segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

"UM LIVRO INESQUECÍVEL"

"A doce voz de uma mineira de Lavras ressuscitou nestas páginas o mundo ambiente que constituía a sua paisagem familiar. Um encanto da evocação é ainda de não ter alterado, na marcha da própria cultura adquerida, as linhas melódicas da cantiga infantil.

É a saudade vencendo o tempo. Essa menina de Minas Gerais. Maria Eugênia Maceira, hoje senhora Nelson Borges Montenegro, reconstrói a meninice feliz e despreocupada, na movimentação incessante e normal do cenário de Lavras, Sant'Ana de Lavras do Funil, Princesa do Sul, Atenas Mineira.

O pai é português, emigrado do norte de Portugal, engenheiro, agrimensor, desenhista, fotógrafo, hortelão, jardineiro, matemático, trabalhando na estrada de ferro e nas rodovias, doutor formado na Universidae da Vida, com intuições geniais de adaptação técnica. A mãe, brasileira, com sete filhos, educa, vitaliza e enriquece o espírito de sua floração inquieta, sadia, natural.

Maria Eugênia Maceira Montenegro reconduz os passos para a rua d. Inácia, com sua noite colonial de escuro, estrelas no céu e sacis-pererês cabriolando nos caminhos silenciosos. Uma a uma as figuras reaparecem, completas, íntegras e vivas, recomeçando o romance da cotidiana missão de esforço e de esperança. A moldura de lavras volta a uma presença legítima sob as luzes sentimentais das lembrança, serras, águas, flores, pássaros.

A vida para a menina é sua família, pais, irmãos, primos e tias, um pequenino universo com seus ciclos gravitacionais e luminosos de episódios íntimos, passeios, brigas, desejos, viagens curtas e sonhos longos, todos os elementos que compôem a ecologia imultável das recordações.

Mas essas memórias de uma menina feia vividas entre fúcsias e jasmim, revendo o baúzinho verde onde o passado esconde as riquesas da memória fiel, olhando colibrís, borboletas e marimbondos, casas, fisionmias queridas, é também um documento precioso pela sua veracidade, no plano testemunhal, de uma família modesta e pobre, mantida pela obstinação de todas as horas, com a mão tradicional, inesgotável de força criadora, impressionante na grandeza comunicativa de energia. Depoimento da normalidade familiar brasileira em Minas Gerais, reserva de perenidade moral na resistência coletiva.

Vereis como essas crianças foram educadas, alimentadas, postas no ritmo inflexível do trabalho, da colaboração pessoal, numa ante-preparação ao solidarismo social. Naquela casinha da rua d. Inácia, não há seres inúteis, preguiçosos, indolentes e fixados ao marginalismo aproveitador da produção alheia. Até Maisé trabalha no mundo povoado de bonecas sublimadoras da frustração maternal.

Compreende-se por esse Saudade, teu nome é menina como a família a perpetuidade do grupo nacional, não porque as crianças nascem, mas, porque as mães anônimas sabem transformá-las em homens dignos e em mulheres admiráveis. Vai d. Gena contando sua história nas estórias de sua meninice. Ecerra o velário quando ama, noiva, casa, com um nordestino estudante em Lavras, acompanhando o marido para paisagens distantes, estranha e diversa das verdes matas, águas catadupejantes, frios de inverno, da mesma alimentação que a terra justifica em sua generosa multiplicação, frutos, verduras, hortaliças. Nas várzeas do Assu, riscadas pelo rio que ressuscita quando chove, olhando carnaubais, a mineirinha da casinha de madeira do jardim, do pomar da rua d. Inácia, laboratório de exemplos tranquilos de confiança e de fé e transmite ao filho, o mais fidalgo dos quatro mosqueteiros, a reminescência de como sua vida começara, limpa e nobre, ensopada no leite mais puro da ternura humana. Um dos encantos deste livro é a sua comunicabilidade. Vivemos também no seu tempo, morando na mesma casa, recebendo as bençãos ds mesmas tias, os presentes quando papai voltava, comendo doces inesquecíveis e dos pratos telúricos da cozinha mineira. Tantos fios emocionais nos prendem na indêntica insistência da mesma teia eterna e permanente dos lares onde o sono infantil é guardado pela asa do anjo da guarda maternal, A autora, sem pensar e talvez sem querem, conseguiu esse milagre de afetuoso contágio. Todos os seus leitores participam dos encantos sem pecados e na convivência sem vícios dessas roseiras mineiras, cujas flores se trasplantam para o nordeste, recriando e mantendo a beleza cristã dos lares felizes."

Luis Da Câmara Cascudo

(Do livro estréia intitulado "Saudade, Teu Nome é Menina", da escritora assuense de Lavras, Maria Eugênia)


domingo, 3 de fevereiro de 2008

UM POUCO DE MOYSÉS SESYOM

Moysés Lopes Sesyom nasceu no dia 28 de julho de 1883 no sítio Baixa Verde, Caicó-RN e viveu grande parte da sua vida na cidade de Assu há partir de 1905. Naquela terra assuense começou a produzir versos satíricos, chistosos, fesceninos, que lhe fez poeta consagrado. Ficou conhecido como "O Bocage Riograndense". Câmara Cascudo no seu livro intitulado "O Livro das Velhas Figuras, volume 4, depõe que Sesyom (conta-se que ele começou a versejar já adulto, aos 30 anos de idade)"sem saber, era poeta verdadeiro, espontâneo, inesgotável, imaginoso, original."

Certa dia, bebendo num certo botequim da cidade de Assu alguém lhe dera o seguinte mote: "Bebo, fumo, jogo e danço / Sou perdido por mulher". Aquele bardo boêmio de vida atribulada, escreveu na hora a seguinte décima que se tornou célebre:

Vida longa não alcanço
Na orgia ou no prazer,
Mas, enquanto eu não morrer
- Bebo, fumo, jogo e danço!
Brinco, farreio, não canso,
Me censure quem quiser...
Enquanto eu vida tiver
Cumprindo essa sina venho,
Além dos vícios que tenho,
Sou perdido por mulher!...

A glosa seguinte é uma das mais notórias que Sesyom produziu. Vamos conferir:

Isto ontem aconteceu
Debaixo da gameleira.
Foi um tiro de ronqueira,
O peido que a doida deu.
A terra toda tremeu,
Abalou todo o Assu,
Ela mexendo o angu,
Puxou a perna de lado.
Deu um peido tão danado
Quase não cabe no cu.

Francisco Amorim depõe em Eu Conheci Sesyom, 1. Edição, que o mote "Sua mãe foi fêmea minha" foi dado a Sesyom por um amigo que se encontrava bebendo com ele no Hotel Pátria, da cidade de Assu, que ali mesmo Sesyom glosou:

A sua raça é safada
Desde a quinta geração
Seu avô foi um cabrão
Sua avó, puta de estrada
Sua filha, amasiada
Prostituta uma netinha
Uma irmã que você tinha
Esta pariu de um criado
Seu pai foi corno chapado
Sua mãe foi fêmea minha.

Sesyom numa feliz inspiração, com amor a sua terra natal, escreveu o soneto publicado no jornal "A Cidade", de Assu, edição de 13 de março de 1927, intitulado "Soneto", que diz assim:

Caicó, berço de luz. Terra adorada.
De belas tradições. Bem conhecida.
Onde, em tempo, passei vida folgada,
Terra que nunca esquecerei na vida.

Caicó, ninho querido. Idolatrada,
Terra sem outra igual, calma, florida,
Onde meus pais nasceram, abençoada,
Onde reside minha mãe querida.

