Erotismo direto ao ponto

Yuno Silva - Repórter

Há tempos Nei Leandro de Castro comunga na seara da literatura erótica. Nada de meias palavras ou escrachos, o escritor vai direto ao ponto sem entregar o jogo de bandeja; sempre com a intenção de instigar a libido, os desejos e instintos – dos mais baixos aos mais nobres. Para ele não existe fronteira palpável entre erotismo e pornografia: “Quando me fazem essa pergunta cito Oscar Wilde, que afirmava não existir livro pornográfico e sim livros mal escritos”, disse ao VIVER. Potiguar radicado há décadas no Rio de Janeiro, poeta, autor de contos e romances, Nei Leandro está em Natal para lançar o livro “Pássaro sem sono” (Jovens Escribas) nesta quinta-feira, a partir das 18h, no Solar Bela Vista.
Alberto LeandroSem entrelinhas ou escrachos, Nei Leandro de Castro faz novo voo pela literatura erótica em Pássaro sem sono, reunião de contos escritos pelo autor, a partir de 1995. A obra, cujo lançamento é hoje no Solar Bela Vista, sai com o selo Jovens EscribasSem entrelinhas ou escrachos, Nei Leandro de Castro faz novo voo pela literatura erótica em Pássaro sem sono, reunião de contos escritos pelo autor, a partir de 1995. A obra, cujo lançamento é hoje no Solar Bela Vista, sai com o selo Jovens Escribas

O livro, compilação que reúne pouco mais de uma dezena de contos escritos a partir de 1995, ano em que Nei Leandro foi premiado em concurso nacional de contos eróticos promovido pela revista Playboy com o texto “Nossa semelhança com os deuses” (que também integra o novo livro), traz textos maliciosos ambientados na capital carioca. Diferente da prosa, que bebe na fonte regionalista, seus contos são extremamente urbanos e “puramente de ficção” – garante o autor, sempre lembrado pelo título “As Pelejas de Ojuara”, originalmente publicado em 1986 e adaptado para as telas de cinema em 2007.
Alberto LeandroDiferente dos romances, seus contos captam a urbanidadeDiferente dos romances, seus contos captam a urbanidade

“Faz tempo que escrevo contos, porém sem tanta frequencia”, confessa Nei Leandro de Castro, que selecionou os mais significativos para integrar “Pássaro sem sono”. O título, por sinal, faz referência a personagem presente em um dos contos: um motorista conhecido por ‘Tetéu’, outro nome do Quero-quero, ave conhecida por dormir pouco ou quase nada. “Escrevo aos poucos, e até que poderia ter aproveitado melhor a repercussão do prêmio da Playboy”, avalia o autor, que concorreu com outros 1,2 mil escritores, entre eles Lígia Fagundes Teles e José Castello. “Tenho uma tendência ao erotismo, principalmente na poesia”, explicou Nei Leandro.

Ele disse não haver preferências, gosta de todos, e destaca o premiado “Nossa semelhança com os deuses”, que relata a trajetória de um assassino em série que sai ‘à caça’ de suas vítimas movido pelo tesão (ver trecho transcrito).

Sobre a recente retomada do interesse em torno da literatura erótica, sobretudo a partir do lançamento do best seller “50 Tons de Cinza” em 2011, da escritora inglesa Erika Leonard James, cuja principal audiência são as mulheres, o potiguar percebe que o fato deve ser visto a partir da redução do conservadorismo imposto pelo machismo. “Particularmente acho uma porcaria o ‘50 Tons de Cinza’, mas não posso negar que a reboque do seu sucesso surgiram uma nova leva de autores da literatura erótica. Não conheço muitos autores, mas o mercado está receptivo”, avalia Nei Leandro, com um distanciamento seguro de quem não se deixa influenciar por modismos.

Serviço

Lançamento do livro “Pássaro sem sono” (Jovens Escribas, R$ 30), de Nei Leandro de Castro. Hoje, a partir das 18h, no Solar Bela Vista.

Conto premiado

Nossa semelhança
com os deuses
Trecho do conto “Nossa semelhança com os deuses”, premiado em 1995, em concurso realizado pela revista Playboy.

“Cinqüenta e cinco anos de idade, viúvo há oito meses,  aposentado, sem filhos e sem amigos. Eu tenho pensado na vida e na morte enquanto percorro as margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, vendo passar por mim corpos perfeitos, bundas docemente empaladas em bicicletas, torsos gregos melados de suor. Aqui outrora retumbaram hinos, como dizia um bêbado chato, depois do terceiro chope no Bar Lagoa. Nos meus momentos de depressão, pensei às vezes em encher os bolsos de pedras e, numa homenagem a Virginia Wolf, desaparecer nas águas pesadas de lodo, de onde emergem savelhas em surtos de asma.

O desejo sexual é o que me mantém vivo, para cobiçar  cada vez mais as mulheres que rondam a Lagoa. Andei tantas vezes em volta desse espelho d’água, e tanto me deslumbrei com os triângulos estufados nas calças de jogging, e tanto me excitei com as  bundas exibidas e com os seios de mamilos eriçados, pontas de lança sob blusas brancas, que desisti de carregar pedras nos bolsos, e terminei por aceitar que a vida não é uma sucessão de tédio e ansiedade. O sexo, Virgínia, vale uma missa.”

Sobre o livro “Pássaro sem “sono”

O conto é um dos mais fascinantes estilos literários. Segundo Julio Cotazar, o que difere um romance de um conto é que no primeiro se vence por pontos, enquanto num conto, a vitória é por nocaute. Inapelável. Talvez tenha sido a sede de tornar-se vitorioso em outra seara que incentivou Nei Leandro de Castro, autor de tantos e memoráveis romances, a arriscar-se no terreno das narrativas breves e nos brindar com os contos deste “Pássaro sem sono”.

Nas histórias aqui reunidas, um ponto em comum: o erotismo. É a sensualidade utilizada como importante recurso a estabelecer tensão entre os personagens. O termo “erótico” vem do grego (Erotikós) e significa “relativo ao amor ou inspirado por ele”. O erotismo expressa, portanto, a naturalidade do desejo sexual, conforme pode-se notar nas histórias aqui reunidas. Nelas, o desejo, a vontade, os impulsos incontidos de cada um não são gratuitos, mas partes de um enredo que transmite valor literário às histórias magistralmente contadas pelo autor.
 
Fonte: Tribuna do Norte

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