Da solidão
Vicente Serejo
serejo@terra.com.br
O ser humano, desde a caverna, tem medo da solidão. Há mais de dois mil anos sonha e procura companhias no Universo. Agora mesmo, o jornalista Salvador Nogueira, especializado em temas científicos, na Folha de S. Paulo, revelou detalhes da pesquisa mais recente do Instituto de Tecnologia de Massachutts, EUA, sobre a “chance de vida nas nuvens de vênus”. É uma hipótese, mas o texto revela que as suspeitas começaram bem antes, em 1960, portanto, há mais de 60 anos.
Os cientistas, segundo o texto, não negam que Vênus é teoricamente inabitável pelo que se sabe até agora. Mas, a ciência sempre partiu de hipóteses. Se a atmosfera de Vênus é noventa vezes mais densa do que a da terra, a suspeita parte do princípio que a temperatura de Vênus no solo tem “temperatura e pressão similares à Terra, ao nível do mar, toleráveis para microorganismos terrestres”. E estão certos: as “nuvens venusianas são ricas não em água, mas em ácido sulfúrico”.
Nogueira não nega a grande diferença entre ser habitável e ser habitado. As nuvens lá de Vênus são apenas nuvens, mas, provavelmente, há bilhões de anos, foram mais hospitaleiras, além da possibilidade real de ter abrigado “oceanos de água, antes que o efeito estufa descontrolado o transformasse no inferno quente que é hoje”. Para não cair no desafio de tentar explicar, num texto para leigos, os efeitos da fosfina e de uma estranha função de absorver o seu efeito ultravioleta.
A astrofísica sabe: o planeta Vênus é o mais próximo da Terra, há 61 bilhões de distância, com vulcões, montanhas e vales. Tem a nossa velha e secular simpatia de ser a nossa Estrela Dalva, anunciadora do amanhecer, e que, para os sertanejos, é também a ‘Papa-Ceia’, que chega no lusco-fusco da tarde a encantar os poetas românticos. Ninguém desejou mais ter a Estrela da Manhã do que o poeta Manuel Bandeira: “Meus amigos, meus inimigos / procurem a estrela da manhã”.
Não sou contra, declaro, que os cientistas venham a invadir com seus telescópios as nuvens de Vênus. Mas, que o façam com certa parcimônia.
Também não é possível sobreviver na Terra sem alguns mistérios. Deve ser muito desinteressante viver sem nada de misterioso, se a própria vida é um mistério. Vão mandar uma sonda, logo já, em janeiro e 2025, com seus olhos de células da mais fina nobreza eletrônica, mas não pensem eles que Vênus será tão fácil de ser conquistada.
É real a chance da sonda, na sondagem que é seu fim, voltar de Vênus com novidades em imagens perfeitas das nuvens. Ora, não duvido da ciência.
, acho que, às vezes, mesmo sendo legítima a boa curiosidade, os cientistas passam muito do ponto. Desconfio que não deve ser bom perder os mistérios que cercam a vida humana há milhões de anos. A solidão tem sua graça. Desde que alguém fez das mãos uma concha e, pela primeira vez, apanhou a água para matar a sede…
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