Vivem ali na formosa paz da serra,
Meus irmãos de quem vivo separado,
Filhos que também são daquela terra.

Terra de Senador e Deputado,
Onde nasceu o Padre Brito Guerra
E o nobre Presidente do Estado.

Sesyom é Moiysés ao contrário. Morreu no dia 9 de março de 1932 e está enterrado na Cemitério São João Batista, da cidade de Assu/RN.

Fernando Caldas






















sábado, 2 de fevereiro de 2008

UM POETA MATUTO

O poeta popular Paulo Varela é natural do Assu (RN), meu amigo e conterrâneo, considerado um dos melhores poetas populares do Nordeste brasileiro. Paulo é portador de gagueira, um disturbio neurológico que afeta a fala, porém é fluente declamando um poema. Ele já se apresentou no Programa do Jô, da TV Globo, bem como é convidado para apresentar palestras e conferências sobre a sua poesia genuinamente matuta. Poucos dias depois da sua apresentação aquela emissora de televisão apresentou em reprizea em razão de ter sido um sucesso total em todo o Brasil. Ele participa de feiras de artesanatos e da Festa do Boi, em Parnamirim/RN, onde arma um stander (uma casa de taipa, típica do sertão do Nordeste, que ele mesmo constrói), onde vende seus folhetos de cordel e apresenta a sua arte de versejar, nas casas de shoows de Natal. A sua produção literária (poesias e causos populares é extensa, com mais de duas mil composições. Ele, Paulo, também é artista plástico e "se diz um cabôco escrevedô e contadô de causos matutos."

O professor e historiador Edson Aquino Cavalcante escreveu sobre Paulo dizendo que ele "tinha jeito para o desenho artístico, mais tarde resulta neste mestre que deixa todos boquiabertos com a sua capacidade de criação. Sendo hoje um contador de causo de primeira linha."

A propósito da sua entrevista no Programa do Jô, apresentado no dia 2 de fevereiro e reapresentado no dia 21 de março de 2005, o jornal "O Mossoroense", publicou a seguinte nota: "A madrugada do último sábado foi marcada pela presença do poeta popular assuense Paulo Varela no Programa do Jô. O homem deu um verdadeiro show mostrando que a cultura popular é rica (...).

Vamos conferir a sua verve, a sua criatividade poética que agrada a leigos e letrados:

Pro mode dessas doidice
Que temo que escutar
Tanta coisa ripitida
Desses tanto bla-blá-blá
Por isso qui tenho dito
Os versos são mais bunito
Do que esses pocotó
Gente sen arte tá rico
E ouvido não é pinico
E nem também urinó
Faço coisa diferente
Dessas raízes da gente
Pois eu acho mais mió

Falo de nossas sabenças
Das nossas maledecências
Das coisas do mei rurá
Eu falo do sofrimento
Do chicotar do jumento
Do vôo do carcará
Falo do gado magrenho
Da cachaça, do engenho
Do nordestino sofrido
Desse mato ressequido
Do espinho unha-de-gato
Tocaia no mei do mato
Das poça, do lamaçá
Da mãe que dá de mamar
Do aboiar do vaqueiro
Do repicar do ferreiro
Das prece, dos retirante
Dos bando de avuante
Do sol amarelo e quente
Da fome de nossa gente
Cangaia, borná, chucaio
Tropeiro no seu trabaio
Bisaca, xote, capim
Das negas, dos cabra ruim
Viola, moitão, furquia
Do calor do meio-dia
Casa de taipa, forró
Cachorro, gato, socó
Dos cabôco bom de briga
Das gostosas rapariga
Trinchete, alguidá, panela
Do pilão, cabaço e vela
Do luar, da lamparina
Dos perfume das menina
Quengo, feira e caçote
Biqueira, coice, magote
Farinha, feijão, arroz
Do nosso baião-de-dois
Cangapé, foice, matuto
Nossa fé, do nosso luto
Dos andar das romaria
Do repente, cantoria
Das beatas rezadeira
Dos tiros de baladeira
Dos bolão de vaquejada
Dos coriscos, trovoada
Enxada, perneira e pá
Brida, roçado, vasante
Mas vamos mais adiante
Que não parei de falá.

No folder da festa de São João Batista (Padroeiro do Assu) de 2004, está transcrito um poema convite de sua autoria, dizendo assim:

Pros cabôcos que é de fora
Nóis queremo convidá,
Pra beber de nossa água,
Pro móde nóis forrozá.
Ver quadria e buscapé,
Quem sabe arranjá muié,
Cum as cabôcas se insfergá.
Quem sabe arranjá cabôco
Pra sair do caritó,
Pra resolvê seu sufôco.
In nossa festa arretada,
Só vai tê gente educada,
I vai ser coisa de lôco.
Tem mio, canjica e baião,
Pamonha, alfinim, bandeira,
Xote, buchada e fugueira.
Vai tê balão em fileira,
E a novena é de primêra.
Tem corrida de jumento,
Umas bandas de talento,
E um show de alegria.
Eu lhe convido de novo,
Pra tú cunhecê o povo
Da terra da poesia.


Fica registrado um pouco da poesia matuta deste bardo assuense chamado Paulo Varela. 

(Fernando Caldas)

"VARZEA DO ASSU"

"Manuel Rodrigues de Melo não sub-titulou seu livro romance, conto ou crônicas. Deu- lhe, como indicação justa: Paisagens, tipos e costumes do Vale do Assu. Não é um volume de imaginação. É um depoimento. Sua densidade é soberba de verdade e de força fiel. Nenhum livro apareceu, até abril de 1940, com tal riqueza de informes varzeanos, com tal ciência de minúcia, com detalhes registrados de maneira clara, simples, honesta. Sente-se que, aberta a comporta da reminescência, cantaram impetuosos as águas represadas, livres em seu ímpeto veloz. É a confusão aparente, indico, para olhos limpos, de uma grande massa de notícias que se comprimia, impaciente, nos recantos da memória. Trabalho de varzeano, traduz idioma, modismo deliciosos, usados na paisagem espiritual onde o autor viveu. Todas as figuras qe povoam Várzea do Assu vivem ou viveram. As ruas sem nomes dos povoados, os becos, as praças humildes, os pátios das fazendas que a seca de 1915 despovoou, todas as cenas de enchente e estiagem, de gado e de rio, plantio, pescaria, são modelos tomados ao original. A vida da Várzea, cortada pelo rio imenso, posou para M. Rodrigues de Melo. Não será um foto à Lariev mas é um instantâneo verídico, exato, cuja Kodak não teve a objetiva escura pelo desejo de renome, além do sonho de prolongar sua terra pelas paisagens do seu livro. que sabemos nós, do litoral e sertão, sobre a vida dos varzeanos do Assu, a zona que, de futuro, valerá duas Californias e três Virginias? Apenas, há mais de meio século, Luiz Carlos Lins Wanderley publicou um romance, Mistério de um homem rico, cuja ação se desenrola no Assu. Quais são os leitores desse romance desaparecido? Conheço apenas o segundo volume. Nesse silêncio de cinquenta anos há uma solução de continuidade, inesperada, singela, mas decisiva e nobre: é esse livro evocador, dolorido, emocional e sugestivo. Para criticar seu heroísmo, em escrevê-lo e publicá-lo, é obrigatório fixar pontos de referências? Onde estão os livros descrevendo, com naturalidade e calor, a via da várzea assuense?

É de notar a ausência das tarefas de carnaúba, corte de folhas, batida, fazimento de cera, seus processos. E quem nos diz que essa omissão não seria intencional? Que haja o autor reservado essa parte para o outro ensaio, em que estude a organização tradicional do trabalho na população do Assu? Quantas curiosidades foram relevadas... E o vocabulário capitoso, entubibaram, fiota, pé de castelo, mulada, rupe, feder a fogo, marombos, trambecar, rebolada, de macambira vasqueira, dando para casa, deu de marcha, o cavalo acendeu as orelhas, desadorador, taipero de pilão, tenha tramém, que ouvimos, empregamos mas não escrevemos, assombrados com a fauna extinta dos gliptodontes gramaticais? E o verbo espírita, obsoleto e desusado em portugal, comum aos clássicos, citado em Ferreira (Comédia de Bristo, c. v. do voato) com a contratação ora em Deus em ti, e, na várzea do Assu, o bicho? É com parcimônia que cito.

Não é menor a divulgação de hábitos que se tornaram como cerimônias, espécie litúrgica de gestos, indispensáveis a esse ou aquele ato. Nos bailes dos Mucaias há o cerimonial popular de oferecer bebida em que o pagador deverá liberar primeiramente. Tome! Não, dizia o companheoro, venha de lá. Não, pode tomá. Só entã o parceiro bebe. Todos nós sabemos desse detalhe. Mas ninguém o escrevera ainda. E como esse, inúmeros. Pertencem, essas informações, ao domínio etnográfico, indispensável para o estudo da psicologia coletiva.

A retirada do gado, a derrubada do barbatão pelo vaqueiro Preto Ruivo, da azenda Alemão, está como um retrato ao vivo: - Ao sair numa capoeira pequena e estreita, Preto Ruivo enrolou novamente. Enrolou e segurou. Abrindo o cavalo para fora num ímpeto de raiva, sentão a mão na saia do barbatão, pegou o cavalo nas esporas e gritou ao bicho, jogando-o por cima de uns troncos de catingueira. É rápido, preciso, numa linguagem que será desconhecida aos que se iniciaram nas lides do sertão pastoril. Sentar, abrindo o cavalo, pegou nas esporas, saia do barbatão, gritou ao bicho, são mistérios para um praiano mas lembranças vivíssimas para quem residiu e ama a terra bravia do sertão de pedra.

É esse Várzea do Assu o primeiro livro do autor. Vale por um balanço de capacidade. Raros começaram por essa forma, amando a vida e narrando-a sem disfarces e mentiras de estilo bolo-de-noiva ou pornografias convencionais de realismo.

M. Rodrigues de Melo não andou escrevendo a várzea do Assu. Andou filmando. E com a mais sensível, delicada e fiel das máquinas: - o coração..."

Luis da Câmara Cascudo
(In O livro das Velhas Figuras)

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

SONETOS DE JOÃO LINS CALDAS

AO CORAÇÃO QUE UM CORAÇÃO TRAIU

Ah! Se eu pudesse, coração ferido,
Vingar as mágoas por que tens passado!
Sentir-te duro te sentindo amado
Por que te fez de coração traído.

Ah! Se eu pudesse para ver vencido
O ser que te fez de coração chagado,
Já que de tanto não te é chegado,
Já que de tanto não te é podido;

Ver-te querida; e apaixonado e, louco;
Ter-te no peito pelo mesmo afeto
Mas, nesse afeto, de coragem firme

Ao ver quem foi aos teus carinhos mouco
Mostrar vingança pelo mesmo afeto
E a estrangular te estrangulando a rir-me.

O BUGARI

De quem passou nas tuas mãos um dia,
Do bugari mimoso que me deste
Se evola um mundo de sua ambrosia
Que a minha musa de ilusões se veste.

Ao verem-me com ele: - "Hoje se veste
O perfume do amor..." tudo anuncia
Julgando alentá-la esse olhar celeste
E não o pranto que dele se escondia...

Ah! Nele o bugari cheiroso e lindo,
Brilha o sonho desse gozo infindo
Que nos transporta ao céu da fantasia.

E, como se novo ele ainda fosse...
Conserva a essência jubilosa e doce
De quem passou nas tuas mãos um dia...

SONETO

Vais... vais partir e, aqui, amargurado
Não cessarei de ti chorar um dia.
Em tudo, cruel, a dor se me anuncia,
E, todos, ressurgem os sonhos do passado.

Longas noites no sofrer gelado
Eu sei que vou passar... a nostalgia
Encherá os peitos dessa letargia
Onde soluça o Amor que foi sonhado...

Tudo que em mim de ti falando vê-se
Segreda-me com ânsia de queixume:
"Sei que, quem parte bem cedo se esquece..."

"Vais... meu amor! Minha doce ilusão!"
E´ loucura de mim teres ciúme
Aqui fica meu corpo e segue o coração...
































terça-feira, 22 de janeiro de 2008

OUTRAS POUCAS E BOAS

1 - O Vale do Açu além das suas terras férteis, é uma região rica de figuras chistosas, espirituosas, irreverentes. Pois bem, Vicente Queiroz era fazendeiro no município de Pendencias, localizado naquela região. Certo dia, conversava no alpendre da casa da sua propriedade agrícola com seu amigo chamada Agostinho também fazendeiro naquele localidade, que lhe fez a seguinte pergunta: "Ou compadre Vicente por quanto tá custando uma arroba de algodão"? "Compadre, eu ouvi alguém falar que não sei onde, tão pagando não sei quanto!" E seu Agostinho inocente e distraído, deixou escapar essa: "Mas, compadre já tá desse preço!"

2 - Monsehor Júlio Alves Bezerra (essa estória também se atribui a padre Freitas que, parece, dirigiu nos anos cinquenta, a paróquia de Baixa Verde) foi pároco de Assu durante muito tempo. Dia de batizado dominical na igreja Matriz de São João Batista, perguntou o nome da criança: "Frederico, Padre!" Respondeu aquela mulher". Monsenhor num gesto intempestivo e preconceituoso, disse assim: "Deixe de besteira, mulher, nome de negro é Benedito!"

3 - Waldemar Campielo foi vereador do Assu e depois prefeito de Carnaubais (RN). Pois bem, recém empossado na prefeitura daquele município que fora distrito de Assu, resolveu viajar a Natal em busca de recursos para aquela terra de Santa Luzia. Aí Waldemar perguntou a Walter Leitão (contador da prefeitura) o que estava faltando para ele comprar para aquela edilidade: Walter solicitou: "Prefeito, compre uma bandeira do Brasil." Uma segunda pergunta, entretanto, denunciaria um prefeito deslumbrado com a própria vitória: "Walter, e de que cor eu compro?"

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

CHICO TRAIRA

Francisco Agripino de Alcaniz é o nome de registro de Chico Traira, um dos maiores poetas cordelistas que o Nordeste já teve. Alguns acham que ele, Traira, é natural do Assu, onde viveu parte da sua juventude e os dias finais de sua vida. Porém nasceu no sítio Pau de Jucá, povoado de Sacramento, hoje município de Ipanguaçu (RN). O Nordeste, a exemplo do poeta matuto Renato Caldas e de tantos outros, Chico Traira conheceu de ponta a ponta "nas suas intermináveis andanças", apresentando as suas cantorias, acompanhado da sua inseparável viola que um dia, teve que vendê-la por necessidades financeiras. Pois bem, certo ocasião, viajando com destino a litorânea cidade de Macau (RN), para apresentar uma cantoria, em companhia do seu colega chamado Patativa que, em razão da trepidante estrada esburaca, ainda carroçável, disse assim como se quisesse provocar o poeta: "Chico. Eu acho que nossa viagem não vai ser muito sublime!" Traíra pegou na deixa:

Se o amigo não está
Achando a viagem boa
Você é pássaro, eu sou peixe
Eu mergulho e você voa
Você volta para o ninho
E eu volto à minha lagoa.


De outra feita, cantando com outro afamado poeta violeiro chamado Manoel Calixto, na cidade de Areia Branca, interior do litoral do Rio Grande do Norte, na casa de certo seu admirador fora desafiado com a seguinte estrofe:

Aviso ao dono da casa
Que não vá fazer asneira
Tenha cuidado em Traira
Que ele tem uma coceira
Se não quiser que ele pegue
De manhã queime a cadeira.

Chico prontamente respondeu:

Você é que tem coceira
Dessas que rebenta a calça
Está tomando por dia
dezoito banhos de salsa
Quando a coceira se dana
Num dia acaba uma calça.


Fernando Caldas

sábado, 12 de janeiro de 2008

GLOSADORES DO ASSU

A minha idade requer
Saudade e recordação.
Vivendo na solidão
Por causa de uma mulher.
Nem sonhando ela me quer...
Po causa disso chorei;
Bebendo raciocinei:
É astúcia do Demônio
E ao meu triste patrimônio
"Novos tormentos juntei".

Renato Caldas

Passeando nesta praça
Não sinto mais alegria,
Achando a vida vazia
Na venda bebi cachaça.
Na vida não acho graça,
Pensando no meu sofrer,
Já de tanto padecer
Eu já vivo amargurado,
Continuo embriagado
Me lembrando de você.

Manoel de Bobagem

Ouvido Sua Eminência
Por imensa multidão
Humilde, beijou o chão
No país da violência
Pregou a paz com clemência
De modo convencedor,
Rogou a Nosso Senhor
Que aos cristãos todos conduz
Como servo de Jesus
O papa, pregou o amor.
Solon Wanderley

Serei uma alma esquecida
Ninguém vai lembrar de mim,
E por isso antes do fim
Sinto saudade da vida
Minha filha, a mais querida,
A quem lhe dei o viver,
Na certa vai esquecer
Do pai que a morte levou
Por isso tristonho estou
Em lembrar que vou morrer.

Boanerges Wanderley

Eu respeito a castidade
Inda mesmo presumida,
Que mantém pra toda vida,
"A mulher de certa idade."
Mas, afirmo, sem maldade,
Que, na vida, errada, incerta,
Muita coisa se concerta
Que parece nova e boa:
- Mulher que vira "coroa"
Não tem nunca idade certa.

Mariano Coelho

Mesmo sem acreditar
Nas sagradas escrituras
Devem ter as criaturas
"Um minuto pra rezar."
Também devem programar
O seu modo de viver,
E dessa forma obter
O perdão da eternidade,
E ter com serenidade
"Um segundo pra morrer."

Francisco Amorim

Já estou desesperado,
Já não tenho paciência,
Se assemelha à penitência
A vida que vou levando.
Meus amigos se acabando.
Aqueles que tanto amei...
Eu, também, já comecei
A morrer por prestação,
E se tentar salvação
Tem caminhos que eu não sei.

Walter de Sá Leitão

A dor, a angústia, o gemido,
São prenúncios de um ocaso,
Mas, às vezes tem um prazo
Pois nem tudo está perdido.
Tudo por Deus é regido
A tempestade, a bonança,
Convém rever na lembrança.
Dia a dia o que acontece,
Veio fazer uma prece
Quando resta uma esperança.

Núcio Pinto

Pedindo paz pra meu povo
Súde e tranquilidade,
Com grande felicidade,
Quero entrar o ano novo.
A Jesus Cristo, sim, louvo
O seu natal tão contente
Peço a Deus Onipotente,
Com fé de não ter engano,
Pra subir o novo ano
Com o pé direito na frente.

João Adolfo Soares

Como tudo é passageiro
No decorrer desta vida,
No jardim, triste, esquecida,
Cai a flor do jasmineiro
Seu orvalho derradeiro,
Por sobre a relva deslisa
O seu perfume ameniza
O travor da soledade
Deixando odor de saudade
Ao leve sopro da brisa.

Oliveira Junior

De madrugada, na rua
Num luar claro de agosto,
Eu vi o seio da lua.
Sem "sutien", quase nua,
Eu pasmei, nervoso, ao vê-la
Custava, mesmo entendê-la,
Qual Diana pura e terna
Tomava a forma materna
Amamentando uma estrela.

Hélio Oliveira

Fico na área cantando
Admirando a beleza
Feita pela natureza
Me sinto bem contemplando
E o perfume aspirando
Das rosas e do jasmim
Foi Deus que me fez assim
Pra ser amiga das flores
Em mim não tem dissabores
Contemplando o meu jardim.

Martinha Santiago

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

CARNAUBEIRA, A "ÁRVORE DA VIDA"




A carnaubeira é uma palmeira originária do semi-árido nordestino, muito comum em solos argilosos e de aluvião (beira de rios), bastante resistente às secas e com grande longevidade (ciclo de aproximadamente 200 anos). Há quem diga que a carnaubeira é eterna. Ela é chamada cientificamente de Copernícia Cerífera (Miller), em homenagem ao naturalista alemão Humbadt, quando este visitou o Brasil no século XII e conheceu a carnaubeira e suas numerosas finalidades, passando a chamá-la com o apodo de "árvore da vida." Ela também é conhecida popularmente como "O Boi Vegetal". é como se dizia antigamente: "Do boi tudo se aproveita, da carnaúba não se perde nada." O seu descobrimento é data de 1790. Em 1857, o norte-rio-grandense chamado Manoel Antônio de Macedo foi quem descobriu o processo de extração da cera da planta e por ele provavelmente feito as primeiras experiências de beneficiamento, "muito antes do petróleo e da luz elétrica". Celso da Silveira depõe que "o emprego na confecções de currais de gado teve influência decisiva no desenvolvimento do ciclo da pecuária determinante das primeiras charqueadas no Brasil."

No Vale do Açu/RN, a carnaubeira cobria uma área de aproximadamente 17 mil hectares. Até pouco tempo atrás (antes da fruticultura irrigada naquela região, explorada principalmente pelas empresas agrícolas de porte) era a principal economia do Vale do Açu. Praticamente toda produção de cera era exportada para os estados Unidos, Alemanha, Grã-Bretanha e França.

A carnaubeira é uma árvore nativa muito comum em solo argiloso e de aluvião (margem de rios) natural da região nordeste do Brasil como Rio Grande do Norte, Ceará e Piaui. Estes dois últimos Estados com maior frequência, informa Celso Martins. "Em outros países da América do sul existe a carnaubeira, mas somente a palmeira. Devido à irregularidade da extração chuvosa não desenvolve o mecanismo defensor do vegetal, não havendo assim o pó cerífero servindo somente para adorno." Existe ainda a carnaubeira no Ceilão, Africa Equatorial.informa Celso Martins.

A carnaubeira além de ser uma planta nativa, também se planta. Se plantada leva aproximadamente 10 anos para chegar ao ponto da colheita. No Brasil os maiores produtores são os Estados nordestinos como Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí, com 87 por cento da produção nacional. No Rio Grande do Norte são produtores, os municípios de Assu, Ipanguaçu, Carnaubais, Auto do Rodrigues, Pendências, Upanema, além dos município da região oeste do estado potiguar como Mossoró, Pau dos Ferros, Felipe Guerra, Apodi e Governador Dix-sept Rosado. Ainda se produz o pó cerífero nos município de Campo Grande, Santana de Matos, Ceará Mirim, Macau, Touros, Martins, entre outros municípios com pequena produção.

A extração da palha da carnaubeira - corte de suas palhas, é feito através de grandes varas de aproximadamente dez metros de comprimento, tamanho maior da carnaubeira, podendo excepcionalmente chegar a 15 metros, com tronco (esquife) perfeitamente reto e cilíndrico de 15-25 cm de diâmetro, com uma foice na extremidade, sem causar danos ao meio ambiente. A colheita é feita entre entre os meses de agosto e dezembro e, após a extração da palha bota-se para secar em estaleiros, exposta ao sol para depois proceder ao seu batimento e posteriormente extrair o pó. (Tempos atrás, se procedia o seu batimento na calada da noite, hora em que o vento está brando, depois, veio a ser batida mecanicamente através de uma máquina (chamada "Maquina de Cortar Palha"), salvo engano, inventado no Estado do Piaui, coisa semelhante a uma forrageira de triturar ração animal, acoplada a um caminhão que depois de extraído o pó dar-se-á o seu cozimento em grandes tachos de ferro fundido revestido de tijolo (alvenaria), em alta temperatura, com adicionalmente de um produto de nome Sal Azedo e outros produtos químicos, para dar melhor qualidade ao produto.


Da (suas palhas) faz-se chapéus, bolças, esteiras, bem como a sua madeira serve para cobertura de casas, galpões, ou qualquer outro tipo de cobertura que o homem possa idealizar. A sua madeira (tronco) é de grande durabilidade, faz-se linhas, ripas e serve também para confeccionar utensílios domésticos. Do tronco faz-se também porteiras para fazendas e pontes, por acreditar que a sua durabilidade é eterna se utilizada de tronco completamente maduro. A semente da carnaubeira serve para ração animal bovina e se triturada da um pó semelhante ao café, servindo de alimento ao homem com inúmeras propriedades medicinais, Dá suas raízes, o escritor Amorim, dá uma bebida muito usada na medicina depurativa que, quando queimadas e pulverizadas substituem o sal de cozinha, sendo também indicado popularmente contra o reumatismo e artrite. O seu fruto é de cor preta e têm um gosto adocicado. A sua polpa quando processada produz farinha.

"A PETROBRAS - através da Unidade de Negócios, Exploração e produção do Rio Grande do Norte e Ceará (UNRNCE) - adotou uma tecnologia autenticamente norte-rio-grandense para revestir os dutos por onde passa vapor a ser injetado nos poços terrestres de extração de petróleo. A palha da carnaubeira serve a fabricação de esteiras e reduz em até 40 por cento os custos da companhia somente com esse tipo de aplicação . Tecnologia em forma de esteiras com palha de carnaúba trancada, que sai das mãos hábeis de pelo menos 50 mulheres do assentamento Palheiros III (município de Upanema).

O uso das esteiras de palhas de carnaúba pela companhia trará uma economia de ate 3 milhões e 700 mil reais, somente considerando a demanda inicial de cem quilômetros de dutos. Onde a PETROBRAS aplicará o revestimento que dará proteção mecânica a estrutura metálica por onde passa o vapor a 280 graus".

A carnaúba é classificada de quatro tipos: Tipo 1 (cera olho de cor amarela, de melhor qualidade e maior valor comercial, tipo 2 (cera gorda de cor verde), tipo 3 e 4.

A cêra começou a perder espaço em solo nordestino logo apos a explosão do consumo dos anos cinquenta. Por esse tempo, o Brasil produziu 100 mil toneladas. Foi o auge de sua produção. A cêra foi muito usada na confecção de disco de venil pelas gravadores e ainda é muito usada pelas industrias de graxa de sapato.

No Rio Grande do Norte, era o município do Assu, onde se concentravam seus maiores produtores, beneficiadores e comerciantes. Lembrar Zequinha Pinheiro (produtor de cêra que chegou até a ter uma casa bancária no Rio de Janeiro com os recursos da cêra de carnaúba), Francisco Martins Fernandes, Minervino Wanderley, Fernando Tavares (Vem-Vem), Mercantil Martins Irmãos (dirigida por Sandoval Martins), Carvalho & Cia que depois veio a ser Pimentel e Cia, Cooperativa Agro Pecuária do Vale do Açu Ltda (presidida por Francisco Amorim e gerenciada por Edmilson Caldas, chegando aquela cooperativa em virtude da comercialização daquele produto, a ser na década de setenta, o maior cliente do banco do Brasil, de Assu, além de um grande fornecedor a industria Johnson, de Fortaleza-CE), Sebastião Alves, Nilo Gouveia (Seu Nilo), Luiz Tavares, Seu Ananias, entre outros da várzea do Assu.

A Mercantil Martins Irmãos foi quem primeiro inovou para o beneficiamento da Cera de Carnaúba, no Estado potiguar, implantando na década de setenta (onde hoje está assentado o Centro Administrativo da Prefeitura Municipal do Assu), uma usina com tecnologia moderna, deixando de comercializar a cêra em forma de tablete para ser beneficiada tipo escama de peixe, conforme exigência do mercado importador.

Pena que a carnaubeira no Vale do Assu está ainda sendo destruída para dar lugar o cultivo da banana entre outras frutas.

Fernando Caldas

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

JESUINO BRILHANTE, O FILME

Vale a pena relembrar que no início da década de setenta, o povo hospitaleiro e generoso do Assu, de tantos poetas e até mesmo de tradições pioneiras, recebeu um grupo de atores (cabeludos) cinematográficos, para que aquela cidade e região, fosse cenário principal do primeiro filme longa metragem rodado no Rio Grande do Norte, intitulado "Jesuíno Brilhante, O Cangaceiro", produzido pelo cineasta potiguar de Ipanguaçu/RN, então radicado no Rio de Janeiro, onde veio a falecer em 1991, chamado artisticamente William Coobet (Cosme na tradução, seu sobrenome de registro, família muito conhecida no Assu e em Ipanguaçu).


Esse filme tem fotografia de Carlos Tourinho, música de Mário Pariz e o seu protagonista é Neri Vitor, produção de Eliana Coobet. É uma produção em Eastmancolor. Suas filmagens tem duração de 1h40m., 35mm e o seu produtor associado é Jonas Garret. O enredo é sobre o cangaço e o gênero é de aventura, rodado que foi em reprise com destaque no 15º Festival de Cinema de Natal, realizado no mês de julho de 2006. Fez sucesso no Brasil e foi rodado especialmente a convite no Festival de Moscou, em 1973. Algumas das suas cópias estão espalhadas em diversos países como a Rússia, Espanha, Romênia, Checoslováquia, Índia e Polônia.

O filme conta a história de um cangaceiro romântico chamado Jesuíno Alves Calado (Jesuíno Brilhante), nome que herdara de seu tio, também cangaceiro.

Jesuíno nasceu no sítio "Tuiuú", distante sete quilômetros da cidade de Patu, região oeste do Rio Grande do Norte.

Câmara Cascudo depõe que Jesuíno "é o primeiro cangaceiro na memória do oeste norte-rio-grandense. Deixou funda lembrança de valentia, destemor e fidalguia. Era o aut-low gentlilhomem, imperioso, arrebatado, incapaz de insultos por vaidade ou de uma agressão inútil."

Voltando ao filme, participaram da filmagem, artistas de nome nacional como Neri Victor, Rodolfo Arena (como Soares), Vanja Orico (como Maria de Goes - que ficou hospedada na casa da escritora Maria Eugênia), Waldir Onofre (como Zé), Miltom Vilar (como Francisco Limão), Hilda Melo (como Margarida), Maria Lucia Escócia (Jesuino´s Mother), Wandick Wandré, Rojerio Tapajos (como Silvestre), Eriel José (como Jojeu), Helio Duda (como Juvenal), Mário Paris (como Cobra Verde, Anteór Barreto (natural de Ipanguaçu), além de Regina Accioli, Clementina de Jesus, Jesiel Figueredo (ator potiguar que fez uma cena no Forte dos Reis Magos, como o governador da província), Tony Machado, Rui Marques, Daniel Rosental e Nestor Saboia.

Várias pessoas da sociedade assuense deram a sua colaboração como figurantes. Entre tantos: Pedro Cícero de Oliveira, José Caldas Soares Filgueira Filho (Dedé Caldas), Zélia Amorim, Francisco Evaristo de Oliveira Sales  - dr. Sales), que foi médico em Assu durante décadas), José Marcolino de Vasconcelos (Dedé de Aiá), Raimundo Márcio Borges de Sá Leitão (Itinho de Durval), Monte Lacerda e Fernando Montenegro, dentre outros.

Além do município do Assu, a filmagem fora produzida em Ipanguaçu, Mossoró, Tibau, Patu e nos cerrados de Lages e Natal, onde fora concluída a filmagem.

Voltando a vida de Jesuíno, Sinhazinha Wanderley no livro de Walter Wanderley intitulado Família Wanderley, 1965, conta que no Assu existiu um pequeno museu onde se encontrava exposto um pedaço do osso do braço de Jesuíno Brilhante que foi morto pela polícia da paraíba no lugar denominado Palha, distrito do Estado da Paraíba.

Fica, portanto, esse registro, como um fato cultural de muita relevância para o Assu, pois, esse filme é patrimônio cultural que deve ser relembrando e ficar catalogado nas páginas da nossa história e do Rio Grande do Norte.

Fernando Caldas

























































sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

POEMAS INÉDITOS DE JOÃO LINS CALDAS

I

Os quatro ovos que tinha no ninho do pássaro
Diziam de quatro vidas, um amanhã que devia ser.
Mas não foi isso na vida do pássaro
Tudo na vida do pássaro:
- Só cantar e viver.

II

Deus deu-me tudo. Deus deu-me tudo do que a mim amargurado Deus me devia dar.
Deus deu-me tudo. Si amargurado, porque a mim as razzões de me amargurar.

III

O pobre me deu uma esmola de Deus te favoreça
"Deus te favoreça!" Favoreça-me Deus com essa esmola do pobre.

IV

Deus preenche o infinito
Preenche os vale do amor
E, se a dor solta seu grito
Deus vive também na dor!

V

Culpa-te a ti somente, a ti culpa.
A ti somente, Ó grande desgraçado!
Culpa-te a ti de ser desventurado
Culpa-te a tí de ser já sem desculpa,
Amaste por amor. Amaste crendo.

VI

Um, porém verás em brasa, em chama:
Porque tudo que Deus tem formado
Encheu de fel um coração que ama!

domingo, 16 de dezembro de 2007

LUIZINHO CALDAS, UM GLOSADOR

Luiz Lucas Lins Caldas Neto  - Luizinho Caldas como era conhecido na intimidade, era meu avô paterno. Nasceu em Ipanguaçu, cidade coirmã do Assu-RN, porém viveu quase toda a sua existência na cidade assuense.. Naquela terra ipanguaçuense ele, Luizinho, candidatou-se a prefeito nos idos de cinquenta, sem obter. Foi funcionário do Fomento Agrícola, em Natal. Herdou dos Lins Caldas a arte da prosa e do verso. A sua preferência para versejar era a décima (glosa). E um dia escreveu essa que por sinal é muito atual, que diz assim:

Só falta usar maçarico
Instrumento de arrombar
E o povo fica a clamar
É pena o Brasil tão rico.
Com esta gente eu não fico
Quero servir de espião
Mas, todo esforço é em vão
Rouba governo e prefeito
Para o Brasil não há geito
Com tanto filho ladrão.

E essa outra transcrita abaixo, é também de sua autoria:

Certa coisa que já fiz
Com uma jovem em segredo
Revelar até faz medo
Eu não digo, ela não diz
É que eu quis e ela quis
Só podia acontecer
Mas, o bom é não dizer
Com quem isto aconteceu
Ela não diz e nem eu
Quem é que pode saber?

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

AS TIRADAS DE RENATO CALDAS

As tiradas, pilhérias, chistes, facécias, os gracejos de Renato Caldas, poeta, folclorista e interprete da cultura popular brasileira, estão espalhados por este país afora. Foi ele "quem deu causa ao surgimento de um folclore que circula na esfera do anedotário papa-jerimum". Portanto, os causos aqui relatados não tem absolutamente o intuito de querer macular a imagem de ninguém. Tem apenas o sentido humorístico. Vamos revivê-las, para o nosso bem estar:

1) Nos idos de sessenta e oito, encontrava-se encalhado no Porto de Natal, o navio da Marinha norte-americana (Projeto Hoop). Naquele navio-hospital, Renato submeteu-se a uma cirurgia na próstata. Em razão do sucesso da operação e da sua rápida recuperação, o médico llhe deu alta, porém com a seguinte recomendação: "Renato cuidado para não comer gordura!" E Renato com aquele seu jeito cômico, jocoso, pilhérico, dirigiu a palavra a sua mulher que pesava aproximadamente seus bons cem quilos, dizendo: "Tá ouvindo, Fausta, e agora!"

2) Renato nos idos de trinta, numa certa viagem de trem que fizera, se não me engano, de Angicos com destino a Natal, fumava inveteradamente. Naquele transporte coletivo, sentado de frente para ele, Renato, uma jovem que se encontrava grávida, em dia de parir. Aquela mulher como se quisesse provocar o poeta, arreganhou as pernas, alisou a sua barriga e advertiu Renato, dizendo assim: "O senhor dá pra apagar o cigarro! Não é por mim não! É por conta desse inocente que está na minha barriga." Renato não se fez de rogado: "A senhora dá pra fechar as pernas! Não é por mim não! É por conta desse inocente!" Respondeu Renato, afagando a sua genitália

3) Renato no dia do seu casamento deixou sua esposa em casa e deu uma escapulida para farrear com  amigos, pelos bares da cidade de Assu, retornando a sua nova morada somente noite alta. Sua mulher sentindo-se abandonada, recriminou na hora, ao vê-lo chegar em casa embriagado: "Mas, Renato isso é coisa que você faça no dia do nosso casamento: "Besteira, mulher! Eu só vim buscar o violão!" Rebateu Renato e saiu novamente para continuar a bebedeira.

4) Renato na época da construção da Ponte Felipe Guerra, sobre o Rio Piranhas ou Assu (ele trabalhou na construção daquela ponte construída pelo DNOCS)  recebera um convite de um amigo que morava nas proximidades daquele rio, para participar do casamento de sua filha. Durante a festa, os comes e bebes, um dos convivas convidou Renato para fazer a saudação aos noivos. Renato saiu-se com essa: "Minhas senhoras e meus senhores. Queira Deus que o noivo não encontre um solo explorado!" Para risos dos presentes.

Fernando Caldas

sábado, 8 de dezembro de 2007

HOMENAGEM PÓSTUMA

O assuense dentista Osman Alves Cabral solicitou ao prefeito do Assu Ronaldo Soares e ao vereador Heliomar Alves para que fosse prestada uma homenagem ao deputado Olavo Montenegro e a cantora poetiguar do Assu, de nome nacional, Núbia Lafaite. Segue na íntegra a solicitaçaõ referida:

Senhor Prefeito,

Na qualidade de cidadão, cirurgião dentista e filho deste querido município, venho expor a V. Exa. e ao final sugerir o seguinte:

1) Há alguns anos, o município de Assu perdeu a figura de Olavo Lacerda Montenegro, empresário, secretário de estado, agropecuarista e homem público. Representou e defendeu a nossa região ao longo de várias décadas, não apenas da tribuna da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte, mas também, em inúmeras reuniões e conclaves, nos quais ergueu a sua voz na defesa do Vale do Assu, do seu povo e do seu desenvolvimento. É chegada a hora da chefia do Executivio Municipal resgatar a sua memória, homenageando a sua dedicação e amor ao Assu, através da lembrança do seu nome no frontispício de uma escola, de uma construção pública ou de uma rua da cidade.

2) Por último, senhor prefeito, refiro-me a outra significativa perda no campo da arte e da música. Desejo me reportar ao recente falecimento da cantora assuense Núbia Lafaite que cantou e encantou inúmeras gerações no Rio Grande do Norte e no Brasil. Núbia se tornou, não apenas, num patrimônio artístico do nosso município mais do país pela beleza de sua voz e de suas magnífica interpretações.

Urge, pois, que esta prefeitura desperte para homenageá-la condignamente, realçando o seu valor e perpetuando no bronze o seu nome como filha dileta do Assu e que jamais será esquecida.
Na expectativa das providências de ambas solicitações, subscrevo-me muito atenciosamente,

Osman Alves Cabral

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

A "FRUTILÂNDIA" DO VALE

(A crônica adiante é de autoria do poeta natalense Laélio Ferreira - publicada no jornal O Mossoroense, 2007).

Desajeitado e cabreiro, a roupa já sem o vermelho da poeira das viagem no jipe, bando-de-cuia tomado na pensão de Chicó, na flor dos meus dezesseis janeiros, à porta da residência modesta, bati palmas e gaguejei o indispensável "ô de casa". Tinha uma obrigação, um dever sentimental, sagrado, uma promessa a cumprir no Assu, naquele ano dos anos 50. Visitar, saudar o dono da casa, mestre de muitos sonhos e senhor incontestável da mais úbere, abundante, edênica, maravilhosa e fértil gleba de todo o Vale´- a "Frutilândia". A incumbência me fora dada por meu pai, Othoniel, anos antes convidado solenemente, insistentemente, para ser sócio, meio a meio, de um colossal empreendimento de fruticultura. Redenção econômica de toda a região, gerando riqueza, justiça social, inovando a produção de frutas. legumes, hortaliças, tudo em grande escala, gigantescas proporções. Os pobres sairiam da miséria, teriam moradia, grandes vilas operárias, escolas, assistência médica, futuro. Largariam os barões da cera, que nada plantavam, viviam em Natal jogando baralho no Natal Clube, tomando uísque, enriquecendo Maria Boa, passeando no Rio de Janeiro - impecável ternos de linho branco, lustrosos, gordos como bispos. Moderníssimas máquinas, escavadeiras imensas, dragas descomunais - rebocada desde Roterdã - abririam largo e profundo canal, em linha reta, de Assu a Macau. Ali, mar adentro, plantar-se-iam modernos, imponentes, equipados cais, frigoríficos, grandes armazéns. Luzentes guindastes, esteiras rolantes, saciariam a fome das bocarras dos porões das grandes embarcações da própria Companhia, espalhando por Oropa, França e Bahia cajus, mangas, pinhas, araticuns, mangabas, romãs, laranjas-cravo, abacaxis, maracujás - os dúlcidos e tropicais produtos do gigante complexo agroindustrial da biliardária sociedade CALDAS & MENEZES... De volta ao Assu e à dura realidade, de novo bati palmas na soleira da casinha modesta do senhor da "Frutilândia", naquela rua do Assu, naquela era dos anos cinquenta. Apareceu o amigo do meu pai, o sócio do sonho tão sonhado, tão detalhado, idealizado nas conversas dos dois. Disse-lhe quem era, fez-me uma festa daquelas, passando, suavemente, a mão na minha cachola sonhadora. Era magro, gestos nervosos, rápidos. Dando o nó na gravata, convidou-me a entrar, risonho, gentil, hospitaleiro. Calçava, notei, uma daquelas botas de feira. Calça, camisa, colete - tudo amarfanhado, encardido. Guiou-me em direção à cozinha, por uma picada, uma vereda aberta numa mata fechada de ferro-velho, pacotes de amarelados jornais e uma imensidão de garrafas até o teto - um "caminho de Santiago" que, como peregrino, perpassei, com medo de lacraia e caranguejeira. Enquanto conversávamos, ferveu água e serviu-me um café saboroso, pegando fogo, coado de um pano que devia ter uns bons anos de uso diário e constante. Na minha idade, não tinha engenho, nem arte e nenhuma tendência para falar sobre poesia ou literatura com o idealizador de "Frutilândia". Mesmo que a minha casa, em Natal, vivesse, pululasse em certos dias, cheia de literatos e candidatos a poeta, aperreando Othoniel sobre coisas de metrificação, leituras, autores e outras milongas mais - alguns deles pedindo remendos em versos de pé-quebrado. Ficava só cubando, sem pigorar, quem era besta? Sem anuência ou conhecimento do dono da casa, tinha cometido, já, no Atheneu, algumas glosas sacanas e "burilado" uns três ou quatro sonetos decassílabos à moda de Augusto dos Anjos - coisas horrorosas... Na cozinha acolhedora, o cavaco, o bate-papo, limitou-se, pois, às notícias da capital, aos meus estudos, `saudação do "sócio" de Natal, à mutua e sincera admiração entre os dois, às amenidades. Nada sobre a "Frutilândia". Nada, também, acerca da razão social Caldas & Menezes". Ele entretanto, já na despedida - lembro bem - deu umas boas cutucadas nos políticos do Estado e de outras plagas, pilheriando, rindo com gosto, divertido. Sol descambando, da porta da sala, do início do labirinto de ferro velho, jornal e garrafa de todo tamanho e cor, veio o chamamento: "Seu João, tá na hora!" Saímos. Era um meninote, chapéu-de-couro atolado na cabeça grande, cara de janduí. O homem bom me pediu licença e retornou aos cafundós do seu tugúrio. Voltou lépido, brilho nos olhos, vestindo um paletó tão encardido quanto o restante da indumentária. Numa das mãos, um surrado bisaco de lona; noutra, uma lazarina impecável, ajeitada mesmo - oi cano brilhando mais do que espinhaço de pão doce, a coronha envernizada, bonita como os seiscentos. O Poeta João Lins Caldas, sublime sonhador, senhor de vaticínios para o seu Vale - o sócio do meu pai! - trancou a porta capenga da casinha. Apertou-me a mão, com calor, despedindo-se. Pediu desculpas pela pressa - ia caçar! Argumentou, cavalheiro, que aquela era a hora dos preás e das rolinhas, das nambus escondidas no panasco dourado. E lá se foi, engravatado, predador solene, feliz da vida - o sonhador. O curumiaçu, secretário e cúmplice, seguiu-lhe os passos ligeiros, no rumo - presumi - da "Frutilândia", procurando a presa miúda e saborosa..."

domingo, 21 de outubro de 2007

SOBRE O POETA DE "FULÔ DO MATO"

Renato Caldas (1902-1911) ainda é, penso eu, o nome literário potiguar mais conhecido em todo o Brasil. Foi ele "que deu nome ao Rio Grande do Norte nas letras nacionais", publicando em 1939, o seu livro de estréia intitulado "Fulô do Mato", escrito em linguagem genuinamente matuta.

O poeta que aparentava simplicidade, viveu uma juventude andeja, sem endereço certo. Quando moço, bebia inveteradamente. Seresteiro da velha guarda, bonachão, brejeiro, "miolo de aroeira, vivo como um pé de vento", no dizer de Câmara Cascudo com quem ele, Renato, conviveu na intimidade.

O Brasil, Renato "dando expansão ao seu temperamento cosmopolita, conheceu de ponta a ponta, nas suas intermináveis andanças de romântico caminheiro". Nas suas viagens pelo Nordeste, ele se apresentava em palcos de cinemas, teatros e outros locais improvisados, declamando suas poesias irreverentes, amorosas, cantando emboladas e modinhas que também sabia produzir a seu modo.

Renato viveu parte da sua mocidade no Rio de Janeiro, onde trabalhou e conviveu com aqueles artifices dos melhores da Canção Popular Brasileira, como Sílvio Caldas (ambos consideravam-se parentes), Francisco Alves (O Rei da Voz), Noel Rosa, Almirante, entre outros. O músico Silvio - o responsável pela introdução da seresta na MPB -, no começo dos anos setenta, de passagem para Fortaleza, entrou na cidade de Assu/RN, para rever o velho amigo que não via há bastante tempo, acordando o poeta "cantando ao pé da janela numa típica serenata interiorana", como depõe João Batista Machado. O escritor Machado diz mais ainda que somente duas pessoas tiveram aquele privilégio: "Renato e JK".

Outro fato importante que engrandece mais ainda a sua biografia, aconteceu no início da década de 90. Virou poeta para inglês ver, pois, vários poemas de sua autoria estão traduzidos para aquela língua e publicados numa revista cultural americana intitulada "International Poetry Review (1991), volume XVII, número I, editada em Greensboro, Carolina do Norte, como por exemplo, o poema sob o título "Fulô do Mato", que diz assim:

Sá Dona, vossa mecê,
É a fulô mais cheirosa,
A fulô mais prefumosa
Qui o meu sertão já botô!
Podem fazê um cardume,
De tudo qui fô prefume,
De tudo qui fô fulô,
Quí nem um, nem uma só,
Tem o cheiro do suó
Qui o seu corpinho suô.
- Tem cheiro de madrugada,
Fartum de areia muiáda,
Qui o uruváio inxombriô.
É um cheiro bom, déferente,
Qui a gente sintindo, sente,
Das outa coisa o fedô.

O poeta conheceu com os seus olhos "o paladar e pé o seu sertão. O seus ouvidos já escutaram os gritos abafados pela fome de uma população flagelada e os arpejos sonoros de uma viola pontilhada; os seus olhos já viram os rios transbordando e já viram também, nos bebedouros esturricados, o gado morrendo de sede! Viu e sentiu o sertão: povo, solo, clima e paladar do seu trabalho", no seu próprio dizer. E um dia escreveu:

Venha ver seu moço, ói,
O que é fome no sertão.
Mecê, é lá da cidade,
Num tem a infelicidade,
De conhecê isso não.
Mas é bom sempre que vêja,
Pru móde me acreditá.
E, pru raiva, ou compaixão,
Dizê aos nossos irmão,
Qui viu o nosso pená.
... Mas sertão num é Brasí.
O Brasí, é lá pru sú.
Isso aqui é um purgatóro...
Quem mata a fome é o sodóro
E a sede é o mandacarú.

Os versos deste poeta eclético, versátil, retrata além da seca devastadora, a enxurrada que também castiga algumas regiões do sertão nordestino, bem como os amores fracassados. Tem irreverência, humor, malícia, como o célebre poema intitulado "Reboliço" (que na década de cinquenta o poeta potiguar Celso da Silveira declamou num certo programa cultural da Rádio Nacional, do Rio de Janeiro, além de ter sido recitado também pelo Poeta Vaqueiro Zé Praxedes nas apresentações que fazia pelo Brasil afora, e declamado pelo deputado federal Ney Lopes no plenário da Câmara dos Deputados, a propósito do falecimento do poeta em 1991). Eis o poema:


Menina me arresponda,
Sem se ri e sem chorá:
Pruque você se remexe
Quando vê home passá?
Fica toda balançando,
Remexendo, remexendo...
Pensa tarvez, qui nós véio,
Nem tem ôio e nem tá vendo?
Mas, se eu fosse turidade,
Se eu tivesse argum valô,
Eu botava na cadeia
Esse teu remexedô...
E adespois dele tá preso,
Num lugá, bem amarrado,
Eu pedia - Minha Nêga,
Remexe pro delegado.

As suas décimas (glosas) e trovas são terríveis, bem como as suas tiradas e boutades são picantes. Se tornaram famosas por todo o país, como essa que veremos adiante: Certo dia, ele submeteu-se a uma cirurgia na próstata, no navio hospital do Projeto Hop (da Marinha norte-americana que se encontrava no final dos anos sessenta, encalhado no Porto de Natal). Obtendo sucesso naquela operação, o médico logo lhe deu alta com a seguinte recomendação: "Seu Renato, o senhor está de alta, mas cuidado para não comer gordura. Ele olhou para Fausta, sua mulher que pesava aproximadamente seus bons cem quilos, dizendo: "Está ouvindo, Fausta, e agora?"

Certa feita, ao passar pela feira livre de uma certa cidade do interior nordestino, fora abordado por uma feirante vendedora de legumes. "Seu Renato. Faça um versinho para eu divulgar minhas batatas." E ele, Renato, de imediato escreveu num pedacinho de papel de cigarro, dizendo assim:

Batata, batata doce
Batata que o povo gosta,
Um quilo dessa batata
Dá vinte quilos de bosta.

Renato namorava um jovem chamada Maria da Conceição que, certo dia, regressou a São Paulo para passear e rever familiares, comprometendo-se com o poeta que retornaria em breve. Na hora da despedida, Renato entregou a sua namorada o seguinte bilhete em forma de versos:

Maria da Conceição
Faça uma boa viagem
E leve meu coração
Dentro da sua bagagem.

Passaram-se dias, meses, anos e nada de notícias de Conceição. Ao tomar conhecimento do seu paradeiro através de um amigo que ela, Conceição, teria se casado naquela capital paulistana, vingou-se logo que soube do seu endereço, remetendo para Conceição, o seguinte bilhete rimado:

Maria da Conceição
Você fez boa viagem?
Devolva meu coração
Que foi na sua bagagem.

E o mulherengo poeta no melhor de sua criatividade, escreveu no seu "Oiá Pidão", o poema adiante:

Os óio de Sinha Dona?
Ninguém pode arresistir.
Parece dois esmolé.
Qui só véve pra pedi.
Óios pidão desse geito,
Juro pro Deus, nunca vi.
Às vez, eu penso, Sá Dona,
Quando óio pra vancê:
Qui mecê tá é cum fome

E vergonha de dizê...
Eu tenho aquela vontade
De me virá em cumê.
Mas, tenho mêdo, Sá Dona,
Qui seja tapiação;
Pode mecê num tê fome
E fâzê judiação:
Pegá, amassá, mordê
E adespois largá de mão.









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